No dia 21 de janeiro de 2005 eu tinha 55 anos de idade, 40 anos de jornalismo profissional, exercido em alguns dos principais órgãos da imprensa brasileira, como Veja e O Estado de S. Paulo, mais de duas dezenas de livros publicados, individualmente ou em forma coletiva, reconhecimento nacional e internacional, prêmios acumulados e milhares de textos escritos. Podia ser considerado bem sucedido na profissão.
Só havia um problema: eu me tornara um outsider, daquelas pessoas que caminham no sentido inverso do dominante, aplicando suas ideias e buscando realizar seus ideais. Profissionalmente, esse ideal (quase uma utopia) era exercer um jornalismo realmente independente, autônomo, crítico, comprometido com a sociedade.
A materialização dessa busca era o Jornal Pessoal, publicação única por sua fé na força da verdade. Para não se ver limitado por qualquer condicionante, o jornal, que já completou 27 anos, não aceita publicidade, adota o formato mais barato, é feito por uma única pessoa e vive da venda diretamente ao público, o que significa se condenar a ser pobre. Pobre de recursos materiais, rico de conteúdo.
Tão substancial, no sentido da mais ampla abordagem dos seus temas, que me acarretou 33 processos na justiça a partir de 1992, ameaças de morte e uma agressão física. Essa agressão aconteceu justamente em 21 de janeiro de 2005, praticada por um dos donos do grupo Liberal, Ronaldo Maiorana, motivada por um artigo do jornal que não foi contestado de público, com argumentos racionais. A violência física foi a resposta da intolerância e do abuso de poder ao exercício da liberdade de expressão.
História real
Passados 10 anos, lancei um livro – Ameaça letal, a imprensa do Pará – que não trata exatamente desse tema, já suficientemente abordado. Nele são reproduzidos artigos publicados no Jornal Pessoal a partir do ano seguinte ao da agressão. O propósito dessa coletânea é mostrar as razões verdadeiras das tentativas de intimidação e destruição do jornal: para que não escreva a história verdadeira do cotidiano. Os fatos apurados e divulgados no dia a dia são a matéria prima consistente do significado dos acontecimentos e da direção para a qual eles apontam. História que pessoas contrariadas pela verdade não querem que seja escrita. Daí investirem contra a pequena, quase minúscula publicação.
Agrupados cronologicamente, os artigos mostram que a história da imprensa, seu tema básico, é também a história do poder. No Pará, essa coincidência é ainda maior em função da polaridade estabelecida na disputa entre os dois principais grupos de comunicação, que se posicionam de um lado e de outro da estrutura política de dominação.
É uma história real dos nossos tempos, que dedico aos meus netos Rodrigo, Amanda, Maria Clara, Beatriz e Gabriela, com a fé e a esperança de que mantenham e renovem esse patrimônio moral, intelectual e, sobretudo, humano.
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Lúcio Flávio Pinto é jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)