UNIVERCIDADE
Victor Gentilli
A UniverCidade não é apenas um erro de ortografia. É também um erro de informação. Afinal, o Centro Universitário da Cidade, antiga Faculdade da Cidade, não atingiu o status de universidade que sua griffe sugere. Mas é sem a menor sem-cerimônia que ilude seus alunos.
Agora, além de iludir os estudantes, também ameaça seus professores. Um documento, datado de 15 de agosto, vem sendo distribuído a todos os docentes da instituição com ameaças para o docente faltoso, que pode ser "demitido sem justa causa".
O texto é explícito. Afirma Ronald Levinsohn no quinto parágrafo de seu documento: "Até agora as armas da UniverCidade têm sido a vontade de servir melhor aos nossos alunos e à ética empresarial. O esforço e a dedicação dos professores engajados nesse programa é que transformarão nossos sonhos em realidade. Há muito que fazer para melhorar nossos serviços de ensino".
O parágrafo seguinte é não apenas explícito, mas ameaçador: "E é disso que depende a sobrevivência da instituição e a manutenção de seu emprego" (grifo meu).
O proprietário da instituição coloca o ensino na vala comum de qualquer comércio, submetido às regras do mercado. Assim, a UniverCidade é apresentada como uma instituição em "guerra" com a concorrência pela conquista e a manutenção do alunado, na qual usará de todas as armas.
Levinsohn admite as deficiências do escolão que dirige, mas afirma: "Vamos superar nossa incompetência e passar a disputar limpamente a preferência dos consumidores com ética, melhores serviços e preços mais baixos".
O empresário informa aos seus empregados que sua empresa passa por um "momento de reestruturação administrativa": "Optamos por fazer uso das oportunidades e ocupar os espaços vazios no mercado universitário antes que outra instituição o fizesse. Essa é a razão do descompasso. Crescemos além do previsível. Agora começamos a volta à normalidade empresarial e ao cumprimento de nosso Plano de Desenvolvimento Institucional".
Embora use o artigo definido para tratar do "descompasso", o autor do texto não o esclarece. Parece referir-se a um parágrafo bem anterior: "A missão da UniverCidade estava apontada para um nicho de mercado que constitui a elite. Adotamos, então, uma estratégia mais adequada para uma instituição que pretende atuar à frente de seu tempo, com eficiência e sem finalidade de lucro para seus associados: levar ensino de excelência aos quatro cantos da cidade, oferecendo esses serviços pelo menor preço possível, para trazer um população de excluídos ao ensino universitário".
No final, Levinsohn faz uma análise da conjuntura atual no MEC. "Temos observado a luta que se trava nos bastidores da educação, com pano de fundo nos gabinetes do MEC". Defende a atual administração da SESu e do Inep, mas aponta a existência de três forças em conflito. "Há quem sustente que o setor cresce desordenadamente, enquanto outros afirmam que é preciso salvar a universidade pública da ocupação de seus monopólios pelas particulares. Um terceiro grupo esforça-se para evitar mudanças e deixar tudo como está, ou seja, as universidades particulares com suas reservas de mercado intocáveis, mediante a cassação da pequena autonomia dos centros universitários".
Em seguida, brada:
"Nós, da UniverCidade, estamos afastados dessa politicagem (…)."
O antepenúltimo parágrafo do documento, mostra algumas pistas para entendê-lo melhor. Na íntegra:
"Certamente, não será com base nas notas de alunos que não se identificam no ?provão? e entregam o teste em branco que o MEC continuará levando à execração pública as instituições particulares rigorosas, avessas a conchavos. Isso foi negociado pelo MEC com o Congresso Nacional, cuja maioria não tem demonstrado simpatia com a iniciativa privada."
Sem cobertura
Uma pena que tudo o que se passa no interior das empresas do ramo de educação fique fora da cobertura da imprensa. Para a mídia, melhor ver essas empresas como anunciantes do que como pauta.
Se a imprensa corresse atrás, descobriria o que Levinsohn deixou de dizer. Afinal, todos as instituições que recentemente conquistaram autonomia para criar cursos e aumentar vagas, transformando-se em centros universitários, estão sofrendo um processo de recredenciamento pelo MEC. Mas, ou a imprensa se cala ou faz proselitismo, como Veja em sua última edição. Já foi o tempo em que educação merecia repórteres, editores, boas reportagens e boas edições.
Ronald Levinsohn gosta muito da autonomia. Mas recusa qualquer controle estatal.
Chamar o "provão" de conchavo e desqualificar o Congresso Nacional, pelo suposto fato de que a maioria não é simpática ao ensino particular, passa ignorado pela imprensa como se fosse coisa normal.
Infelizmente não é.