Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Joaquim Ferreira dos Santos

QUALIDADE NA TV

MULHERES

"Essas mulheres", copyright no. (www.no.com.br), 9/03/01

"E dizer que não faz muito tempo, sempre que batia o oito de março na folhinha, as avós dessas tchutchucas e popozudas iam para a praça chorar mágoas e queimar sutiã. Jornalisticamente o Dia Internacional da Mulher era mais divertido. Algumas eram tão feias e desproporcionadas que o sarro machista dizia ter o sutiã da Betty Friedan levado quatro dias para queimar todo. Maldades passadas. Elas tomaram conta dos seus orgasmos múltiplos, das contas bancárias, dos melhores salários do mercado de trabalho, da prefeitura de São Paulo e, no caso específico que cabe aqui exaltar, até da direção da Rede Globo de Televisão.

Alguns ainda insistem com a piadinha de que se mulher fosse bom Deus tinha uma. Outros sugerem o funk do Tapinha não Dói como a música do dia. Bobagens. O máximo de vingança que os homens poderiam curtir contra elas hoje seria, depois de todas essas vitórias conquistadas, observar o desespero da Marília Gabriela, da Ana Paula Padrão, da Fátima Bernardes e outras poderosas do telejornalismo em busca de pauta para debater o assunto. As mulheres já têm creche, escolhem os parceiros, dominam os bancos universitários, são delegadas de polícia. E agora, Marília? Mulher resolvida não dá matéria.

Trinta anos depois que a jornalista Marilene Dabus escandalizou o Rio entrevistando jogadores de futebol no gramado, Janaína Xavier, Mariana Becker, Soninha e dezenas de outras, que fazem o noticiário esportivo na televisão, olham a data na folhinha e telefonam-se para perguntar: ?querida, o que é mesmo que estamos comemorando?? O Dia de Zumbi dos Palmares costuma ser mais quente. Há motivos de luta. É verdade que as mulheres ainda não conseguiram narrar uma partida de futebol, mas também não chega a ser uma causa para se queimar todos aqueles sutiãs de novo – ainda mais agora que, pacificadas com a condição feminina, elas resolveram achar a peça bonitinha. Faltam palavras de ordem para turbinar o oito de março na televisão.

As mulheres conseguiram acabar com os programas femininos de prendas do lar, e é só por isso, ideologia, e não porque a mulher é a loba da mulher, que deixam a Ana Maria Braga, coitada, sozinha em sua luta contra o Chaves. Achavam-se ofendidas com uma dieta de receitas de bolo e pontos de crochê. Preferem a Mirian Leitão no tête-à-tête com o Malan. As profissionais do vídeo poderiam querer narrar um prêmio de Fórmula 1. Mas não têm pressa. Ainda há pouco a Lilian Wite Fibe precisava fazer cara enfezada para que a respeitassem no comando do Jornal Nacional. Relaxaram. A Fátima Bernardes, sua sucessora, já pode ser suave e vaidosa com seu cabelo que ora aparece negro e comprido, ora curto e com balaiage. Ninguém discute que ela pode. Fátima edita, apresenta e todo mundo sabe que antes ainda ela colocou os trigêmeos na escola. Vitaminada é pouco.

Essas vitórias mais ou menos recentes, conseguidas por mulheres de muito talento, chegam às novas gerações já tão consolidadas que nem se percebe mais terem sido motivo de luta. Pode soar exagerado, mas se há senadoras negras no Congresso, a televisão está fazendo sua parte quando coloca a modelinho Tathiani Mancini, estréia de quarta-feira passada no Erótica da MTV. Tathi anunciou para a garotada que, desde que com camisinha, vai fundo, gente, qualquer maneira de sexo vale a pena. O que falta? Há poucas negras no vídeo? Talvez. Mas há menos negros ainda, embora um pouquinho mais que em nossos escritórios. A bronca não é da televisão, que, como você já percebeu, vai refletindo na medida certa os avanços que as mulheres conseguem na sociedade. O problema é que felicidade não dá pauta. Faltam novas palavras de ordem às causas das mulheres.

Talvez fosse o caso de desmentir que o melhor movimento feminista continua sendo o dos quadris, e tentar desmobilizar de alguma maneira as popozudas e tchutchucas que estão disputando quem dá mais, audiência é claro, se a Galisteu ou a Gimenez. A baixaria do funk está nas ruas – mas se por um lado, sem malícia, a televisão podia ser mais crítica e menos ginecológica na hora de enquadrar os meneios das cachorras, por outro lado as meninas andam na ‘motinha’ justo para mostrar que os corpos finalmente lhes pertencem e ninguém tem mais nada a ver com isso. Enfim, ficou difícil arranjar uma pauta para que as mulheres, poderosas como nunca, problematizem o seu dia. Aquela foto de Jane Fonda de cabelo curto, camiseta e punhos cerrados é apenas um pôster bacana na parede – e, como o tapinha, não dói.

