ENTREVISTA / MICHAEL BLOOMBERG
"Eu quero Nova York", copyright Veja, 9/07/01
"Aos 59 anos, não satisfeito em possuir uma fortuna estimada em 4 bilhões de dólares, pilotar o próprio helicóptero, chefiar 7.200 funcionários e abastecer a cada minuto os mercados financeiros de mais de 100 países com informações de sua agência de notícias econômicas e políticas on-line, Michael Bloomberg quer ser o próximo prefeito de Nova York. Administrador de empresas formado em Harvard e empresário de grande influência, Bloomberg transferiu-se no ano passado do Partido Democrata para o Republicano em troca de mais apoio político para sua candidatura nas eleições de novembro. Até agora, já conseguiu a adesão do governador do Estado de Nova York, George Pataki, e de Rudolph Giuliani, o atual prefeito. Bloomberg financia cada centavo de sua campanha. Aos eleitores promete conter o desperdício da burocracia da cidade, entre outras metas. Ele fundou seu império há vinte anos, depois de ser demitido da corretora de valores Salomon Brothers. Saiu de lá com uma indenização de 10 milhões de dólares e a idéia de irrigar os mercados com informações políticas e econômicas de todo o mundo. Em Nova York, ele concedeu a seguinte entrevista a VEJA.
Veja – Por que o senhor resolveu candidatar-se a prefeito de Nova York?
Bloomberg – Porque estou empenhado em mudar para melhor a vida das pessoas. Ser prefeito desta cidade requer capacidade gerenciadora, liderança e também saber comunicar-se com o povo. Esse cargo exige que se prestem contas à população. Tudo isso já faz parte de minha rotina de trabalho. Na Bloomberg, eu gerencio, administro, ouço e também dou satisfação do que faço ao mercado. Acredito que alguém precisa fazer com que a burocracia desta cidade melhore. Há uma série de problemas a ser resolvidos por aqui: não há dinheiro que chegue e há desperdício e problemas com os sindicatos, entre outras coisas. Em Nova York vivem 8 milhões de pessoas, e esta é uma cidade com tamanha liderança que, se eu fizer com que as coisas melhorem por aqui, certamente essas mudanças acabarão sendo copiadas em muitas outras cidades.
Veja – Mas o senhor não acha que administrar uma cidade é uma atividade bastante diferente de tocar a própria empresa? Afinal, o senhor é dono da Bloomberg e pode fazer o que bem quiser com ela. Como prefeito o senhor teria de prestar contas ao povo e aos vereadores diariamente.
Bloomberg – Certamente há diferenças entre as duas coisas. Mas no mundo dos negócios também existe uma série de restrições a respeito do que se pode fazer. Como, por exemplo, convencer as pessoas a trabalhar conjuntamente, a lidar com fornecedores, consumidores, com as legislações municipal, estadual, federal. Na Bloomberg nós lidamos com as leis de 125 países ao redor do mundo. Portanto, eu poderia afirmar que meu trabalho atual é até mesmo mais difícil de fazer do que aquilo a que estou me propondo.
Veja – Mas como prefeito de Nova York o senhor também teria a amolação de ver a imprensa sensacionalista vasculhando sua vida privada incessantemente…
Bloomberg – Não há nada em minha vida privada que pudesse causar-me qualquer tipo de embaraço. O que a imprensa faz é realmente invasivo, mas se os repórteres olharem bem não vão encontrar nada. Realmente é chato que a imprensa vasculhe sua vida, mas lidar com isso faz parte de minha escolha. O que você prefere fazer: ajudar o povo ou continuar numa posição confortável? Quero ajudar o povo de Nova York. Sei que no leito de morte, se eu olhar para trás e concluir que temi o escrutínio público e preferi gastar meu tempo jogando golfe ou tomando mais banhos de sol a trabalhar duro, eu vou dizer não! Tenho certeza de que terei mais prazer e satisfação na vida se ajudar a quem precisa.
Veja – O que o senhor tem a dizer sobre os processos por assédio sexual que algumas de suas ex-funcionárias têm movido contra o senhor?
Bloomberg – Temos alguns milhares de empregados. Todos os ex-funcionários que têm uma reclamação recorrem a advogados que nos ligam e dizem: ?Nós vamos acusá-los de alguma coisa e, se vocês não quiserem ter nenhum tipo de publicidade negativa envolvendo a empresa, é melhor nós fazermos um acordo e vocês assinarem o cheque?. E minha resposta é não. Nós não fizemos nada de errado e não vamos mudar.
Veja – Mas o que o senhor teria a dizer especificamente sobre os processos por assédio sexual?
