Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Documentário sobre suposto assassino levanta questões éticas

O episódio final de um documentário sobre as suspeitas de assassinato sobre um milionário americano teve mais de um milhão de telespectadores um dia após a prisão de seu personagem principal. O diretor Andrew Jarecki acompanhou a história do excêntrico Robert Durst, suspeito de matar sua mulher em 1982 e, anos depois, uma amiga da família, entrevistando-o por duas vezes, em 2010 e 2012.

Durst, de 71 anos, também foi a julgamento em 2003 acusado de matar um vizinho dois anos antes. Ele alegou legítima defesa e foi inocentado do caso. O milionário, que é herdeiro de um império imobiliário de Nova York, sempre alegara inocência. Ele foi preso na noite de sábado [15/3] em Nova Orleans e indiciado pela morte da amiga Susan Berman, em 2000. Susan foi assassinada um dia antes de depor sobre o desaparecimento da mulher de Durst, Kathleen.

Confissão acidental

Na noite seguinte à prisão, o sexto e último episódio do programa The Jinx: The Life and Deaths of Robert Durst (O Pé-frio: a vida e as mortes de Robert Durst) foi ao ar na HBO com uma revelação bombástica: uma aparente confissão de culpa do milionário.

A confissão foi conseguida por acidente, quando Durst foi ao banheiro, após uma das entrevistas, sem perceber que ainda tinha um microfone preso à roupa. “O que foi que eu fiz? Matei todos eles, é claro”, disse a si mesmo dentro do banheiro, sem desconfiar que estava sendo gravado.

O fato da prisão de Durst ter coincidido com a apresentação do último capítulo do documentário levantou desconfianças de que Andrew Jarecki e a polícia de Los Angeles tivessem segurado o desfecho a fim de conferir dramaticidade e garantir audiência ao programa. O diretor, no entanto, nega a suposta parceria com a polícia e diz que não possui esse tipo de poder.

Segundo ele, o material gravado acidentalmente no banheiro foi descoberto dois anos depois da entrevista, quando um editor analisava as gravações.

The Jinx foi um dos temas mais populares no Twitter nos EUA na noite de exibição de seu último episódio. De acordo com a medição do Nielsen Twitter TV Ratings, foram 35 mil tuítes, vistos 11,1 milhões de vezes por 2,8 milhões de pessoas.

Ética e justiça

Mas a exibição do documentário provocou debates sobre questões éticas. Os produtores deveriam ter exibido a confissão, ou ao menos avisado Durst de que ele havia sido gravado? Em uma cena do episódio final, o diretor confronta o milionário diante de novas provas. “Deveriam os produtores ter permitido que a polícia interrogasse Jarecki [o diretor] sobre as novas evidências primeiro? Eles os colocaram – e a outros – em perigo ao falar primeiro com Durst sobre elas? Quando eles teriam a obrigação de contar às autoridades?”, questiona Eliana Dockterman em artigo no site da revista Time.

Para Jonathan Mahler, em artigo no New York Times, a prisão do milionário foi, para o documentário, “o tipo de publicidade que você não pode comprar”. Segundo ele, a coincidência de datas entre a prisão e a exibição do episódio final foi algo grandioso, mas, justamente por isso, provocou as tais questões éticas. “Quando os cineastas compartilharam suas descobertas incriminatórias com a polícia? Teria a justiça sido adiada – e um suspeito de assassinato deixado livre – em nome do documentário?”, questiona.

Jarecki e o produtor Marc Smerling entrevistaram Durst em dezembro de 2010, em Los Angeles, e em abril de 2012, em Nova York. Eles dizem que informaram à polícia sobre estes encontros somente em outubro de 2012, porque queriam terminar seu trabalho com o milionário sem sofrer interferência. “Obviamente, não somos agentes da lei, e é importante que mantenhamos nossas posições de jornalistas e documentaristas”, afirmou Jarecki ao Times, insistindo que não houve nenhuma parceria com a polícia para que a prisão coincidisse com o fim do documentário.