ASPAS
TELEJORNALISMO
"Noticiário matinal começa amanhã no SBT", copyright O Estado de S. Paulo, 3/06/01
"O departamento de Jornalismo do SBT começa a ver uma luz no fim do túnel. Acostumado a não ter tanta importância no cenário da rede de Silvio Santos, o setor se prepara para a estréia do Telejornal Manhã, amanhã às 6h25, apresentado por Patrícia Pioltini. O diretor responsável pelo jornalismo da emissora, Walter Santos, acredita na boa vontade do patrão em aumentar o trabalho e as contratações da casa.
?Estaremos experimentando o horário, o jornalístico terá vinte minutos, mas com o tempo pode crescer?, diz Santos. Prova disso é que alguns jornalistas já foram contratados e foram criadas sucursais em Brasília e no Rio de Janeiro. ?Teremos estrutura para fazer tudo ao vivo?, comemora Walter Santos.
Segundo ele, o noticiário quer destacar-se na prestação de serviços e antecipação do que irá acontecer ao longo do dia. ?Será em rede e pretendemos fazer um produto bastante denso. O formato será o mesmo do Jornal do SBT (noite), mas iremos inovar na maneira de editar as reportagens?, diz Walter Santos. ?Além disso, queremos promover a integração entre as emissoras afiliadas do SBT. Todas terão condições de entrar em rede ao vivo.?
Projetos – Entre os planos do Departamento de Jornalismo do SBT está a criação de um noticiário local e boletins diários de notícias a serem transmitidos de hora em hora. ?Esses projetos ainda não têm data para ir ao ar, mas se tudo continuar dando certo, como foi com o Jornal do SBT, que começou com quinze minutos e hoje está com meia-hora de duração, devem começar em breve?, conta Santos.
Outra função do Jornalismo será dar suporte ao Domingo Legal, que já há algum tempo usa as notícias ao vivo como forma de aumentar sua audiência.
?Cada vez mais pretendemos aumentar essa integração com o Gugu. Isso já ocorre às vezes, mas deve virar uma prática mais comum?, avalia Santos.
Segundo ele, a redação fica disponível para o programa de Gugu aos domingos.
Agora, só resta esperar para saber se Silvio Santos vai mesmo continuar investindo em jornalismo, como sua equipe promete e espera."
"Reportagem com linguagem de cinema", copyright Jornal da Tarde, 31/05/01
"A maioria dos repórteres de televisão trabalha com notícias quentes, hard news, para usar uma expressão que o influente jornalismo norte-americano espalhou pelo mundo. Hard (em inglês significa duro, áspero, difícil, opressivo) expressa bem a dureza do trabalho e do material. A função dele privilegia o contar, relatar as novidades. Um outro tipo de repórter, mais experiente, trabalha com o levantamento, o desdobramento, a reportagem média e longa, com o assunto e não necessariamente com a notícia que põe o assunto em evidência. A função desse repórter privilegia o explicar, o esclarecer, o ilustrar. Ele tem de ser bom de narração, argumentação e interpretação.
Entre os deste último grupo está William Waack, que nesta semana está apresentando no Jornal Nacional um primoroso trabalho de reportagem em série sobre o que é ser policial na cidade de São Paulo.
Desde segunda-feira e até sexta-feira, a reportagem mostra o mundo, os valores, os perigos, as ações, a vida familiar, as dificuldades materiais, os maus salários, a corrupção, a prestação de serviço público – tudo o que marca a vida do policial na cidade. Com um texto enxuto, direto e forte, o repórter complementa as informações que a imagem apresenta, não se sobrepõe a ela. Mostra os contrastes: o lado corrupto e o lado idealista; a coragem e o medo; o desprendimento e a omissão; a hora de atirar e a hora de salvar.