Bloomberg – Em primeiro lugar, em vinte anos de minha empresa, que atua em mais de 100 países, só aconteceram três desses processos. Além disso, um deles foi desqualificado pelo próprio juiz, que não viu nenhuma evidência que pudesse incriminar-nos. No segundo, o juiz mandou o marido e o cunhado da reclamante para a cadeia por fraude. E no terceiro nós acabamos fechando um acordo financeiro. Foi uma coisa ultrajante, mas o fiz apenas porque o processo se desenrolaria interminavelmente. Passei por um detector de mentiras que não acusou nada contra mim. Se você perguntar à maioria de nossos empregados, eles vão dizer que adoram trabalhar aqui e não querem demitir-se. Mas eu sou um belo alvo e por isso tem gente que sempre vai acusar-me de algo. E a única coisa de que me têm acusado é de justamente dizer alguma coisa – nunca de ter feito algo errado. E mesmo nesse caso o detector de mentiras provou que eu não tinha dito nada daquilo. Meus acusadores não prestaram testemunho sob juramento, mas eu sim. Qual é? Chega! Isso é ridículo!
Veja – O senhor, que pertencia aos quadros do Partido Democrata, mudou de partido no ano passado. Qual é a diferença entre ser um democrata e ser um republicano em Nova York?
Bloomberg – Na verdade, em Nova York não existe nenhuma diferença. Mesmo nacionalmente, há republicanos liberais que são mais liberais que alguns democratas conservadores. De certa maneira, há uma sobreposição entre os democratas de direita e os republicanos de esquerda no Congresso americano. Mas no âmbito da cidade de Nova York essas diferenças não são visíveis.
Veja – Que tipo de ideal lhe serve de motivação para a vida pessoal e profissional?
Bloomberg – Adoro minha família. Adoro correr, esquiar, jogar golfe, gerenciar minha empresa e também ajudar as pessoas – e, novamente, é por isso que quero ser prefeito de Nova York. Auxiliar o próximo faz parte da cultura americana. Desde o berço os americanos são ensinados a se preocupar com as outras pessoas. Nem todos aprendem essa lição, mas o serviço público é um conceito que está no cerne de nossa cultura, de uma forma mais enraizada do que nos países latinos. E talvez seja por isso que nós temos um desempenho melhor.
Veja – Como é que o senhor vê a Bloomberg daqui a cinco e daqui a dez anos?
Bloomberg – Não penso nem planejo nada com toda essa antecedência. Na verdade, não planejo nada para um prazo mais longo que os próximos doze meses. Acho que a habilidade de prever as oportunidades e os problemas que vão ocorrer daqui a cinco anos é tão pequena que eu não gasto meu tempo com isso. Sou um sujeito prático: olho diretamente para aquilo que nós podemos fazer neste mês ou neste ano. E, se podemos fazer um bom trabalho neste ano, no ano que vem teremos um monte de novas oportunidades para explorar. Meu trabalho consiste exatamente em assegurar que a empresa possa lidar com qualquer espécie de revés, enquanto a missão dos outros 7.199 funcionários é fazer tudo para que não precisemos enfrentar uma posição desfavorável. Eles têm de construir, inovar, trabalhar duro para melhorar a empresa, enquanto eu preciso ater-me aos possíveis reveses. Alguém disse que a Bloomberg corre muitos riscos desnecessários, mas eu diria que não somos assim. Na verdade, a razão pela qual nós temos tido tanto sucesso é que fazemos coisas novas, mas nós as planejamos com a antecedência suficiente.
Veja – Como é que o senhor vê seus principais competidores, principalmente a agência de notícias Reuters e o conglomerado Dow Jones?
Bloomberg – Não sei quem eles são nem o que fazem.
Veja – Por que até hoje o senhor não abriu o capital da empresa, oferecendo suas ações ao público?
Bloomberg – Porque não existe nenhuma razão para isso. As empresas só abrem seu capital nas bolsas de valores quando precisam levantar dinheiro. Acontece que nós temos todo o dinheiro e a visibilidade de que precisamos no mercado. Em outubro vai fazer vinte anos que esta empresa foi fundada, e estamos muito bem, obrigado. Acontece que depois que se abre o capital de uma empresa você é levado a restringir os riscos que ela precisa correr para continuar crescendo.
Veja – O senhor acredita que a desaceleração da economia americana poderá resultar em recessão?
Bloomberg – Acredito que esse período de desaceleração ainda não acabou, e na verdade ninguém sabe quando isso ocorrerá. Nos últimos anos, todos os setores da economia americana estiveram em expansão. Além disso, o acesso ao mercado de ações foi enormemente facilitado a novos investidores, que acabaram aquecendo-o demais. Agora, estamos justamente passando por essa correção do mercado de ações, o que aliás é bastante saudável para a economia. Todo mundo tem uma opinião a respeito disso, mas de fato ninguém sabe quando essa desaceleração terminará. Não acredito que a economia americana será zerada e tampouco que o mundo vá acabar.
