Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Portas da leitura, um sonho

Entrei no porão da Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB), pela primeira vez, quando estava com 18 anos de idade. Comecei como contínuo, encontrei livros diversificados. Cuidava de todos com dedicação total. Depois, fui auxiliar de biblioteca e finalmente bibliotecário, cuidando da biblioteca particular de Rui Barbosa, durante muito tempo, entre outras tarefas.

Meu sonho derradeiro realizou-se antes de me aposentar, difundindo literatura infantil e juvenil, dentro da Biblioteca Infantil Maria Mazzetti (BIMM). Foram 20 anos dedicados às crianças e jovens no jardim desse museu-casa, inesquecível para quem um dia percorreu suas dependências preservadas para o povo brasileiro.

Posso afirmar, por causa dessa viagem ao redor de tantos livros oferecidos democraticamente à população, que bibliotecas são fundamentais para formar leitores em qualquer ponto do planeta. Além disso, bibliotecas estimulam a escrita criativa, a organização do pensamento, a expressão oral e contribui para a saúde mental.

A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) desenvolve diversos projetos de estímulo à leitura e à valorização da literatura infantil e juvenil. Promove concurso sobre os melhores programas de incentivo à leitura para crianças e jovens, ajudando a implantar bibliotecas alternativas nas localidades mais remotas do país.

A BIMM, situada no jardim da FCRB, foi criada em parceria com a FNLIJ.

O campo de ação da biblioteca cresceu tanto com o apoio da comunidade do bairro de Botafogo que a FCRB adotou definitivamente a existência da BIMM.

Novos projetos

A Bela Adormecida, após a Hora do Conto, costumava “dormir” atrás do quiosque, onde Rui Barbosa tomava banho antes de 1923, provocando encantamento criativo entre os frequentadores. Quem iria acordar a Bela com um beijo no rosto?

Rapunzel deslumbrou o público leitor, com sua torre humana, nas comemorações dos “200 anos Grimm”, sob patrocínio da FNLIJ. Com essa dramatização, o ator Flavio Cactus iniciou seu trajeto de encenador, pesquisando a vanguarda teatral de intervenção urbana.

Vamos sonhar, vamos sonhar! Já pensaram, caros itabiranos, o sucesso que seria a presença de uma biblioteca infantil na casa onde morou o santeiro Alfredo Duval, na rua do Bongue? Seria uma forma de preservar a memória desse ativista comunitário itabirano, imortalizado por Carlos Drummond de Andrade em sua poesia.

O espaço cultural teria livros para adultos e crianças, computadores, quintal e tintas para despertar a criatividade.

O estardalhaço dessa iniciativa, no mínimo, levaria o prefeito de Itabira, Damon de Sena, à reeleição por unanimidade. E ele teria também a satisfação de ver a mudança acontecer. Poderia até dispensar marqueteiros de plantão. Estes estão na moda, mas a paciência do povo tem limite, e esse limite se definirá nas eleições futuras, com certeza.

Manter as portas das bibliotecas abertas para a liberdade de expressão é o grande desafio neste país ou em qualquer outro: “A porta simboliza o local de passagem entre dois estados, entre dois mundos, entre o conhecido e o desconhecido, a luz e as trevas, o tesouro e a pobreza extrema. A porta se abre sobre um mistério. Mas ela tem um valor dinâmico, psicológico; pois não somente indica uma passagem, mas convida a atravessá-la. É o convite à viagem rumo a um além…” Está no Dicionário de Símbolos, de Jean Chevalier e Alain Gheerbrant.

O “além”, escondido nos livros, é a sabedoria que os leitores poderão conquistar e expandir. Momentos de felicidade. Liberdade de pensamento. Fruição da leitura democrática e pacifista.

O “mistério”, sobre o qual as bibliotecas permanecem abertas, consiste em dilapidar velhos conceitos, preconceitos, ignorâncias, ideias e sentimentos, para lapidar novos projetos existenciais.

O leitor criativo, bem informado, não se ilude com políticos carreiristas.

Para todos

Drummond escreveu um poema indignado sobre o assunto que estamos exemplificando: “Leituras! Leituras! Como quem diz: Navios… Sair pelo mundo voando na capa vermelha de Júlio Verne. Mas por que me deram para livro escolar a Cultura dos Campos de Assis Brasil? O mundo é só fosfatos – lotes de 25 hectares – soja – fumo – alfafa – batata-doce – mandioca – pastos de cria – pastos de engorda. Se algum dia eu for rei, baixarei um decreto condenando este Assis a ler a sua obra” (“Iniciação Literária” em Menino Antigo).

Será que autoridades, profissionais liberais, parceiros, a população & companhia poderão levar esse sonho às portas da educação para todos em Itabira?

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Domingo Gonzáles Cruz é poeta