Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Livro discute os desafios da profissão

O jornalismo tem sofrido uma profunda transformação nas últimas décadas. As inovações tecnológicas, cada vez mais aceleradas, e a chamada crise da modernidade colocaram em questão não apenas um modelo de negócio estabelecido por mais de um século, no caso dos jornais impressos, mas também o próprio papel e o lugar do jornalista na sociedade. Compreender este processo é o objetivo de Adriana Barsotti no livro “Jornalista em mutação – Do cão de guarda ao mobilizador de audiência” (Editora Insular), que será lançado segunda-feira [26/1], às 19h30m, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon, durante o evento Prosa nas Livrarias. O debate terá a participação de Pedro Doria, editor-executivo de plataformas digitais do GLOBO. O livro é uma versão revista e atualizada da dissertação de mestrado defendida pela autora no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da PUC-Rio e vencedora do Prêmio Compós de Melhor Dissertação, da Associação Nacional dos Programas de Pós-graduação em Comunicação.

Adriana trabalhou em redações de jornais e revistas por mais de duas décadas e, no GLOBO, foi uma das criadoras e primeira editora da revista vespertina diária “Globo a Mais”, 100% digital. A motivação para fazer o trabalho veio das transformações que ela observou ao longo da sua carreira na profissão.

– Quando fui para o mestrado, meu interesse era nas transformações que via nas redações e a minha vivência profissional facilitou bastante. Na pesquisa, optei por me concentrar na atuação dos editores das homes (dos sites do GLOBO e do “Extra”) como uma forma de reavaliar a teoria do gatekeeper (que analisa como o jornalista “filtra” o que vira notícia), a mais antiga sobre o jornalismo. Queria ver até que ponto esse papel do jornalista tinha sido flexibilizado ou não – explica Adriana.

De mediador a mobilizador

A teoria do gatekeeper foi desenvolvida por David White em 1950 nos Estados Unidos. No seu estudo, White mostrou que só 10% das notícias, entre as produzidas por repórteres e despachos de agências de notícias, passaram pelo filtro do editor de primeira página de um jornal médio americano. A principal justificativa para a exclusão foi a falta de espaço.

Na sua pesquisa, a jornalista fez um paralelo entre o ofício do editor analisado por White e o seu equivalente no ambiente digital, os editores das capas dos sites. No período de cinco dias úteis, os editores aproveitaram quase 80% das notícias sugeridas. Uma inversão significativa em relação ao encontrado por White. Contudo, Adriana não considera que o papel do jornalista enquanto gatekeeper tenha acabado. Com a avalanche de dados que chegam por todos os lados na internet e o retorno imediato dado pelos leitores, através de estatísticas de audiência e comentários nas redes sociais, o jornalista se torna, mais do que um mediador, um mobilizador da audiência, defende Adriana.

– Houve uma elasticidade porque não existe a limitação do espaço físico do jornal. Além disso, o volume de informação que o editor recebe é muito maior. Hoje, informações vêm de blogs, sites institucionais, agências, é uma quantidade gigantesca. Mas o editor continua com a palavra final e o poder de selecionar as notícias pelos critérios jornalísticos padrões. Não é porque há espaço que ele vai publicar. Se não, teria publicado 100% – argumenta ela. – Mesmo assim, ele está mais atento e procurando engajar o público, que se manifesta através de enquetes e das listas de reportagens mais lidas e mais comentadas.

Adriana discorda da visão de que o jornalista seria dispensável num momento em que todos podem produzir e consumir informação. Para ela, os questionamentos que a profissão vive hoje devem ser vistos dentro de uma crise muito mais ampla que perpassa toda a sociedade.

– O jornalismo traduz a sociedade. Qual o mundo contemporâneo em que vivemos? É o mundo das comunidades, do hedonismo, do individualismo, sem utopias. Não há um projeto pelo qual se deve lutar, as pessoas vivem o presente porque desapareceu uma perspectiva de futuro. Essa é a crise da modernidade e o jornalismo também é atravessado por ela.

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Leonardo Cazes, do Globo