ASPAS
CORONEL ELETRÔNICO
"Democracia e ?ditadura midiática?", in Editorial copyright O Estado de S. Paulo, 10/06/01
"Quando um repórter perguntou ao já ex-senador Antonio Carlos Magalhães, depois do seu discurso de renúncia, o que ele realmente gostaria de fazer doravante, o político baiano não pensou duas vezes. ?Gostaria de dirigir a Globo?, respondeu, risonho. Pode-se julgar como se queira a sua longa trajetória na vida pública nacional e o seu estilo de atuação. Mas nunca, em sã consciência, alguém lhe fará a injustiça de desconsiderar o seu faro extraordinariamente privilegiado para as fontes e os mecanismos de exercício do poder. Graças a esse dom, ele foi um dos primeiros políticos brasileiros, na passagem dos anos 60 para os 70, a perceber a importância decisiva que teria o controle da mídia eletrônica para a conquista de apoio popular, a consolidação das posições de mando alcançadas e o uso da influência pessoal, assim amplificada, para o comércio de favores – o que, por sua vez, asseguraria a reprodução do cacife político já amealhado.
Por isso, com as bênçãos do regime militar e em associação com o principal conglomerado de emissoras de TV, premiado também pela mesma fidelidade irrestrita à ordem autoritária, Antonio Carlos Magalhães foi se transformando no empresário número um do setor na Bahia, construindo um virtual monopólio de mídia e de acesso a verbas publicitárias particulares e públicas, a começar do próprio governo estadual e da prefeitura de Salvador, sob suas asas. Igual conjugação de interesses se manifestaria em outros Estados, sobretudo no Nordeste, e continuaria a prosperar no Brasil redemocratizado: ministro das Comunicações do presidente José Sarney e tão ligado como ele à maior rede nacional, ACM fez da outorga de concessões de emissoras de rádio e TV o instrumento por excelência do seu ?coronelismo eletrônico?, na apropriada expressão do editorial de domingo passado do Jornal da Tarde.
Nesse mesmo dia, o Estado reproduziu no Caderno 2/Cultura uma extensa entrevista concedida ao semanário francês L?Express pelo presidente da segunda emissora estatal de TV na Itália, Carlo Freccero. À luz do antológico exemplo de ACM e de seus parceiros em matéria de reforço recíproco da concentração de poder na política e no business da comunicação de massa, as inquietações de Freccero com o que denomina ?ditadura midiática? em seu país estão longe de serem desimportantes para o Brasil. O caso italiano é excepcional, mas não necessariamente exclusivo. O país acaba de eleger primeiro-ministro o seu cidadão mais rico, Silvio Berlusconi, um homem de negócios de má reputação, cuja fortuna política se deve essencialmente ao uso personalista das três estações de TV de que se tornara proprietário. Foi a mídia eletrônica que o levou pela primeira vez ao governo, em março de 1994, e ela o ressuscitaria, depois que a sua renúncia, em janeiro de 1995, parecia tê-lo destruído politicamente.
É certo que o novamente premier Berlusconi tratará de pôr a seu serviço o sistema da TV estatal italiana, transformando-a em mera correia de transmissão dos interesses políticos e negociais do chefe do governo e de seus aliados. Conhecedor íntimo das técnicas televisivas, de marketing e publicidade que fizeram do megaempresário o que ele hoje é, Freccero, seu colaborador por mais de 20 anos, sabe perfeitamente como a hegemonia incontrastável de um grupo de mídia sobre o conjunto do setor pode ?lobotomizar toda uma nação?, em proveito dos amigos políticos de seus controladores. Se um país civilizado como a Itália pode tornar-se refém de um dublê de um czar de mídia e de autoridade governamental, não são necessários grandes vôos de imaginação para prever o perigo para a democracia que a ?TV lixo?, como diz Freccero – um brevê contra a inteligência e o senso crítico dos espectadores -, pode representar em outras paragens.
Contra os ?Big Brothers? de todas as latitudes, os remédios indispensáveis são dois. De um lado, uma política de concessões infensa a coronelismos, complementada por eficaz legislação antitruste, de defesa do consumidor e da concorrência, contra a exacerbação predatória da lei do mais forte no mercado da indústria da informação. De outro, o fortalecimento da mídia eletrônica pública, independente tanto do Estado quanto da área privada e, mais ainda, protegida do espúrio contubérnio entre ambos, que gera a ?ditadura midiática?, na Itália, na Bahia – e em qualquer lugar do globo."
