Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Vídeos caseiros de sexo ganham espaço na rede

Um dos maiores sites de conteúdo pornográfico do mundo, o Pornhub tem 70 milhões de visitantes por dia, e seu vídeo mais visto em todos os tempos é uma sex tape amadora estrelada por uma então mera socialite americana, a hoje estrela Kim Kardashian. Foram, até hoje, mais de 95 milhões de acessos – mais do que o último clipe do astro teen Justin Bieber no YouTube. Não é caso isolado. A Sexlog, maior rede social de sexo e swing no Brasil, com 3 milhões de usuários, recebe um upload de vídeo caseiro por minuto. A pornografia amadora domina não só a internet como as fantasias sexuais. A própria Sexlog já teve, no passado, uma área destinada a vídeos profissionais, mas o tráfego de usuários era tão fraco que a companhia escolheu fechar a seção e investir apenas no conteúdo mandado pelos usuários.

– O vídeo que mostra um casal de verdade fazendo sexo serve tanto para manter o clima excitante quanto para deixar a relação de quem grava quente e divertida. É uma via de mão dupla em que todo mundo sai ganhando – opina Mayumi Sato, da equipe de marketing da Sexlog.

De olho no filão, as produtoras de filmes pornôs não pretendem ficar para trás. Têm produzido volume crescente de obras com estética caseira, e muitos desses filmes até ganham o rótulo de “vídeo amador”, como forma de capturar o público interessado em cenas cruas.

O maior carro-chefe da produtora West Sex Brasil é a série “Turma do sexo”, gravada de maneira descontraída, com espaço para improvisação e estrelando, além dos personagens principais, anônimos que “não estão no hall do pornô”, de acordo com o fundador, Sandro West. Muitos dos amadores que aparecem em cena são admiradores da produtora ou conhecidos dos funcionários.

– A pessoa quer se identificar com o que vê na tela. Quer pensar: “eu posso fazer isso em casa”. Ninguém mais se interessa por aquela mulher que parece uma boneca ou por uma cena feita de forma mecânica, artificial – observa West. – O espectador não quer só assistir, quer participar.

Também atenta ao mercado, a produtora Xplastic disponibiliza vídeos gravados por seus clientes num site paralelo, o Xplastic.net. O sócio Roy Rufos acredita que a sensação de que os performers estão realmente sentindo prazer é o maior atrativo.

– Não tem nada pior do que sacar que a mulher está fingindo tesão. Acaba com o clima – comenta Rufos. – Assistindo a um vídeo amador, dá para se projetar dentro das cenas com mais facilidade.

Profissional fica mais espontâneo

Kristina Pia Hofer, autora do estudo “Pornographic domesticity” (“Pornografia doméstica”, em tradução livre), conduzido pelo Instituto de Estudos de Gênero da Universidade Johannes Kepler, em Viena, entrega: muitas produtoras usam o termo “amador” apenas como jogada de marketing.

– Ao vasculhar a categoria “pornô amador” em qualquer canal tradicional, você encontra um monte de vídeos que foram obviamente produzidos em um estúdio profissional – pondera. – Por outro lado, essa tendência está fazendo a indústria mudar. Os novos profissionais do meio pornô borram as fronteiras entre o que é amador e profissional.

Como a pesquisadora descreve, o apreço das pessoas pela estética caseira não é um fenômeno novo, já que a pornografia sempre acompanhou o avanço da tecnologia. Na pré-história o homem já fazia pinturas rupestres eróticas. Quando Johannes Gutenberg criou a prensa, a pornografia escrita se massificou, num impulso renovado pela fotografia e pelo cinema.

O surgimento dos formatos analógicos de gravação, como o VHS e o Betamax, nos anos 70, por sua vez, introduziu os consumidores comuns no universo da produção de vídeos. Hoje, com uma facilidade muito maior para gravar um clipe – com celular, tablet, webcam ou até uma GoPro – e, ao mesmo tempo, uma valorização cada vez maior do “real” na cultura popular, o boom das sex tapes foi inevitável. Na era dos reality shows, o interesse pelos vídeos pornôs amadores parece ser apenas mais um reflexo dessa “tara” pela intimidade alheia.

– Os reality shows têm bombado nos últimos 15, 20 anos. Isso mostra uma demanda da sociedade de ver o que é real ou espiar a intimidade do outro. O pornô amador também faz parte dessa transformação do privado em espetáculo – afirma o antropólogo Andreh Santos, especialista em sexualidade na Universidade Federal Fluminense.

Segundo uma pesquisa encomendada pela revista “Playboy” no Brasil, 63% dos assinantes dos canais Sexy Hot, Playboy TV, Private, Venus, Sextreme e For Man preferem cenas com mais naturalidade, que pareçam reais. Mas o diretor da Playboy do Brasil, Maurício Paletta, acredita que as produtoras e os canais pagos não precisam temer a onda dos vídeos amadores. Para ele, sempre haverá espaço para os dois.

– O gênero amador está na moda, mas a verdade é que um pornô de qualidade, com boa iluminação, câmeras profissionais e uma história envolvente, sempre conquistará o público – diz Paletta. – Em muito vídeo amador, o máximo que você consegue enxergar é um colchão de mola subindo e descendo.

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Marina Cohen, do Globo