Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um drama com histórias paralelas

Poucas vezes na história da República a nomeação de um ministro da Fazenda foi acompanhada com tanta ansiedade no mercado financeiro. Um mês depois de reeleita, a presidente Dilma Rousseff continuava tentando preencher o posto mais importante de sua nova gestão – o mais estratégico, pelo menos, para dar segurança aos dois primeiros anos do segundo mandato e livrar o país de um rebaixamento pelas agências de crédito. No sábado (22/11), os grandes jornais noticiaram o convite ao economista e ex-secretário do Tesouro Joaquim Levy, mas com a ressalva: o anúncio da escolha, esperado para sexta-feira, havia sido adiado. Talvez nunca tenha sido tão difícil preencher um cargo quase sempre muito cobiçado.

O convite já havia sido recusado pelo presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco. O nome do banqueiro havia aparecido numa lista de sugestões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, empenhadíssimo em assessorar a presidente reeleita na composição do ministério. Jornais informaram tanto a ida de Trabuco a Brasília quanto sua recusa. O nome de Levy, diretor da Bradesco Asset Management, apareceu depois.

Todos deram algum perfil do ex-secretário do Tesouro. O Estado de S.Paulo citou a opinião desfavorável de petistas e descreveu o ministro Guido Mantega como magoado com a escolha: Levy seria “visto como um contraponto à sua gestão”. O perfil mais detalhado, o da Folha de S.Paulo, lembrou a participação do possível futuro ministro no manifesto “Sob a Luz do Sol – uma Agenda para o Brasil”, divulgado em agosto por um grupo de economistas considerados liberais. “Não sobra nada da política econômica do primeiro governo Rouseff nesse manifesto”, segundo o texto da Folha.

Segundo parte da imprensa, a presidente havia adiado o anúncio para apresentar toda a equipe econômica na mesma data, provavelmente 27/11. Segundo outra explicação, ela havia decidido esperar a votação, prevista para terça-feira (25), de um polêmico projeto de mudança da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Com essa alteração, o governo poderia abater da meta fiscal investimentos e desonerações em valor suficiente para acomodar qualquer resultado. Na prática, a mudança equivaleria a eliminar a obrigação de alcançar um determinado superávit primário.

Dívida sem controle

Enquanto narrava a trabalhosa procura de um nome para a Fazenda, a imprensa noticiava também outros desdobramentos da crise fiscal. Durante a semana, todos os grandes jornais acompanharam a tramitação do projeto de mudança da LDO. Um detalhe especialmente interessante, mencionado só em algumas matérias, foi uma alteração do texto original pelo relator, senador Romero Jucá (PMDB-RR). Ele trocou a palavra “meta” pelo termo “resultado”, eliminando, portanto, qualquer referência a um valor tomado como objetivo da política.

No fim da semana, todos informaram o resultado da nova revisão bimestral de receitas e despesas, uma tarefa cumprida pelo Ministério do Planejamento. Pela nova revisão, a meta do governo central, fixada em R$ 80,8 bilhões no começo do ano, foi agora reduzida a R$ 10,1 bilhões. É um resultado meramente simbólico.

A matéria mais sombria sobre a crise das finanças públicas foi publicada, no entanto, no começo da semana pelo Valor.Segundo a reportagem, “de janeiro até a segunda quinzena de outubro o total de vencimento de títulos superou as novas emissões em R$ 167 bilhões”. Traduzindo: mesmo oferecendo uma das taxas de juros mais altas do mundo, o Tesouro tem sido incapaz de rolar integralmente a dívida pública. Título da matéria: “Tesouro tem dificuldade para emitir”. Esse detalhe, informado na edição de segunda-feira (17/11), deu um toque especialmente dramático à procura de um nome para desatar o rolo das finanças públicas federais. É mais um bom exemplo de uma importante matéria fora da pauta comum.

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Rolf Kuntz é jornalista