"Rede Globo", copyright Folha de S. Paulo, 6/06/01
"A propósito de reportagem insinuando uma mudança de comportamento da Rede Globo em relação à TV Bahia (?Parceria de ACM com a Rede Globo está sob ameaça?, Brasil, pág. A6, 3/6), gostaríamos de esclarecer que a tese é absolutamente infundada. A TV Globo tem princípios editoriais claros e definidos, de conhecimento público, consagrados pela nossa audiência e seguidos por todas as emissoras -as próprias e as afiliadas. Por ter mais de cem afiliadas -mais de cem núcleos de jornalismo-, a Globo mantém acompanhamento e avaliação permanentes da produção jornalística de toda a sua rede. Todas as decisões editoriais servem ao objetivo essencial da atividade jornalística: sem escamoteamento ou deturpações dos fatos, manter a sociedade informada sobre o que se passa para que a cidadania se exerça da forma mais plena possível. É esse o comportamento que preside as relações entre a TV Globo e as suas emissoras, independentemente do momento político ou de qualquer tipo de interesse. Não praticamos jornalismo de acordo com o personagem envolvido nem para demonstrar independência ou agressividade nem para mostrar apreço ou desapreço, mas para levar ao ar notícias com isenção e responsabilidade social. E é essa postura que evidencia a superioridade do jornalismo sério e investigativo sobre o jornalismo meramente especulativo, como o infeliz exemplo da reportagem da Folha sobre uma suposta mudança nas nossas relações com a TV Bahia, que, vale ressaltar, é uma de nossas afiliadas de melhor desempenho e com a qual mantemos, dentro do nosso modelo de gestão, uma relação sólida, construtiva e de aprimoramento constante. (Luis Erlanger, diretor da Central Globo de Jornalismo, Rio de Janeiro, RJ)"
"ACM e TV Globo negam fim de parceria", copyright O Estado de S. Paulo, 6/06/01
"Embora sejam cada vez mais fortes os rumores de que a Rede Globo vai retirar sua programação da TV Bahia, de propriedade dos familiares de Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), o ex-senador garante que as informações são falsas. ?Em pouco tempo, a gente vai passar na cara de todo mundo que está dizendo isso?, disse. Um suposto desentendimento entre Roberto e José Roberto Marinho, donos da TV Globo, e ACM teria ameaçado a parceria entre a TV Bahia, que detém 80% da audiência no Estado, e a emissora carioca.
O diretor da Central Globo de Comunicação, Luís Erlanger confirmou o discurso de ACM, negando que a TV Bahia esteja em processo de desfiliação da Rede Globo. Segundo ele, a TV Bahia ?é a afiliada da Globo com o melhor desempenho da rede?. ?A rede mantém uma relação sólida e de aprimoramento constante com a TV Bahia?, afirmou.
Recentemente, o ex-senador reclamou que foi tratado ?injustamente? pela Globo, que teria apoiado a cassação de seu mandato.
Torcida – Mesmo não alimentando os boatos, deputados da oposição torcem para que seja verdadeira a versão segundo a qual a Globo estaria comprando a TV Aratu (SBT) para transmitir sua programação.
O líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA), é um dos nomes que integram uma espécie de lista negra na TV Bahia por ser desafeto de ACM.
?Tenho seis anos na liderança do PMDB, sou entrevistado por emissoras de televisão de todo o Brasil, mas nunca apareci na TV Bahia?, reclama, sustentando que acha um absurdo que uma emissora que retransmite a programação de uma rede da importância da Globo ?seja manipulada da forma criminosa como é?.
Além de Geddel, o líder do PT, Walter Pinheiro (BA), a deputada estadual Lídice da Mata (PSB), ex-prefeita de Salvador, e o deputado João Almeida (PSDB-BA) se dizem vetados pela emissora de ACM. ?Tenho três mandatos de deputado federal e nunca foi entrevistado por eles?, lembra Almeida, garantindo que até os próprios deputados do PFL raramente aparecem na TV Bahia. ?ACM só permite que ele e seu pequeno grupo político que controla coloquem a cara na emissora.?
Do outro lado, o deputado federal Nilo Coelho (PSDB-BA) e seu irmão, o empresário Silvio Roberto Coelho, donos da TV Aratu negam qualquer tipo de negociação com a Globo. Entrento, nas conversas com amigos, eles deixam alguma coisa no ar.
?Quem conhece a família Coelho, que são empresários bem-sucedidos, sabe que lá ninguém dá ?prego sem estopa?, diz um amigo, ao lembrar que recentemente os Coelho gastaram quase R$ 1,5 milhão na compra de equipamentos para a modernização da emissora. ?Se eles colocaram dinheiro aí, já foi pensando no futuro?, assinala o amigo."