São muito importantes as eleições municipais, ainda que no Rio certos candidatos se chamem Pitbull, Pato, Baleinha, Peixinho, Bodinho, Jegue, Bacalhau, Pipoca, Macarrão, Maria Chupetinha, Maria Canhão, Mixaria e Shazan. Provavelmente em muitos outros municípios dê-se algo semelhante. O brasileiro exerce seus direitos num município.
Mas onde exerce sua cidadania o presidente do Banco Central? Ele não apresentou declaração de rendimentos em 2001 – era isento, alguém acredita? – afirmando que morava em Boston, nos EUA. À Justiça Eleitoral informou que morava em Goiânia, no Brasil.
O jornalista Elio Gaspari, diante de suas vagas e difusas réplicas, recomendou-lhe que se perguntasse ‘qual país, civilizado ou não, tem um presidente de Banco Central com as suas características domiciliares, tributárias e patrimoniais’. (O Globo, 28/7, pág. 7).
Na segunda metade do século 19, inconformado com a bandeira brasileira tremulando em navios negreiros, o poeta Castro Alves exclamou: ‘Tu, que da liberdade após a guerra/ foste hasteado dos heróis na lança/ antes te houvessem roto na batalha/ que servires a um povo de mortalha’.
Para que não venha a ser mortalha – aquela vez, os brasileiros não deixaram, pois aboliram a escravidão – é preciso fazer muito mais. Outras formas de violência, praticadas no cotidiano dos mais de cinco mil municípios brasileiros, expõem a face cruel de pequenos poderes, agora ainda mais amparados por omissões como a que está levando o governo a ignorar olimpicamente o episódio envolvendo tão alta autoridade.
Como vivemos numa sociedade democrática e com o Estado de Direito garantido, vêm aí as eleições que têm o fim de mudar os caminhos percorridos. E para tanto é indispensável antes esclarecer os episódios envolvendo o presidente do Banco Central, que deixou de ser ‘coisa de economistas ou políticos’.
Sem plágio
A ditadura tinha mais vergonha. No governo Médici, flagrado em ato de corrupção, praticado e ouvido nas areias de Copacabana, um governador do Paraná perdeu o mandato. Foi cassado pelo ditador diante das evidências que lhe foram apresentadas. Antes, os censores de plantão, sempre mais realistas do que o rei, recolheram a revista Veja das bancas. Vários brasileiros devem guardar a famosa edição, com o governador na capa.
Precisamos criar uma Boca Maldita nacional, inspirada no modelo homônimo de Curitiba, tribuna livre criada em 1957 e sacramentada oficialmente em 13 de dezembro de 1966. A Boca teve papel decisivo na cassação do governador Haroldo Leon Peres, ainda que seu lema seja ‘nada vejo, nada ouço, nada falo’. Foi decisivo e importante oásis para a liberdade de expressão durante a ditadura militar. O que não saía nos jornais, era cochichado ali. E todos ficavam sabendo de tudo.
Haroldo Leon Peres, carioca, fez sua vida profissional, como advogado, político e professor universitário em Maringá, no interior do Paraná. Governou por sete meses aquele Estado, nomeado pela ditadura militar, depois de eleição indireta na Assembléia Legislativa, como era de praxe, de 15 de março a 23 de setembro de 1971. Faleceu em 1992.
Em 1979, comentando as acusações que lhe pesavam, declarou à revista Quem (dezembro de 1979, nº 11): ‘Volto a reafirmar que eu nunca fui cassado, nunca fui processado, não existe contra mim, pelo menos não deve existir, porque senão eu teria sido notificado, nenhum processo pendente’.
A revista IstoÉ deu capa a Henrique Meirelles com esta chamada: ‘Henrique Meirelles, até o fechamento desta edição presidente do Banco Central do Brasil. O que ele não explica’.
Não quero plagiar a revista. Mas esclareço que quando escrevi este artigo, o nome do presidente do Banco Central era Henrique Meirelles. Se ele ainda o for na semana que vem, Deus tenha piedade de nós!
De que precisamos? Que o presidente do Banco Central se submeta à imprensa como se ela cumprisse o papel de Judiciário? Não! Mas que se explique. Fora do cargo. Depois, se for o caso, ele volta.