Quem, como eu, abriu o jornal Folha de S.Paulo na edição de domingo (5/4), deparou com coisas assustadoras, a começar pelo preço de R$ 5,50 (fora da capital paulista) e da chamada de primeira página: “Renan Calheiros – Banco Central deve se basear em políticas de Estado e não de governos”.
Mas o mais grave estava dentro. O jornal sofreu um enxugamento em que a maior vítima foi o caderno cultural Ilustríssima, reduzido de oito para duas páginas compactadas na Ilustrada, de variedades.
Como a Folha nada informou das mudanças não se sabe se elas foram acompanhadas da demissão e dispensa de jornalistas e articulistas – caso do economista do BNDES Marcelo Miterhoff, durante a semana.
Mas as desagradáveis surpresas não pararam aí. Logo na página 2, de Opinião, vinha o artigo do ex-presidente do Banco Central (BC), Henrique Meireles, “Independência pela meta”, defendendo a autonomia do BC e tendo ao lado, na página 3, o principal, “A inadiável independência do BC”, do presidente do Congresso e senador Renan Calheiros (PMDB/AL). Tudo isto com uma carta de leitor, na mesma página e edição ao lado, “BC independente”, elogiando o artigo de Renan! Quer dizer, o leitor, José Poacsek, de Avanhandava, SP, deve ter lido o artigo do Renan antes dele ser editado!
Como a Folha de S.Paulo, no passado, já noticiou o resultado de uma corrida de Fórmula 1 antes que ela acontecesse, a impossível coincidência do Renan poderia ser relevada. Só que naquela ocasião, foram noticiados dois possíveis finais da corrida, enquanto agora está implicitamente claro que o jornal defende a independência do Banco Central mais do que nunca. “Independência” que significava, sobretudo, o fim do seu controle pelo Ministério da Fazenda e Presidência da República, com a efetivação do BC como “banco dos bancos” como escreveu Meireles, tudo isto pago, claro, com o dinheiro do contribuinte.
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Zulcy Borges de Souza é jornalista