“As armas foram todas parar nas mãos dos radicais islâmicos…” (Do noticiário de canto de página dos últimos dias)
A avalancha de informações liberadas no noticiário nosso de cada dia, por processos midiáticos os mais variados, não favorece muitas vezes o conhecimento pronto de dados relevantes por parte da opinião pública. Colhidos ao acaso, fruto de leituras mais atentas, aqui estão ligeiras amostras de situações insuspeitadas que costumam volta e meia ocorrer sob ângulo diferenciado de análise.
Os Estados Unidos promoveram recentemente vários pactos militares, inclusive com a Turquia, visando o fornecimento de armas e treinamento a rebeldes sírios “moderados” para combater a ditadura síria de Bashar al Assad e, por extensão, também, o tal “califado do terror”. O compromisso lembrou filme já visto. Pois não é que os temores levantados se confirmaram bem mais cedo do que se esperava? Agorinha mesmo, começo de março, a Harakat Hazm, organização de “rebeldes moderados” sírios, recebeu a ajuda bélica prometida. Pra estupefação geral, anunciou dias depois sua autodissolução. Do atordoante episódio resultou, de imediato, a “transferência” dos equipamentos bélicos que lhe foram “confiados” para combater “inimigos” exatamente para os próprios. A al-Nustra, ligada à al Qaida, contam despachos da conturbada região, patrocinou até desfile de pompa de seus aguerridos militantes para exibir os misseis e demais peças do arsenal generosamente “doados”. Ampliando o estrago produzido pela “inspirada estratégia” política, os “bravos” combatentes do grupo dissolvido confirmaram bem depressa, incondicional adesão às forças do sinistro “califado do terror”.
Outra mais. Com aquele estilo radical que tanto o notabiliza e que representa um empecilho sério à causa da paz no conturbado Oriente Médio, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, de Israel, pontuando gesto sem precedentes na diplomacia internacional, decidiu desafiar – e, mais do que isso, provocar – o presidente Barack Obama em seus próprios redutos. Com o apoio das também radicais lideranças republicanas, ocupou a tribuna do Congresso dos Estados Unidos para se opor, veementemente, apelando para argumentos irreais, nascidos de paranoia demagógica, às negociações em curso entre a Casa Branca, países europeus e o Irã, com vistas a um acordo nuclear que elimine a possibilidade de o país dos aiatolás raivosos passarem a integrar o fechado clube dos detentores de armas atômicas. Clube do qual, por sinal, Israel faz parte – na moita como se costuma dizer – e não é de hoje.
Netanyahu chegou ao extremo de contrariar relatórios dos serviços de inteligência dos Estados Unidos e, segundo consta, até mesmo dos serviços de inteligência de seu país, segundo os quais as cláusulas definidas no pacto com os iranianos representam garantias mais do que suficientes, sob o ponto de vista técnico, para impedir a criação de mais um indesejado arsenal bélico. Está mirando, com essa sua nova ofensiva contra a redução de tensões na região, a conquista do eleitorado mais extremista, de forma a permanecer no posto de chefe de governo nas eleições que se avizinham. Merece ser salientado que parte da opinião pública israelita vem expressando discordância aberta aos métodos adotados pelo premier. De outra parte, há também a registrar que sua conduta desencadeou reações desfavoráveis nos Estados Unidos, a ponto da líder democrata na Câmara de Representantes tomar da palavra para dizer, com todas as letras, que a posição adotada pelo líder radical israelita constituiu “um insulto à inteligência do país”. Mais ainda: tudo indica que seu inconformado protesto ressoará como voz isolada no contexto internacional. O acordo com o Irã é tido como “favas contadas”. Os governos dos Estados Unidos e dos países europeus empenhados nas negociações tem-no na conta de um triunfo diplomático de singular significação para a história do mundo.
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Cesar Vanucci é jornalista