E-NOT?CIAS
INTERNET EM CRISE
"Deixa que eu pago!", copyright Valor Econômico, 23/05/01
"Tenho notado ultimamente uma coisa estranha no mundo pontocom: está faltando assunto. Como parece que tudo deu errado, os gurus de plantão resolveram se esconder e calar. Os sabe-tudo estão sem saber o que dizer e a imprensa não sabe mais o que é notícia, acidente, espuma ou catástrofe.
Está estranho, não está? Na mídia vemos poucas coisas interessantes e um monte de números (negativos!) e notícias ruins. Nas conversas de bar, gente estressada, cansada e preocupada. Nas empresas, todo mundo tentando salvar o seu emprego, seja a que custo for.
Estive nos EUA na semana passada (Nova York) e o mundo pontocom por lá parece que nem existiu. Deve ter sido tudo uma grande miragem. Não existem mais tantos outdoors das pontocom e nas rodas de negócios se evita falar em dotcom ou no famoso e-qualquer coisa! Os únicos comerciais que vi de empresas na rede eram de sites de recolocação on-line! Triste fim!
Almocei com um amigo e expressei esta minha percepção Sua resposta: ?não está acabando, já acabou! Ou a empresa já fechou, ou está fechando ou vai fechar em breve, dizem todos sobre as pontocom americanas? , conclui.
Em cima de tudo isso, usando uma tradução literal de uma expressão bem típica dos yankees (e bem apropriada neste caso), temos aqui no Brasil ACM, apagão, Marka, Cacciola, FHC, Barbalho e por aí afora.
Complicado, não? Mas afinal, o que está acontecendo?
De um lado, os usuários continuam utilizando a Web cada vez mais e os serviços (bons) apresentam altos índices de audiência, utilização, crescimento e fidelidade.
De outro, empresas quebrando, investidores de torneira fechada, empresários sem saber o que fazer para sobreviver e anunciantes se evaporando.
Penso que chegamos ao cerne de uma questão importantíssima na Internet e que pede uma solução urgente: quem vai pagar a conta.
O usuário foi mimado e a ele sempre se ofereceu (quase) tudo ?de graça?. As empresas não conseguem ?perceber? o real valor da mídia online ou não querem pagar para ver. Criamos um círculo vicioso de queda de preços e aumento de resultados com tendência a levar tudo a zero! Exatamente onde estamos hoje. Zero. Nunca (fora na Web) conveniência custou menos e serviços adicionais foram gratuitos.
Parece que criamos um monstro e agora temos que nos livrar dele.
Como otimista inveterado que sou, acredito que o tal do monstro do lago pontocom será domado, levado à nocaute e convertido num pequeno animal doméstico que seguirá nossas ordens e desígnios.
Agora, mesmo sendo um otimista sem cura, sei que não vai ser nada fácil!
Vai ter ainda muito sangue pela frente, muita gente devolvendo a conta, muita empresa fechando e muita notícia ruim mas, por mais que me esforce, não consigo admitir que tudo o que a Web nos trouxe (velocidade, serviços, facilidade, conveniência, etc, etc, etc) vá agora ralo abaixo!
Ainda na semana passada lá nos EUA, outro amigo me disse que costumava pedir todos os seus DVDs no Kozmo.com (site de delivery que fechou) mesmo com uma loja da Blockbuster no seu próprio prédio. Disse ele: ?o acervo de DVDs do Kozmo era muito melhor, mais completo!? . Perguntei a ele, então, se o Kozmo tivesse cobrado um pouco mais caro do que a Blockbuster pela conveniência e por ter um acervo mais completo, se ele teria pago.
A resposta, que me deixou animado: provavelmente sim! (Bob Wolheim é presidente do Idea.com)"
"Chase pressiona e Starmedia efetua cortes", copyright CidadeBiz (www.cidadebiz.com.br), 24/05/01
"Desde agosto no cargo de diretora geral do Starmedia Network Brasil, a executiva argentina Gally Bar-On esta semana foi obrigada a adotar medidas drásticas. O portal efetuou um corte de funcionários (50, num total de 200), atingindo principalmente a sua área de conteúdo.
A medida atende a pedido do JP Morgan/Chase, controlador da empresa, que reivindicou o corte de pelo menos 25% dos custos fixos em toda a operação latino-americana, logo após a divulgação dos resultados do primeiro trimestre.
Problemas do Starmedia são apenas mais um na longa lista de investimentos frustrados feitos pelo fundo de private equity do Chase Capital Partners, hoje JP Morgan Chase. Investimentos feitos no mundo online e também em outros mercados – como ferrovias, varejo e mídia.
Os cortes foram justificados oficialmente como forma de se atingir o break even no final deste ano. Outra missão de Gally Bar-On é aumentar a receita publicitária, que ficou aquém da meta no primeiro trimestre no Brasil. O problema de caixa do portal se verifica em todo o continente. A maior fonte de receita atualmente é a produção de sites para terceiros, o que os investidores consideram pouco para aquele que foi lançado ambiciosamente como o primeiro produto de internet para a comunidade latino-americana."
PLÁGIO NA WEB
"Antes a morte", copyright no. (www.no.com.br), 28/05/01
"Não falo por mim, que ainda não fui atacado, mas por alguns amigos que já foram: Luis Fernando Verissimo, Ziraldo e agora Walter (Waltinho) Salles. Trata-se de um novo vírus pior do que os que ameaçam os computadores , porque afeta nosso amor próprio e é um mico para nossa reputação profissional.
