Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

As pesquisas e suas leituras

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NÚMERO-NOTÍCIA

Vera Silva (*)

Os dados da pesquisa da CNI sobre o governo FHC estão sendo analisados de forma muito peculiar pela imprensa. Chega a parecer que se quer esconder o que eles revelam.

Resolvi olhar os dados por outro ângulo e repartir o que vi com os leitores deste Observatório.

ITEM AVALIADO

PORCENTUAL

Avaliação regular e negativa

69% (antes, 71%)

Corrupção no governo (muita e pouca)

87%

Não votaria em candidato indicado por FHC

57%

Problema mais grave: desemprego

69%

Problemas mais ou menos graves:

 

Saúde

45%

Drogas

39%

Problemas de gravidade relativa: corrupção, segurança, salário

itens entre 15 e 34%

Problemas de pequena gravidade: educação e inflação

itens abaixo de 15%

Ora, num quadro como este, pergunta-se: é lícito dizer que a percepção do brasileiro sobre o governo melhorou 1%?

Seria mais adequado dizer que a maioria dos entrevistados desaprova a gestão de FHC e que, provavelmente, o faz porque lhe desagradam a corrupção no governo, o desemprego, a má gestão da saúde e o aumento do uso de drogas no país. E que a maioria dos entrevistados não votaria no candidato que FHC indicasse porque sua gestão não o credencia para indicar o sucessor.

Em outras palavras, os entrevistados não reconhecem a liderança de FHC nem gostam da forma como governa.

Educação para a cidadania

Outras coisas podem também emergir desta pesquisa. Por exemplo, a suspeita de que a maioria dos entrevistados mistura problemas administrativos com problemas éticos (ou morais), atribuindo ao governante a gestão da moral social do país. Dizemos isto porque, apesar de considerarem haver corrupção no governo, não a consideram um problema de gestão administrativa da coisa pública!

Ou ainda colocam a corrupção, o aumento do uso de drogas e a educação, por exemplo, como problemas de gravidade secundária, não percebendo a relação destes com a escolha do modelo econômico e, por conseguinte, com o problema apontado como principal ? o desemprego.

Desta forma, quem se distanciar de FHC será considerado moralmente apto para o governo. Este filme nós já vimos na eleição de Collor.

As oposições, com ajuda da mídia, precisariam mostrar a diferença existente entre o modelo econômico, a gestão da coisa pública e a moral social. Precisariam destacar a relação que a moral social tem com as expectativas do cidadão e a relação que o modelo econômico de gestão do Estado tem com as ações administrativas do governo.

Seu candidato precisaria parecer alguém capaz de mudar as ações administrativas na direção das expectativas sociais sem parecer que iria mudar o modelo econômico em direção "comunista", o que ameaçaria os sonhos de emprego e consumo dos eleitores.

Em resumo: seria preciso admitir que revoluções são feitas com educação para a cidadania.

Outro dado que parece emergir da pesquisa é que a nossa imprensa tem sido incapaz de prestar o serviço público de ligar o ocupante do governo à administração da coisa pública. A corrupção, além de um problema moral, é um problemas de má administração e controle da coisa pública. É fruto do não-cumprimento das leis que regulam a administração de recursos financeiros.

A avalanche de corrupção que nos cobre é fruto da frouxidão dos guardiões da administração pública, que deveriam cuidar dos interesses públicos em lugar dos seus interesses privados. Na administração pública, o não-cumprimento dos mandamentos constitucionais e administrativos é tão grave e criminoso quanto o desvio de verbas.

A má administração pública resulta no retorno de doenças já extintas, na falta de boas escolas, na falta de médicos e de remédios, no mau saneamento básico, na falta de equipamentos urbanos e rurais adequados à vida, na falta de lazer e de espaço para os jovens, no desemprego etc.

Esta ligação que tanto imprensa quanto oposição não fazem ou não sabem fazer contribui para que o povo ache que mudar a cara de quem está na presidência é a solução. É preciso mudar o modelo de gestão do Estado, é preciso mudar as prioridades e fazer críticas à ação administrativa.

Ser bom, bonito e pós-graduado nunca foi sinônimo de administrador eficiente.

(*) Psicóloga

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