DIRET?RIO ACAD?MICO
PROVÃO II
Na sexta-feira 25/5, em debate com colega da Faculdade de Direito da PUC-Campinas, ouvi um argumento em defesa do Provão que vale a pena reproduzir. Ele praticamente defendeu a omissão do governo ao não punir cursos inqualificáveis, pois nada seria pior para aquele curso do que a execração pública.
É mole? Risível, não? É como deixar que se venda veneno no lugar de remédio, sob o argumento de que compra quem quer e o mercado tudo regula. Daí que chego mais uma vez à conclusão de que a defesa do Provão é feita essencialmente por pessoas ingênuas ou de má-fé. Neste caso, evidentemente, não se trata de ingenuidade.
Mas chato mesmo é ler, ainda por cima, que seriam irresponsáveis e covardes os alunos que entregam a prova em branco. Corajoso seria o quê? Não é exatamente coragem sair em defesa do poder, ficar bajulando o MEC a torto e a direito, como tanto se vê nesta rubrica do Observatório, a ponto de envergonhar qualquer cidadão com o mínimo de decência.
Responsabilidade seria o quê? Omitir aos leitores deste Observatório que em Campo Grande houve uma quase unanimidade dos coordenadores de curso (e não de alunos irresponsáveis!) em apontar essencialmente aspectos negativos no Provão? Parece que é mais responsável bajular o MEC porque se vai receber uma comissão de professores das federais (quá-quá-quá, que legalzinho, esse MEC) do que denunciá-lo porque se mostra absolutamente intransigente. Intransigente, veja-se bem, quando se trata de aceitar sugestões que nada têm de radicais, como avaliar a prova pelo que ela é, e não com critérios estapafúrdios, como desvios e curvas já tão bem analisados com humor causticamente brilhante pelo professor Antonio Fernando Beraldo, da UFJF [veja remissão abaixo].
Aliás, depois daquela série de artigos esperavam-se alguns pedidos de demissão por aí. Vã esperança. Pior: defende-se que o jornalista saiba o que é amostragem, mas não se discute a manipulação dos dados, justo quem outro dia decretou o fim da curva de Gauss!
É por isso que não é covarde nem irresponsável boicotar o Provão. Ao contrário: é a ação mais decente daquele aluno que é, como se deseja, crítico, e não banana. Enquanto os burocratas fazem cálculos para ver se, quem sabe, Deus ajuda e chova, os reservatórios encham e se faça uma luz nos iluminados do MEC, esses alunos se negam a ser cúmplices de uma política ? esta sim ? nefasta à educação brasileira.
Que o Provão nada prova, estamos cansados de saber. Quem o defende como um instrumento de avaliação quer que a gente engula essa como? Ele é, como já se falou tanto, um arremedo de qualquer coisa, uma excrescência. Bom, é preciso reconhecer que ele compara coisas. Como uma gincana, certo? Daquelas do tipo "escola da Barra Funda contra escola do Brás", certames às vezes em alguma medida sofisticados por aqueles que são, digamos, seus intelectuais orgânicos. Temos agora, portanto, intelectuais do tipo Gincana do Paulão, ou seja, defensores do Provão.
Os intelectuais da Gincana do Paulão vão sempre buscar elementos para fazer a eterna réplica: houve também em Campo Grande quem defendesse o Provão, dos males o menor, uma avaliação desse tipo é melhor do que nada, os ruins que sejam execrados, etcetera.
Ao listar as críticas ao ENC, um dos defensores da Gincana, digo, do Provão, fez breve relato delas. Seria o suficiente para que boicotássemos a Gincana do Paulão, mas o próprio autor do texto prefere não se curvar à força dos argumentos que enumera. Parece, digamos, meio embananado, confuso, entre fogos contrários. Aquilo que o tirocínio de pesquisador recomenda perde, ao final, para a velha prática política de alguns grupos que chegaram, em tempos pré-históricos, a defender algum tipo de ruptura. E em seguida tomaram todos os cargos e nunca mais saíram de lá.
Comportamento semelhante é assumido por ministros tão honrados que num dia são o arauto da dignidade e no seguinte afundam-se até o pescoço na podridão. Tão honrado o Ricupero, por exemplo, o sem-escrúpulos. Tão honrado o Paulão, o das porteiras abertas às fábricas de diploma. No fundo, tudo igual. Paulão e FedeHC, farinhas do mesmíssimo saco…
No debate do dia 25, o colega da PUC-Campinas dizia que pelo menos agora se tem algum instrumento de avaliação. Ora, o MEC nunca fez nada para coibir cursos inqualificáveis que ele mesmo deixou que se abrissem em função de lobbies. Isso não é exatamente novidade. A Avaliação das Condições de Oferta (ACO) poderia então ser esse instrumento de controle. Mas não é, pois o MEC continua se omitindo da obrigação de fechar os cursos de quinta categoria. E o governo dá grana a eles. E tem gente que se queixa da mídia, por apenas falar no tema Provão, e não na ACO. Ora, é para isso que servem, ambos! ? para enganar a sociedade, como uma cortina de fumaça, um álibi para o governo, emprego para ao professores de cursinho do Provão, tudo bem explicadinho pelos intelectuais de plantão, digo, do Provão.
Por essas e outras é que apóio o Ziraldo, em seus argumentos para não economizar energia: safadeza não tem cura e, se tem, pouco dura. Salvemos o que resta deste país! Vamos começar a dizer não! Chega de omissão, de cumplicidade com as estultices, com a retórica de um poder ilegítimo e corrupto! Por tudo isso é que devemos sim defender o boicote à Gincana do Paulão.
(*) Bruno Fuser é professor da PUC-Campinas e coordenador de curso das Faculdades Anhembi-Morumbi
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