Numa das últimas cenas da temporada final de The Newsroom (A Redação), série subestimada de Aaron Sorkin na HBO sobre os bastidores de um telejornal de TV paga, o âncora Will McAvoy (o ator Jeff Daniels) dá sua definição de jornalismo para sua produtora-executiva: “Tem um buraco num dos lados do barco. O buraco nunca vai ser consertado, nunca vai deixar de existir e não é possível conseguir um barco novo. O que você tem de fazer é tirar a água mais rápido do que ela entra.”
O ano que termina foi pródigo em águas para dentro do barco do jornalismo brasileiro e mundial, informações em estado bruto que tiveram de ser contextualizadas com rapidez e precisão. Toda lista retrospectiva é arbitrária, mas impossível não encabeçar esta com a débâcle de dois campeões nacionais: seleção brasileira e Petrobras. A melhor tradução do assombro que tomou o país naqueles 18 minutos em que o Brasil levou os primeiros cinco gols do placar final de 7 x 1 é do humorístico brasilalemanhaeterno.com, que atualiza o placar indefinidamente, como se o jogo não tivesse acabado. No momento em que escrevo, estaríamos perdendo por 20.540 a 2.739.
Da mesma maneira, a impressão que se tem é que, se a Operação Lava Jato não tivesse sido deflagrada em março, o rombo da corrupção na Petrobras não ficaria nos US$ 10 bilhões atuais, segundo cálculos feitos sobre o desvio – seguiria crescendo a cada minuto.
Tantos outros eventos poderiam ser elencados. Eduardo Campos morreu e deixou Marina como a presidente Porcina, a que foi sem nunca ter sido; Aécio quase chegou lá e deixou a Dilma seu programa econômico, que ela parece ter adotado; highlander da política local, o clã Sarney saiu de cena.
De vento em popa
No campo externo, houve a improvável reaproximação de dois inimigos, Cuba-EUA, liderada por um ditador octogenário e um democrata desacreditado e mediada por um papa argentino; uma sonda pousou num cometa; o ebola invadiu o mundo dos brancos e ricos.
Num momento em que cada vez mais atores disputam a atenção do leitor, que tem cada vez menos tempo, nunca se remou tanto na imprensa para relatar, interpretar e analisar acontecimentos tão complexos tão rapidamente.
Nunca se consumiu tanta notícia, também. Segundo estudos recentes do Pew Research Center e do McKinsey Institute, a geração que tem entre 20 e 30 anos hoje lê mais que a de seus pais e avós. O acesso à informação também é mais fácil, embora a confiabilidade dela seja de mais difícil aferição.
Com isso, cresce a importância do jornalista profissional. É um trabalho sem fim, como o do barqueiro da metáfora.
Em 2015, pode até faltar água em São Paulo – outra notícia importante –, mas o barco noticioso continuará navegando.
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Sérgio Dávila é editor-executivo da Folha de S.Paulo