Recentemente, jovens humoristas procuraram revidar Luís Fernando Veríssimo, aquele que disse conhecer só um tipo de mulher 100%: desquitada, analisada e com apartamento. As redatoras do Garotas de Programa tentavam um humor que ridicularizasse o homem e essa sua mania de se coçar pelas ruas e orgasmar diante de um Quinze de Piracicaba versus Portuguesa Santista. Parece que um das piadas dizia que a diferença entre o sapo e o príncipe eram as cinco cervejas que a princesa tomou. Fracassou. Ainda vai levar algum tempo até que mulheres – será que elas vão entender que essa crítica é um elogio? – consigam produzir algo tão preconceituoso quanto o ?Em pezona na pia lavando louça?, o feminino casseta e planeta para ?Deitadão no sofá vendo televisão.? Elas sabem que 20 homens rindo de orelha à orelha é apenas um túnel do vento. Rirão por último. É melhor."

TV DO MINC

"Ministério da Cultura terá canal de TV", copyright Folha de S. Paulo, 7/03/01

"O Ministério da Cultura está investindo R$ 1,5 milhão na instalação de um canal próprio de televisão. Arte & Cultura entrará no ar em abril, com transmissões por cabo, durante duas horas diárias de segunda a sexta-feira e ao longo de três horas aos sábados e domingos.

Segundo afirmou à Folha o ministro da Cultura, Francisco Weffort, o perfil de programação ?chegará ao formato final depois de uma reunião com o Conselho de Política do ministério?. ?Por enquanto, estamos encaminhando com o secretário para o Desenvolvimento do Audiovisual, José Álvaro Moisés. Está tudo pronto. A grade está pronta?, acrescentou Weffort.

É certo que o canal não será exclusivamente dedicado à difusão de produções brasileiras. ?O objetivo é difusão cultural em geral. Vou batalhar para passar filme brasileiro, documentário brasileiro, coisas brasileiras, mas também não posso deixar de passar coisas de boa qualidade, até para nossa qualidade melhorar?, afirmou o ministro.

O projeto de instalação do canal vem sendo discutido com alguns setores da produção cultural, e o ministro se diz certo de alcançar ?um grande êxito?.

?Estamos tendo uma excelente repercussão, porque é evidente que todos os produtores culturais gostariam que a sua produção, além de aparecer para o seu público localizado, aparecesse num canal de televisão que não vai lhe cobrar nada para apresentá-la e vai ampliar sua difusão.?

De acordo com o ministro, o canal servirá também para difundir produções de alto nível, cujo orçamento tenha contado com a participação do ministério.

?Temos a possibilidade, pela Lei de Incentivo à Cultura, de que cada evento que se faça venha a ser documentado. Quer dizer, você faz um espetáculo de balé e monta um esquema para criar um documentário com o espetáculo. É objetivo democrático da Lei da Cultura que todo o povo veja o espetáculo, e não apenas aqueles que puderam ir ao local assistir?, afirma o ministro.

Weffort dá um exemplo: ?No ano passado, batalhamos para fazer o ?Candide?, de Bernstein, uma opereta linda, em tradução brasileira. Só pudemos apresentá-la durante um fim-de-semana. O que vou querer é filmar o ?Candide?, de Bernstein, e botar na televisão para que todo mundo veja. Por isso não tenho dúvidas de que será uma forma de difusão para todas as áreas da cultura, que todos os produtores culturais vão ter interesse em mostrar a sua atividade por meio da televisão?.

Ainda sobre a programação do canal, Weffort citou alguns exemplos do que gostaria de exibir: ?Se tivermos um filme como, sei lá, um grande filme do Al Pacino que é um ?making of? de uma peça de Shakespeare (?Ricardo 3?’), vamos querer passar. Ou, se nós tivermos chance de uma reprise de ?Noites de Cabíria? (de Federico Fellini), vamos passar também. Se tivermos um documentário cultural, como conheço alguns americanos e franceses de primeiríssima qualidade, também vamos passar?.

Paulatinamente, o canal Arte & Cultura deverá elevar o número de horas diárias de transmissão.

A Folha apurou que o Ministério da Cultura estuda a possibilidade de obter direitos de transmissão de produções audiovisuais como contrapartida ao oferecimento, pelo ministério, de novos prêmios em festivais já existentes."