Veja – O Brasil é hoje umas das maiores economias do planeta, mas ainda é bastante vulnerável a qualquer sobressalto externo. De que maneira o país poderia melhorar sua imagem internacional e também fortalecer sua economia?
Bloomberg – O Brasil é um grande país, com um enorme número de pessoas que trabalham duro. Entretanto, não tem uma massa de trabalhadores suficientemente educada. E quem olhar para o Brasil verá um enorme número de pessoas que não sabem ler nem têm as habilidades profissionais necessárias para competir globalmente. Portanto, educação é o primeiro item a ser melhorado no país. O segundo depende de uma enorme vontade política: o Brasil precisa abrir cada vez mais suas fronteiras. Hoje não se sobrevive a menos que se possa fazer comércio ao redor do planeta. E vender produtos e serviços ao redor do mundo significa também que os comerciantes de outros países possam trazer os produtos deles para seu país. Os trabalhadores brasileiros estarão competindo com os do mundo inteiro, e vice-versa. O terceiro fator importante é o país se assegurar de que o mercado financeiro e as empresas terão leis regulamentadoras que garantam negócios justos e o mais transparentes possível. E é bom deixar claro que a maioria das empresas não gosta nem de regulamentações nem de revelar a performance que obtêm com seus negócios. Mas são essas duas medidas que fazem com que as pessoas tenham confiança bastante para investir em qualquer mercado.
Veja – As chamadas economias emergentes, como o Brasil, são bastante afetadas pelas cotações que seus títulos ganham de agências internacionais, como a Moody?s e a Standard & Poor?s. Mas às vezes os títulos brasileiros acabam sendo rebaixados por insucessos de outros países, como a Argentina recentemente. O senhor acha que essas agências fazem um bom trabalho?
Bloomberg – Veja bem: essas agências são empresas independentes. Ninguém é obrigado a ouvir o que elas dizem. Mas se alguém destrói a independência delas estará eliminando a oportunidade daqueles que recorrem a elas de ter uma opinião imparcial. Em meus 59 anos de vida, a todo instante ouço as pessoas reclamando contra agências independentes porque não gostam dos resultados e não porque haja alguma coisa errada com as cotações em si.
Veja – Que conselhos o senhor daria ao pequeno investidor brasileiro?
Bloomberg – Acho que ele deveria todo mês separar 8% de sua renda e aplicar em ações através do mercado de fundos mútuos, e ponto final. Ele tem simplesmente de se esquecer do resto e voltar a se concentrar em seu trabalho. Não deve nem mesmo ver o sobe-e-desce das ações no jornal, já que nunca poderá ganhar o suficiente no mercado de ações para se aposentar de um dia para o outro. Ele não é esperto o bastante – e tampouco eu – para ganhar dinheiro com o pregão.
Veja – Quer dizer que Michael Bloomberg não é esperto o bastante para ganhar dinheiro na bolsa?
Bloomberg – Não sou mesmo. E acho que quase ninguém sabe ao certo como ganhar dinheiro com isso. Ora, é para isso mesmo que os fundos mútuos existem: diversificar seu investimento e proporcionar-lhe uma gerência profissional. Nunca entendi por que as pessoas perdem o tempo delas conferindo as cotações de seus investimentos todos os dias. Isso é uma perda de tempo enorme! Se fosse elas, eu me limitaria a trabalhar."
MERCADO
"Negrume", copyright Coleguinhas, uni-vos (www.coleguinhas.com.br),
9/07/01
"Tem épocas que parece que nada dá certo, né? O dinheiro fica curto, o chefe passa a implicar com tudo, os filhos deixam de querer estudar, a mulher começa a falar em divórcio…Pois parece ser o tempo pelo qual passamos aqui no Rio de Janeiro atualmente. Diferentes fatos, que parecem fazer parte de um processo, aconteceram simultaneamente e deixam no ar aquele clima estranho, de escura apreensão e certa tristeza.
O caso do fechamento da sucursal do Panorama Brasil na ex-Cidade Maravilhosa, noticiado pelo Jornalistas&Cia, por exemplo, é apenas mais um caso, dentre tantos outros, no qual a política tem mais importância para desenlace da história do que os problemas internos. É que, como também o J&C também informou há tempos, o controlador do veículo, Orestes Quécia, pretende criar uma versão em papel, que, obviamente, teria mais poder de pressão política na hora das eleições do ano que vem do que a versão eletrônica. Como os interesses de Quércia se localizam em São Paulo e o lobby é feito em Brasília, estas duas praças permanecem (BSB até perde gente, mas não acaba, segundo o J&C). O Rio, secundário para Quércia – e, pra falar a verdade, economicamente também – pode perfeitamente ficar sem representação do PB por ora.
