Com quatro páginas e tiragem de 2.025 exemplares, A Província de São Paulo começou a circular em 4 de janeiro de 1875 numa São Paulo de apenas 31 mil habitantes. Fundada por um grupo de liberais republicanos quando o País era ainda uma monarquia, tinha como lema “fazer da independência o apanágio de sua força”.
Nesses 140 anos de existência, o jornal que ganhou o nome atual em 1890 informou várias gerações de leitores sobre os principais acontecimentos do Brasil e do mundo – alguns deles mesclam-se com a própria história do Estado.
Foi num sobrado branco com janelas e sacada de madeira pintadas de verde no centro da cidade que o jornal foi redigido, composto, impresso e distribuído pela primeira vez. Todas as seções funcionavam no mesmo imóvel da Rua do Palácio, atual Rua do Tesouro. A redação ficava na parte de cima e o escritório administrativo e as oficinas ocupavam a parte de baixo.
Mesmo saindo com atraso de três dias – o planejado era que circulasse no primeiro dia de 1875 –, a primeira edição do jornal foi comemorada com doces e champanhe.
“Foi uma noite esplêndida, de alegria; as officinas, engalanadas, muitas visitas, muitas felicitações, muitos desejos de victoria e prosperidade, a indefectível lauta mesa de doces, o estourar do champagne”, lembrou em 1939 o primeiro chefe da oficina e paginador do jornal, Hilario Pereira Magro Junior. Vários discursos, entre eles o do sócio-fundador Francisco Rangel Pestana, marcaram o dia de estreia.
A comemoração coroava um esforço que, entre outros feitos, incluiu trazer uma rotativa de segunda mão do Rio de Janeiro. A Alauzet ainda era do tipo “retiração”, como se dizia na gíria gráfica. Depois de impressas a primeira e a quarta páginas, retirava-se o papel para virá-lo e colocá-lo novamente para imprimir a segunda e a terceira páginas no verso. Composição e impressão eram feitas à luz de velas de sebo espetadas ao lado das caixas de composição. A rotação da máquina era executada por seis ex-escravos libertos contratados para a tarefa.
A abolição da escravidão, 13 anos após a fundação do jornal, foi um dos grandes acontecimentos noticiados no fim de século 19. “Já não há mais escravos no Brazil. A lei n.3353 de 13 de maio de 1888 assim o declara no meio de festas que se estendem por todo o paiz, para a honra e glória desta nação da América”, dizia o texto “A Pátria Livre” em 15 de maio de 1888.
Nesse mesmo ano, o nome de Julio Mesquita, que começara a trabalhar na Província três anos antes, apareceu pela primeira vez como diretor do jornal do qual se tornaria o único proprietário. No ano seguinte, a proclamação da República rendeu outra edição histórica. A capa apenas com os dizeres “Viva a República” sobre fundo branco é considerada até hoje uma ousadia do design gráfico. Outras inovações capitaneadas por Julio Mesquita transformariam o jornal num dos mais importantes do País. Nos primeiros anos da República, ele enviou Euclides da Cunha para cobrir o conflito de Canudos no sertão da Bahia. O relato publicado no jornal seria o embrião do clássico Os Sertões. Já no século 20, um outro conflito, a 1.ª Guerra Mundial, colocou o jornal na vanguarda do jornalismo – uma edição noturna, apelidada de Estadinho, atualizava as informações e trazia uma análise contextualizada e apurada.
A inovação se repetiu anos depois com o relançamento do Estadinho na 2.ª Guerra Mundial, mas durou pouco – o jornal foi tomado pela ditadura de Getúlio Vargas meses após o início da guerra.
Os cinco anos em que o Estado passou sob intervenção não são considerados na história do jornal. O período 1940-1945, porém, não foi o único em que o jornal foi impedido de produzir seus conteúdos livremente.
No auge da ditadura militar (1964-1985), após a edição de 13 de dezembro de 1968 ser apreendida, censores atuaram por anos dentro da gráfica do jornal cortando e proibindo a publicação de determinadas notícias. Ficou famosa a substituição de textos vetados por versos de Camões.
Valores
A censura acabou exatamente quando o jornal completou 100 anos. No dia de aniversário, em seu editorial, o jornal reafirmou o que publicara cem anos antes: “Continuaremos fiéis aos princípios em que acreditamos. Como sempre, nossa independência, face ao poder político como ao poder econômico, é inegociável”. Princípios que permanecem até hoje.