Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Peleguismo midiático

Qualquer brasileiro com o mínimo conhecimento político sabe que a revista Veja promove uma intensa perseguição ao atual Executivo federal. Nesse sentido, uma das últimas capas da publicação, ao insinuar, sem nenhum tipo de comprovação, que Lula e Dilma Rousseff estariam cientes de esquemas de corrupção em seus respectivos governos é somente um, entre inúmeros exemplos, que comprovam a parcialidade e desonestidade jornalística da revista.

Entretanto, no espectro ideológico oposto, CartaCapital tem se destacado como aliada incondicional do Palácio do Planalto. Enquanto para Veja e os outros veículos do PIG (Partido da Imprensa Golpista), apesar dos tímidos avanços sociais e econômicos, o Brasil nunca esteve tão mal, segundo CartaCapital nosso país atravessa um excelente momento e as alianças do governo com políticos que apoiaram a ditadura militar, ruralistas, pastores evangélicos e outros setores reacionários se justificam em nome da “governabilidade”.

Em editorial intitulado “Por que escolhemos Dilma Rousseff“, publicado em 4 de julho último, CartaCapital declarava abertamente sua posição para as eleições presidenciais. “Certo é que o empenho social do governo de Lula não arrefeceu com Dilma, e até avançou. Por isso, a esperança se estabelece é deste lado”, apontou a publicação de Mino Carta. Obviamente, um veículo da imprensa pode ter determinadas preferências ideológicas. Todavia, a partir do editorial citado, CartaCapital deixou a isenção jornalística de lado e transformou-se em mera propaganda política para a reeleição de Dilma Rousseff, portando-se como um torcedor apaixonado que defende cegamente seu clube de coração. Em sua campanha, a revista não poupou adversários e, por outro lado, relativizou determinadas práticas moralmente condenáveis do governo. Guardadas as devidas proporções, atuou como uma espécie de Veja ás avessas.

Após a divulgação oficial da candidatura de Marina Silva em substituição ao falecido Eduardo Campos, CartaCapital dedicou boa parte de seu noticiário político para atacar a ex-senadora que despontava nas pesquisas como principal rival de Dilma. Passada a euforia do efêmero fenômeno Marina, e a confirmação do segundo turno das eleições entre PT e PSDB, a publicação de Mino Carta voltou a concentrar-se nos elogios incondicionais às gestões petistas. Contudo, o maior caso de peleguismo editorial de CartaCapital é tentar justificar a injustificável indicação da senadora Katia Abreu para ministra da Agricultura. No artigo “Katia Abreu pode ser uma escolha acertada“, Rui Daher, colunista da publicação de Mino Carta, destaca que em “uma pasta esvaziada, sem recursos, que há anos é feudo do PMDB, o nome da senadora é um avanço e a escolha da presidente Dilma Rousseff não poderia ter sido mais acertada”.

Uma mídia isenta e sem maniqueísmos

Ora, peleguismo tem limites. Conforme é do conhecimento dos setores progressistas, Katia Abreu, que é contrária à reforma agrária e aos direitos de comunidades tradicionais, representa o que há de mais anacrônico na burguesia brasileira: os grandes latifundiários. Para um governo que, durante a campanha presidencial se postou como representante dos setores oprimidos de nossa sociedade, indicar a senadora do Tocantins para o Ministério da Agricultura é um enorme paradoxo. Até Miriam Leitão (ironicamente uma das principais articulistas do PIG), em sua coluna no jornal O Globo, reconheceu o erro crasso de escolher Katia Abreu como ministra da Agricultura. “Os intelectuais do PT que se insurgiram contra a indicação da senadora Katia Abreu para o Ministério da Agricultura têm razão. A Confederação Nacional da Agricultura (CNA), presidida pela senadora, entrou na Justiça anos atrás contra a divulgação da lista suja do trabalho escravo”, asseverou Miriam Leitão. Já o MST, um dos movimentos sociais que tem apoiado o governo petista, promoveu ocupações de terra em repúdio à provável nomeação de Katia Abreu para a pasta da Agricultura.

Ou seja, aliados e opositores compreenderam perfeitamente a gravidade de uma escolha equivocada para um ministério, algo que CartaCapital, em nome do peleguismo midiático, se recusa a enxergar. Diante dessa realidade, nosso país precisa impreterivelmente de uma mídia que seja realmente isenta e aborde a realidade sem maniqueísmos. Em suma, uma imprensa que não seja comprometida com os segmentos reacionários da sociedade, mas tampouco submissa ao governo vigente.

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Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas: Brasil, Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de Geografia em Barbacena, MG