Um caso inteiramente diferente foi o aborto do Metro, o jornal que circularia de graça entre os usuários do Metrô do Rio. Planejado pelo Modern Times Group, um grupo anglo-sueco que já detém publicações em metrôs de 16 cidades do mundo, este natimorto diário foi vítima mesmo da conjunção de um cara que se diz expert em marketing jornalístico e dos interesses das empresas do setor que dominam o mercado fluminense.
No primeiro lado da equação, o sujeito – por incompetência ou má-fé, você escolhe – deu a entender aos gringos que a aprovação da lei que permite a entrada de grupos estrangeiros em empresas de comunicação iria se dar logo, quando, desde início de 2000, se sabia que o Império Global iria embarreirar tudo para aumentar ainda mais o quase monopólio que já detém por aqui antes deles desembarcarem. O segundo fator foi, em parte, decorrência do primeiro: vendo o perigo que seria um jornal bem-feito e gratuito, as empresas que já dominam o mercado de jornais populares entraram na Justiça usando exatamente o fato de uma empresa estrangeira ter participação em um veículo editado aqui. Resultado: os estranjas fecharam o escritório aqui e se mandaram, embora tenham dito que, quem sabe, no futuro…Só espero que escolham melhor o parceiro da próxima vez.
O terceiro fato que baixou a crista do pessoal aqui aconteceu em São Paulo. O Globo praticamente destruiu a sucursal de lá, demitindo 19 em 25 coleguinhas. Mas isso já era mais ou menos previsto desde que a Infoglobo comprou o controle do Diário Popular, um jornal tradicionalmente forte em cobertura local. Assim, por artes de sinergia, se sabia que haveria cortes na sucursal paulista do Globo. A única surpresa talvez tenha sido a sanguinolência do processo, mas não ele em si. E foi este festim carniceiro que fez com que a galera aqui do Rio ficasse com medo. Acho que, por enquanto, o lance vai ficar restrito por lá mesmo. O ?por enquanto? vai por conta da situação delicada da economia. Se ela não melhorar bem até outubro, quando os morubixabas se reúnem a fim de fazer as previsões para o ano seguinte, pode ser que a situação empreteje mesmo. E isso, temo, vale para todo o mercado carioca.
?Menino! Esse mundo tá virado? – Vovó Sinhá sempre exclamava essa frase, batendo uma mãozinha na outra, quando algo que ela considerava muito incrível acontecia. Lembrei dela na segunda-feira ao ler um venerando jornalista, tido e havido como de conduta ética impoluta, defender o roubo de documentos na página de opinião do jornal em que trabalha, quando ?jornalisticamente lícito?. Esse mundo tá mesmo virado, vó.
Boechat no Dia – Ricardo Boechat está mesmo negociando com O Dia. A idéia mais em voga no momento é ele se tornar um espécie de diretor, tipo ?ministro sem pasta?, escrevendo algumas grandes matérias de bastidores.
Jornal partido – O clima na redação do JB não é bom. Há distintamente dois grupos: os que chegaram com a nova direção e os da antiga. Nenhum dos dois tem boa vontade com o outro.
Pulgas – Mário Renato Marona já saiu, mas tem mais gente coçando a auricula na Estrela da Morte.
?Tá no placar!? – Pesquisa realizada pela Nielsen/NetRatings em abril, e publicada pela InfoExame, aponta o Último Segundo, do IG (agora também acessível via sítio de O Dia), como o líder de audiência entre os veículos eletrônicos, com 563.321, seguido pelo Estadão, com 303.382, a Veja On Line (150.129), O Globo (127.845) e o ClicRBS, com 117.231.
Contagem regressiva – Se nada der errado, o Globonews.com entra em rede no dia 16 de julho.
Penitência – Quero me arrojar ao chão diante da querida Anabela Paiva, do NO.. Foi ela quem deu o furo das mudanças na Globo semana passada e eu não mencionei o fato.
PARTIDO DA MÍDIA
"Mídia", copyright Veja, 9/07/01
"?No artigo ?Partido da mídia? (Opinião, pág. A2, 28/6), de Otavio Frias Filho, o alerta para o ponto de saturação da imprensa como instrumento democrático caiu-me como um amargo atestado de óbito daquilo que mais me move na formação acadêmica: ?A diversidade como ferramenta para a ampliação das visões de mundo e opções de vida coletiva?, para usar algumas de suas palavras. Lembrei-me também do polêmico artigo em que o filósofo da USP José Arthur Giannotti defendeu a existência de um lugar amoral na política -não existiria, em contrapartida, também um espaço ?amercadológico? no jornalismo? Algo que preservasse a diversidade e que nos deixasse a salvo da máquina? Creio que sim. Ele ainda pulsa em alguns pontos dos jornais brasileiros.? (Marcílio Godoi (São Paulo, SP)"