Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mais um ano de cachorro

Lá se foi mais um “ano de cachorro” para a internet… Calma! Há mais de uma interpretação para essa expressão, que é antiga e deve ter mais de 100 anos de existência (pelo calendário “canino”).

É que para a rede 1 ano equivale cabalisticamente a 7 anos normais. Ou seja, em 1 ano humano a rede progride 7! A analogia refere-se ao que se passa como nossos amigos latedores e peludos: vivem intensamente num ritmo sete vezes maior que o nosso. O tempo para eles corre muito mais rapidamente que para nós.

Já em 1965, Gordon Moore, um então jovem químico e que foi um dos fundadores da Intel, enunciara uma “lei” que previa que a cada 18 meses o avanço da tecnologia faria com que as características de um dispositivo eletrônico dobrassem de capacidade a um mesmo custo. Ou seja, se pagamos “x” por algo que tem “y” de capacidade (processamento, memória, resolução, banda etc.), um ano e meio depois, pelo mesmo “x”, teremos algo próximo do dobro de tudo isso.

Foi anunciada há 50 anos como uma forma impactante de medir o progresso tecnológico e o mais impressionante é que ela se mantem válida até hoje! Bits, quilobits, megabits, gigabits, terabits, petabits, exabits etc. etc. provam isso de forma cabal. Claro que a “lei” de Moore aplica-se também ao poder de estrago.

Hoje, batalham-se na rede guerras virtuais, mente-se e frauda-se através dela, espiona-se com sua ajuda. Mas nada disso embaça o que se conseguiu. Lógico que já há alguma mostra de exaustão. Os rins da “lei” de Moore já doem um pouco, sua glicemia está além do recomendável, usa óculos para ler de perto e, como qualquer cinquentona, perdeu algo do viço dos cabelos, mas ainda aguentará o repuxo por mais alguns anos… Ao menos é o que esperamos dela.

Problemas e desafios

A internet segue o mesmo ritmo frenético. Se em 1994 o Brasil inteiro estava conectado com 2 megabits/segundo à rede, essa banda hoje seria considerada inaceitável para a conexão de um único domicílio. Antes de a web existir, a internet era texto puro e, portanto, muito econômica. Nada de imagem, som, vídeo e… receber filmes em casa com alta definição, nem pensar! Algo totalmente inimaginável, mesmo nas previsões mais futuristas e agressivas. Banda em cabo submarino coaxial, metálico, competindo com telégrafo, telex e alguma telefonia era para ser disputada “a tapas”.

E, entretanto, eis-nos aqui, ao final de 2014, insaciáveis em nosso consumo de recursos. Talvez tenhamos perdido a arte de usar com parcimônia o que é (ou era) caro e raro, e isso pode ser uma mudança cultural ainda não muito bem avaliada. Mas, se perdemos alguns anéis, temos que batalhar para preservar os dedos.

E chegamos à parte boa da notícia. No ano de cão de 2014, fomos bem! Devíamos, de prazer, uivar para a lua cheia. Aprovamos o Marco Civil e esse é um feito internacionalmente reconhecido. Realizamos uma reunião multissetorial, a Netmundial, que gerou dois documentos que podem balizar o futuro da governança da rede (e ajudar a preservar os dedos!).

O Brasil é apontado como tendo a melhor legislação para proteção da rede e dos internautas e, nesse aspecto, está sendo seguido por outros países. E seu modelo de governança participativo e leve é considerado paradigma. Perseveremos!

Estamos tendo problemas e desafios novos, mas nada disso embaça o que se conseguiu. Vamos em frente que mais anos de cachorro nos aguardam! Bom 2015!

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Demi Getschko é conselheiro do Comitê Gestor da Internet e colunista do Estado de S.Paulo