O telespectador deve reparar que nesta reportagem há inovações na linguagem, diferente do padrão e mais próxima do cinema. Começa pela câmera. Observe a colocação da câmera sempre em ângulo privilegiado, nas reportagens de rua, com uso objetivo do primeiro plano e do close. Isso transmite ao telespectador uma forte idéia de intimidade com o assunto e os personagens.
As inovações continuam na forma narrativa, que entrecorta o caso de uma diligência policial com entrevistas (por exemplo, sobre salário, ou sobre suborno) que aparentemente não têm o que ver com o caso. Têm. O corte mostra o background com que aquele policial trabalha, com que motivação interna ele está fazendo aquele atendimento. E por último, mas não finalmente, temos a inovação da ausência do narrador. Todos nós estamos acostumados a ver uma reportagem em que o repórter narrador aparece pessoalmente, costurando os assuntos, juntando as partes, dando-lhes uma seqüência facilmente compreensível. William Waack escolheu narrar privilegiando na tela as imagens do assunto, como se faz no cinema.
ACM
Escrevo antes do discurso de renúncia. Na quarta, pela manhã, uma chamada da Band falava em pânico entre os políticos sobre o que poderia dizer o antigo Malvadeza. Exagero. Pânico? Que grande perigo pode haver numa lista de que não se pode provar a autenticidade? ACM já não parece uma víbora, mas uma jibóia. Pouco depois da chamada, o analista político Gaudêncio Torquato desdenhava a importância do discurso de ACM e dizia que o político baiano estava promovendo, sim, era um grande espetáculo de marketing.
Jazz
Realmente excelente a série histórica Jazz, que o canal GNT está apresentando diariamente às 23h30 e repetindo no dia seguinte, às 12 h e às 17h30. A série é melhor do que tudo o que já se viu em tevê sobre o assunto.
Rica como levantamento histórico, como documentação, como repetório musical, como síntese biográfica das principais figuras e como testemunho de comportamentos. Mesmo quem não se amarra em jazz tem muito o que aproveitar.
Estrelas
Não queria deixar de comentar a série de matérias especiais que acompanharam a exibição da saga Guerra nas Estrelas, semana passada, nos Telecines Action e Premium. A longa entrevista de George Lucas foi a coisa mais antitecnologia que já se viu: pergunta e resposta, campo e contracampo.
Leitura: efeitos especiais são bons para a aventura, não para o raciocínio.
Falou das mitologias e conteúdos religiosos embutidos nos quatro episódios, principalmente o zoroastrismo, judaismo, budismo e cristianismo. Foi uma boa entrevista careta. A parte que mostrou o uso da tecnologia em seus estúdios foi um verdadeiro portal aberto para a imaginação dos artistas visuais."
RELIGIÃO
"O senhor do céu contra São Mateus", copyright Jornal do Brasil, 3/06/01
"Por um desses folhetos que são distribuídos na missa, eu soube que domingo passado foi o Dia Mundial de Comunicação para os católicos. Ali estava o resumo de uma mensagem de Papa João Paulo II sobre a era da comunicação global. A mensagem era um estímulo à evangelização pelos meios de comunicação, o que é legítimo e, fundamentalmente, sensato. Ele citava o evangelho de Mateus – ?O que vos é dito aos ouvidos, proclamai-o sobre os telhados.? (Mt 10, 27) -, falava em pregar o evangelho ?pelas antenas e transmissores da comunicação de massa? e dizia que, ?por mais que pareça indiferente e hostil à Igreja, a mídia é ocasião para se proclamar Cristo via satélite e por Internet?. Eu, que não creio, que não comungo, li o texto com uma ponta de torcida a favor.
Depois da leitura, porém, o que retive foi uma sensação de que aquelas palavras estavam atrasadas uns trinta anos. Mesmo a alusão a Mateus resultava obsoleta – ninguém mais tem antenas no telhado. Ora, os telhados. O texto falava da comunicação como se falasse da TV Tupi. Soou-me ultrapassado. Às vezes, vencido. Numa das frases, percebi uma autoironia involuntária: ?A mídia pode ser meio de evangelização e transmissão dos valores do Reino de Deus.? O trecho parecia referir-se não à Igreja de Roma, mas à Igreja Universal do Reino de Deus – esta, sim, um milagre de mídia. Isso deve incomodar os católicos: por que a Igreja Universal é esse sucesso de comunicação? E por que a Igreja Católica é um fracasso?
