Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Uma conta no vermelho

Alguns anos atrás, um executivo de uma grande empresa se aproximou do jornalista Vilmar Berna, um dos ícones da mídia ambiental no Brasil, e queixou-se: “Investi milhões para melhorar o desempenho ambiental da minha empresa e ninguém se importou.” A resposta de Berna saiu em forma de pergunta: “Contou para quem?”

Esse é um dos dilemas do jornalismo que tem a sustentabilidade como eixo transversal. As empresas, mesmo aquelas que alegam “ter sustentabilidade no DNA”, não incorporam esses valores a seus planos de comunicação. As mídias que cobrem o cotidiano da sustentabilidade não recebem recursos para bancar suas atividades, e aquelas que recebem as verbas de publicidade de empresas comprometidas com a sustentabilidade não têm, na maioria das vezes, nenhum compromisso editorial com o assunto.

Grande parte das empresas quer ver suas ações em sustentabilidade em destaque nas mesmas mídias que dão visibilidade a seus resultados econômicos. Muitas vezes esses não são canais comunicantes, ou seja, as iniciativas que agregam valor sob o ponto de vista social e ambiental não são pauta para os meios de comunicação convencionais. Pelo contrário, são poucos os editores de economia que já compreendem os valores da sustentabilidade e não tratam com desdém ações que não estão focadas no estrito resultado financeiro das empresas.

O desafio de se construir cadeias de valor sustentáveis e comprometer empresas com uma economia menos predatória é, também, um desafio que passa pela forma de se comunicar a sustentabilidade, de maneira a mostrar os resultados de ações e investimentos de forma tangível, compreensível para a sociedade em geral, mas, principalmente, compreensível para os investidores, justamente aqueles que precisam acreditar nesses novos valores.

É fato que nos últimos anos as pautas sobre investimentos sociais e ambientais ganharam espaço nas editorias de economia. No entanto, ainda é pouco e, na maior parte das vezes apenas são parte de “projetos especiais”. Esses espaços tendem a se ampliar, mas de forma muito lenta diante da urgência dos desafios ambientais e sociais de classe planetária.

As transformações nos modelos econômicos e empresariais precisam de uma grande escala de informações, de tal maneira que sociedade, acionistas, executivos e empreendedores compreendam quais são os dilemas e como podem enfrentá-los sem comprometer a viabilidade econômica de suas organizações.

Como todas as revoluções da história, a sustentabilidade também tem suas vanguardas. São líderes, empresas, organizações sociais, intelectuais e, também, meios de comunicação que vão além da estreita visão do resultado financeiro trimestral e ajudam a difundir um modelo de desenvolvimento capaz de oferecer qualidade de vida a todas as pessoas.

Entre essas vanguardas estão alguns jornalistas e meios de comunicação que se dedicam à difusão de informações e conhecimentos que ajudam a estruturar uma economia sustentável. São meios que fizeram a opção por um tipo de jornalismo que não olha a realidade através de retrovisores, mas lançam o olhar à frente e ajudam a formular as questões estruturantes de uma sociedade menos desigual.

Da mesma maneira que as empresas que se lançam na vanguarda da sustentabilidade, os meios de comunicação que abraçam essa pauta pagam o preço do pioneirismo e do desbravamento de mercados. Defendem bandeiras que ainda encontram muitos opositores e desinformação. São meios que abrem espaço a ideias inovadoras e a formadores de opinião que navegam contra a corrente da economia convencional.

Essas publicações, entre as quais se alinham Ideia Sustentável e Agência Envolverde, além de dezenas de outras, deveriam ser canais preferenciais para o aprofundamento do debate social e econômico da sustentabilidade. No entanto, em sua grande parte, estão sufocadas pela falta de oxigênio financeiro.

Financiamento à informação

Um dos debates importantes para a sociedade brasileira é como o país financia a informação jornalística oferecida à sociedade. Na maior parte das vezes, o modelo de financiamento passa pelo mercado publicitário, ou seja, anúncios de produtos ou serviços são responsáveis pelo financiamento das mídias. Essa prática é comum em diversas partes do mundo; no entanto, em muitos lugares, governos ou organizações da sociedade civil procuram gerar um equilíbrio entre informações que o público deseja e informações de que a sociedade necessita.

O financiamento estrito via mercado publicitário gera distorções, principalmente porque o “anunciante” tem interesses próprios e seu objetivo é atingir o máximo de pessoas possível. Portanto, veículos que atuam com informação qualificada têm dificuldade em receber esse tipo de aporte de recursos, uma vez que atingem públicos altamente qualificados, mas em número limitado.

O aporte de publicidade normalmente é feito por fatores de número de pessoas atingidas e grupos de interesse. Isso dá um alento a mídias que atuam de forma segmentada em nichos profissionais e setoriais, ou seja, setores de interesse de consumo específico. No caso dos meios de comunicação voltados para a sustentabilidade, isso não ocorre, porque não há uma demanda identificável por produtos e serviços que possa atrair a publicidade de grandes empresas.

Entre os jornalistas que atuam na área de sustentabilidade, há um certo consenso sobre a necessidade de que as empresas comprometidas com um modelo de desenvolvimento menos predatório deveriam destinar um percentual de sua publicidade institucional para o fortalecimento da cobertura jornalística com foco nessa nova economia. Dessa forma haveria mais veículos e mais profissionais interessados em cobrir sustentabilidade de uma forma sistêmica.

Há uma preocupação entre editores dessa área em relação à queda das verbas publicitárias aportadas nesses meios após a Rio+20, que ocorreu em junho de 2012. Essa preocupação ganha mais fôlego diante da constatação de que os próximos anos serão tempos de grandes eventos esportivos e, também, de eleições, e o cenário da comunicação deve ter esse viés. Chamar a atenção das empresas para a necessidade de financiar a informação e o conhecimento social da sustentabilidade é uma prioridade para que as transformações na economia ganhem escala.

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Dal Marcondes é jornalista, diretor executivo do Instituto Envolverde e editor do Portal Envolverde