A praga consiste em lançar na rede um texto apócrifo em seu nome – em geral um pastiche, algo parecido com o que você escreveria, num estilo próximo do seu, só que pior. A propagação é imediata, não há como desmentir, nem mesmo corrigir os defeitos. Não se conhece um caso em que o falsário tenha melhorado o plágio.
Gabriel Garcia Marques foi uma das primeiras vítimas. O seu texto, que chegou a ser elogiado por muita gente boa, era um poema de despedida em face da morte iminente. Aliás, chamava-se ?A despedida de um escritor?, um primor de pieguice que continha lugares-comuns sentimentais como estes: ?Dormiria pouco, sonharia mais, pois sei que cada minuto que fechamos os olhos, perdemos 60 segundos de luz?. Parece que o autor de Cem anos de solidão quase morreu – na verdade, quando descobriu que muita gente acreditou que o texto pudesse ser seu.
No caso do Verissimo houve pelo menos uma boa idéia, mas a crônica era preconceituosa, como ele admitiu ao escrever sobre a clonagem. Chamava-se ?Diga não às drogas? e comparava músicas como pagode, axé, funk e duplas neocaipriras e entorpecentes. ?Tudo começou quando eu tinha 14 anos e um amigo chegou com aquele papo de ?experimenta? (…) Primeiro ele me ofereceu uma coisa leve, disse que era ?raiz?, ?da terra? , que não fazia mal, e me deu um inofensivo disco Chitãozinho e Xororó e em seguida um do Leandro e Leonardo?.
Verissimo ficou impressionado com a repercussão: ?O volume de comentários que tenho ouvido só mostra, mais uma vez, o assustador poder anônimo da internet. Mas também pode haver outro Luis Fernando Verissimo por aí (este com ?z?) escrevendo coisas. O que, pensando bem, é ainda mais assustador?.
Já o texto de ?Ziraldo, um brasileiro de saco cheio?, é uma virulenta confissão de desobediência civil: ?porque não vou economizar energia elétrica?. Cheio de xingamentos, ?corja do Planalto?, ?quadrilha de plantão?, ?judiciário troncho, manco e vesgo?, esse tiroteio verbal contra Executivo e o Legislativo fez também o maior sucesso.
O pai do Menino Maluquinho acha que nunca um escrito ?seu? teve tanta repercussão, até porque, segundo ele, refletiu o que todo mundo está sentindo: só a rádio CBN recebeu 50 e-mails num dia. Jornais de todo o país ligaram para ele, foi parado na rua e, na Bienal do Livro, enquanto autografava, os fãs diziam: ?é a melhor coisa que você já escreveu?, ?continue assim?. Outro dia, no Centro da cidade, foi localizado por uma rádio para dar uma entrevista por celular.
Parou num canto e as pessoas passavam com o polegar para cima: ?é isso aí, Ziraldo?, ?estou contigo e não abro?. Nem as afirmações no feminino (?eu me sentia culpada?, ?como louca e demente?) despertaram suspeita nos admiradores e nem diminuíram o entusiasmo por quem não se cansa de repetir que é espada. Quem ama não vê sexo.
Com Waltinho foi um pouco diferente: não se trata de um texto sem destinatário, mas de um e-mail igualmente apócrifo, dirigido ao empresário de uma escritora pouco conhecida, começando assim. ?Meu nome é Walter Salles Jr. Sou um novo produtor de cinema. Onde nasci para o mundo da arte?.
Ele se apresenta como interessado em produzir um filme com a escritora, a quem acena até com trabalho na Globo. Há construções estilísticas como essa: ?Apenas, estou enviando este. Para lhe informar, que quando ambos vierem ao Rio em agosto, estarei presente nesta reunião?. Waltinho ?diz? que anda muito ocupado com um projeto com Bruno Barreto e com a televisão.
O trecho mais engraçado, em se tratando do recatado e escrupuloso Waltinho, é quando ele, dando uma de Alberto Roberto, promete ao empresário um contrato para a escritora: ?É claro, isso, sem vínculo empregatício. Com isso, ela pode pegar vários trabalhos, até mesmo da Rede Globo?.
Desconfiado, o empresário denunciou a fraude, que aconteceu justamente na semana em que o cineasta ?ganhou? um inesperado irmão caçula de 33 anos, filho putativo de uma suposta relação de seu pai quando embaixador nos EUA. O que mais o incomodou, porém, não deve ter sido nem isso, nem a possibilidade de coletar sangue para um exame de DNA, talvez nem mesmo a foto do novo irmãozinho com jeito e ares de Waltinho na primeira página do Globo.
Quem conhece o seu rigor formal, o perfeccionismo, o nível de exigência técnica, a correção de linguagem, seja a cinematográfica, seja a literária, sabe que o pior para ele foi a hipótese de ter escrito o tal e-mail capaz de matar seus amigos de rir e ele, de vergonha.
Diante do ocorrido, me julgo um privilegiado. Há tempos, fui morto por um boato que ficou umas duas horas na internet. Foi horrível. Mas pelo menos nenhum texto foi encontrado. Antes a morte.
PS. Waltinho está na Itália providenciando locações para seu próximo filme com a gracinha da Juliette Binoche. Dizem que muita gente anda com a pulga atrás da orelha, inclusive o Tom Cruise. Eu mesmo – já que todo mundo vive falando que Mauro, meu filho, é a cara do Waltinho – vou aproveitar o exame de DNA que ele deve fazer para tirar a dúvida. Não custa nada."
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