Arrisco uma interpretação. A Igreja Universal dá certo não por saber ?usar? a mídia – mas por ser, ela mesma, uma realidade mediática. Seu altar é a TV. Seu berço é a TV. Seu tempo é a TV. Os programas da Record-Universal celebram o paraíso do consumo e reforçam todos os fetiches da publicidade: sucesso financeiro, carro zero, curas instantâneas, vitórias massacrantes sobre os concorrentes. Por automatismo ou por inocência, são uma mistura de Organizações Tabajara (?Seus problemas acabaram!?) com uma neurolingüística de segunda.
Já a Igreja Católica não é uma realidade mediática – seu tempo e sua historicidade são outros. Por isso, imagino, sua abordagem dos meios de comunicação passa por um estranhamento – e vem marcada pela culpa de quem se vê às voltas com uma aliança traiçoeira. No folheto, o mesmo texto que recomenda o uso da mídia condena a sua natureza: ?Hoje, não se sabe mais o que é verdade e ilusão na mídia?. A análise é acertada, mas, em lugar de esclarecer, confunde o leitor. Como anunciar a verdade pelas antenas se, por elas, verdade e ilusão não se distinguem?
Talvez o cristianismo seja incompatível com a monstruosidade da mídia global. A ética do cristianismo fala de compaixão, enquanto a mídia só sabe se expandir se for impulsionada pela sede de consumo, pelo exclusivismo, pelo achatamento das diferenças culturais, pelo imperativo do gozo. É estranho imaginar o catolicismo pegando uma carona num ?embalo? desse tipo. A lógica da mídia – contra a ética da solidariedade – promove a concentração de poder e a exacerbação irracional do capitalismo. Para além das fronteiras nacionais – e das fronteiras celestes.
O céu já não é o limite – é campo de batalha. Na mesma semana em que pensava sobre as idéias do Papa, li um bom perfil de Rupert Murdoch na edição de junho da revista americana Brills Content. Murdoch é um personagem e tanto, admirável e temível. Herdou do pai dois jornais australianos em 1952. Hoje, aos 70 anos, é dono da News Corp, um império global que inclui o Times de Londres, o título TV Guide nos Estados Unidos, a Fox (em cinema e TV), enfim, um meganegócio que fatura 14 bilhões de dólares por ano. É o quarto maior conglomerado de mídia do mundo – e o maior a ser controlado por um único homem. ?Agora, Murdoch está conspirando para dominar o mundo?, diz a reportagem, para completar em seguida: ?Ou pelo menos o céu.? De fato, o magnata australiano está obcecado pela sua rede planetária TV digital interativa via satélite, a Sky. Já tem satélites espalhados por todo lugar (só na Inglaterra, seu serviço conta com cinco milhões de assinantes). Se conseguir entrar no mercado americano, terá consumado sua supremacia. Será o senhor de todo o céu – e de um mercado que, em cinco anos, deve contar com 226 milhões de assinantes em todos os continentes.
Por que que Murdoch quer dominar o mundo? Para vender. Para vender diversão, roupas, passagens aéreas, filmes e até mensagens dos evangelistas de auditório (desde que lhe paguem a comissão). Muito além dos telhados, muito acima dos aviões de carreira, essa é a única verdade da nova ordem mediática – assim na terra como no céu. A TV interativa, a Record-Universal, tudo são lojas de prazeres imaginários para os nossos espíritos ressequidos. O sucesso na TV cobra um preço de morte. Os comunicadores católicos fracassam porque hesitam em ser lojistas. Talvez seja melancólico, patético, mas é melhor assim."