Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O ministro e as novelas

Professor titular de Ética e Filosofia Política na USP, autor de inúmeros livros e estudos acadêmicos, o novo ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, é também um apreciador de cultura popular, em especial, de telenovelas.

Em livro publicado em 2005, o filósofo defende que “a novela é o gênero dramático em que o Brasil melhor se saiu”. Na sua visão, os folhetins da Globo, em especial, captaram o espírito do tempo e têm grande alcance social. “É errado dizer que a TV não educa. Ela varreu preconceitos de costumes”.

“O Afeto Autoritário” (Ateliê Editorial, 224 págs., esgotado) reúne textos publicados por Janine Ribeiro entre 2000 e 2003 no jornal “O Estado de S. Paulo” e na revista “Bravo”, além de um estudo sobre o mercado audiovisual divulgado em publicação do Ministério da Cultura, em 2001.

Apesar de escritos, em sua maioria, há cerca de quinze anos, os textos descrevem um quadro que permanece semelhante ao atual. “Em matéria de costumes, a TV fez há muito tempo uma opção pela melhora. No humor, o elo mais fraco da sociedade é ridicularizado. No noticiário, é ignorado. Na novela, porém, ele é valorizado.”

Um dos aspectos mais interessantes é a forma como enxerga os folhetins. Na coluna que serve de título ao livro, diz: “Tenho defendido as novelas. Contra a opinião de muitos colegas da universidade, sustento que elas têm papel positivo na transmissão de certos ideais, em especial o da igualdade da mulher em relação ao homem e o da condenação do preconceito de raça”.

Pluralidade de opiniões

Janine Ribeiro lamenta, porém, que as novelas frequentemente fazem “das personagens despóticas figuras agradáveis, humanas, quase positivas”, deixando de criticar o que chama de “afeto autoritário que nelas se vê”.

Outro tema tratado na coletânea é o papel do Estado diante da falta de qualidade e dos abusos cometidos por emissoras de televisão. O filósofo se diz contra qualquer tipo de interferência que lembre censura.

“O melhor modo de controlar os excessos da TV é ter um público que seja crítico.” Em outro texto, acrescenta: “O público precisa sair do marasmo. Falando, vai melhorar o que ele fala “” e com isso, a TV”.

Talvez otimista demais, ou ingênua, essa visão é deixada de lado por uma outra mais pragmática no texto “O poder público ausente: a TV nas mãos do mercado”. Aqui Janine Ribeiro fala em “controle social da telinha” como resposta à incapacidade de a sociedade fazer valer a sua opinião sobre as emissoras de TV.

O autor se declara contra um modelo de auto-regulamentação, nos moldes do Conar (que rege a publicidade), uma tese levantada nos anos 90. “O problema é o dos excessos da TV em face da cidadania e da ética, enquanto a solução aventada é a do autocontrole pelo mesmo mercado, que lucra infringindo direitos humanos reconhecidos por nosso país.”

Sem dar detalhes, propõe: “O que o poder do Estado pode fazer é contribuir, pela via legislativa, para implementar canais de expressão, bem como determinar a pluralidade de opiniões nos meios de comunicação”. A posse de Janine Ribeiro como ministro da Educação pode ser bom pretexto para a reedição deste livro. São teses polêmicas que merecem ser discutidas.

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Mauricio Stycer, da Folha de S.Paulo