MÔNICA WALDVOGEL NA RECORD

"A Record e o nervosismo da estréia", copyright Jornal da Tarde, 6/03/01

"Nervosismo de veteranos foi a característica do primeiro dia do Fala Brasil, noticioso matinal da Rede Record, agora comandado por Mônica Waldvogel e apresentado por ela e por Rodolfo Gamberini. Colocado no ar estrategicamente às 7h45, após o noticiário político e econômico do telejornal da Globo, Bom Dia Brasil, que nesse horário entra com as notícias de esporte, cultura e comportamento, a reformulada atração da Record disputa 15 minutos com a Globo e depois passa a enfrentar a Band, às 8 h, com o Dia Dia News.

Os sinais do nervosismo começaram quando o Rio não entrou após a chamada de Gamberini. Uma chamada, aliás, meio atrapalhada: ?Oi Lílian, como é que vão as coi… como é que vai o tempo?? Se ele não se desse conta, poderia enveredar pelo ?como vão as coisas? Família boa? E as crianças?? Logo em seguida, Salvador também não respondeu à chamada. Mônica riu, como quem diz: é hoje. Ao ler a capa do jornal O Globo, para comentar uma notícia, trocou ?correção? por ?contenção?. Ao comentar a troca de ministros econômicos na Argentina (entrou López Murphy), ela não resistiu à piadinha, talvez não sabendo que Myriam Leitão havia feito a mesma graça óbvia na Globo, 20 minutos antes: o jogo do nome do ministro com a famosa ?lei de Murphy?.

Conseguem, afinal, imagens de Salvador e a experiente Waldvogel prefere não disfarçar: ah, agora deu. Em seguida, entra Eleonora Paschoal (ex-apresentadora), de helicóptero, falando sobre trânsito, protesto com queima de pneus na Zona Leste e sobre o tempo, com imagens sofrendo interferências, e no final ela chama Mônica. Era para chamar Gamberini, que sem titubear toma a palavra.

Esses pequenos desacertos podem dar ao leitor a impressão de que o novo noticioso não foi bem. Nada disso. É um jornal sério, que tem boa equipe e cobertura nacional e internacional com pauta muito atenta. Vamos repassar rapidamente os assuntos, após a primeira intervenção aérea de Eleonora:

notícias de Mário Covas, visita de ACM, violação da votação no Senado, emendada com entrevista ao vivo de Arnaldo Cerdeira, líder do governo na Câmara (na sua opinião, é a campanha presidencial que está começando, atirando para todo lado ?sem nenhum fato concreto?), emendada em seguida com a recuperação econômica, matéria que foi aberta de leve, a propósito dos bons resultados financeiros do carnaval baiano (interessante ouvir o povo de Salvador falando e constatar que a pronúncia não tem nada nada que ver com a dos personagens da novela das oito da Globo), passando para a recuperação econômica industrial e comercial, entrando depois o noticiário sobre o governo, saúde de Herbert Vianna, o perigo da febre amarela em Minas, o principal das notícias esportivas (imagens dos gols da rodada são da Rede Globo, o que já ocorrera momentos antes na Rede TV!), depois reportagem de variedades com o homem voador de Joãosinho Trinta, entrevista no estúdio com uma das atrizes (Fernanda Torres) e diretor (Aderbal Freire Filho) da peça que estréia sexta-feira no Teatro Cultura Artística em São Paulo, Duas Mulheres e Um Cadáver.

Como se vê, um jornal consistente, com o qual a Record inicia uma reformulação lenta e gradual, a fim de se tornar a emisssora do jornalismo em 2001. Falta muito, mas o começo já anima.

Seriedade

Para alívio do telespectador e das equipes de reportagem de tevê, os médicos que cuidam de Mário Covas continuam a dar entrevistas coletivas sobre a evolução do tratamento e da doença. Elas nos livram da desinformação generalizada, fruto da tensão e da necessidade de notícias que acomete os jornalistas.

Infelizmente, somente a Globo (SPTV Primeira Edição) e a Globo News transmitiam a entrevista ao vivo dos médicos David Uip, Raul Cutait e Sami Arap, às 12 h de ontem. Corrigiram as notícias veiculadas na mídia: ?Não houve discreta melhora do governador; ele vem é piorando gradativamente.? O doutor Arap, modestamente, diz: ?Não fomos capazes de transmitir a vocês o estado real; houve melhoras pontuais, mas o estado geral continua piorando.?

Se até com as cuidadosas declarações dos médicos chegam-nos informações inexatas, imaginem sem elas."

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