TERROR & HORROR
"Assepsia, telecabo e comédia", copyright Folha de S. Paulo, 16/09/01
"Muito tranquilamente, estava preparando, para ocupar este espaço, um texto sobre os dez anos da TV paga no Brasil e também sobre a novela ?As Filhas da Mãe? quando eu e o mundo fomos atropelados pelos acontecimentos. Portanto, vamos a eles, aos acontecimentos, mas em seguida falaremos dos outros dois temas.
Não há como deixar de comentar a transmissão da tragédia que se abateu sobre os Estados Unidos. Recuso-me a entrar aqui no conteúdo ideológico da questão -terrorismo diabólico, castigo para os imperialistas ianques ou começo da terceira guerra. Vou me ater à transmissão do evento via TV para o mundo, posto que esse é o tema precípuo deste caderno.
Afinal, não é todo dia que você vê, ao vivo, um dos prédios mais altos do mundo virar pó na sua frente.
Enfim, não é a todo instante que você pode presenciar a morte de tanta gente ao mesmo tempo da sala de sua casa.
E é aí que entra uma questão fundamental: os mortos.
Não que eu ansiasse por ver sangue, gente esmagada, cabeças rolando ou imagens do gênero. Mas era de se esperar que alguma coisa desse tipo surgisse no vídeo, dado o gigantismo dos números -de andares dos prédios, de pessoas que lá trabalhavam, de transeuntes que por ali transitavam diariamente.
Enfim, ao longo de todo o dia em que se acompanhou passo a passo os atentados, o que menos se viu foi gente morta ou ferida.
Impossível evitar a pergunta: houve censura?
Impossível não imaginar aqui uma boa teoria da conspiração: as emissoras foram proibidas de expor a desgraça americana para a comemoração de seus algozes?
Pertinente propor outra questão: ocorreram falhas profissionais em profusão, a ponto de os jornalistas de TV não terem captado o lado mais trágico da tragédia, que é a materialidade das perdas humanas?
Por que apenas tomadas distantes, repetições infinitas dos aviões se chocando com os prédios? Por que apenas pessoas, em pânico ou não, tentando escapar, correndo? Por que só sobreviventes -alguns levemente feridos, cobertos de fuligem. E os que não sobreviveram?
São perguntas que, até o encerramento desta edição, permaneciam sem respostas convincentes.
Na busca de esclarecimentos, perguntei ao correspondente da Folha em Nova York, Sérgio Dávila, como as coisas aconteceram ali, no calor da cobertura, já que ele estava no ?olho do furacão? e relatou cenas chocantes em seus textos publicados no jornal. Basicamente, ele me disse que, no meio da confusão, as câmeras das redes de TV não conseguiam chegar perto do ponto central da tragédia. E que as cenas de gente pulando dos prédios e se estatelando no chão foram registradas apenas por um ou outro cinegrafista amador que se enfiara por ali.
Ok, certamente foi isso mesmo o que aconteceu.
E depois, o que teria sido feito dessas cenas que não foram mostradas?
É no mínimo estranho que elas não tenham sido transmitidas à exaustão, principalmente se levarmos em conta que a TV americana é especialista em mostrar tragédias, gente explodindo, sangue e desgraça.
Acho que falta muita coisa para ser explicada sobre esse assunto.
Como a TV não vive apenas de tragédias, vamos nós aqui registrar que foi num domingo, 15 de setembro, que ocorreu a primeira transmissão via cabo no país. Dez anos completados ontem, portanto.
No começo, era a TVA com apenas cinco canais. Hoje, já são quase 100 opções para quem pode pagar uma assinatura. Esse pessoal privilegiado, que tem como fugir da mesmice da TV aberta, forma hoje um exército de quase 3,5 milhões de pessoas. Mas será que, passada uma década, a TV por assinatura é um produto que satisfaz plenamente seu público.
Creio que não: propaganda e repetições demais, originalidade de menos: eis o cardápio das TVs pagas, com as velhas exceções que confirmam a regra.
Por falar em mesmice da TV aberta, abra-se aqui um parêntese para a novela ?As Filhas da Mãe?. Há tempos não se via um elenco tão coeso dentro de uma trama tão atraente e dirigido de forma tão dinâmica.
No começo, parece que a audiência não correspondeu à grandiosidade do investimento, mas agora as coisas estão entrando nos eixos.
Não é para menos: todos os ingredientes da melhor teledramaturgia (mais especificamente da comédia de costumes) estão ali: luxo e pobreza, cafajestes e heróis, megeras e gatas, emoção e adrenalina, esquetes, canastrões, brigas, confusão, namoros, traições. Ou seja, aquelas bobagens todas que fazem a alegria do público das sete da noite.
Deve-se registrar que tudo ali tem um tom inovador, moderno, do visual pop à condução da trama por intermédio do rap.
A Globo, quando quer, pode."
"SBT preferiu desenho animado à tragédia em NY", copyright Folha de S. Paulo, 16/09/01
"Por volta das 10h30 de terça-feira, quando todas as emissoras abertas brasileiras já mostravam imagens ao vivo do atentado terrorista às torres do World Trade Center, em Nova York, o SBT insistia em exibir sua programação normal de desenhos animados matinais.
A emissora de Silvio Santos, até aquele momento, havia se limitado a um primeiro e sucinto boletim extraordinário num dos intervalos do desenho ?Swat Kats?, cujo episódio, por uma incrível coincidência, mostrava uma batalha travada entre aviões de combate sobre uma metrópole que em tudo lembrava o cenário nova-iorquino. Numa das imagens, duas gigantescas torres eram atacadas pelos pilotos insanos, como se a animação tivesse sido inspirada no que acontecia naquele exato momento na ilha de Manhattan.
Globo se perde durante discurso
A declaração de George W. Bush, terça à noite, pegou a Globo de surpresa. O canal só exibiu parte da fala do presidente dos EUA. A citação bíblica ?mesmo que caminhe no vale da sombra da morte, não temerei, se o Senhor estiver comigo? foi traduzida como: ?Ele não tem medo de nenhuma ação demoníaca?.
Datena resiste ao cansaço no ar
O apresentador José Luís Datena entrou no ar pela Record logo após o atentado, na manhã de terça. No final da noite, lá estava ele, no programa de Adriane Galisteu, debatendo o caso. Embora se mostrasse atento à conversa, ele parecia prestes a pedir um travesseiro para dormir no sofá da loura.
Rede TV! antecipa reação dos EUA
Na terça, quando mísseis cruzavam o espaço aéreo do Afeganistão, provável abrigo do principal suspeito dos atentados em Nova York, o ?TV Fama? cravava: ?EUA acabam de atacar o Afeganistão?. Logo depois, um grupo de oposição ao Taleban assumiu a autoria dos ataques.
Luciana Gimenez, a ?nova-iorquina?
Luciana Gimenez, do ?Superpop?, da Rede TV!, deu a impressão de estar mais preocupada em dizer que conhece intimamente Nova York do que em falar da tragédia no World Trade Center. ?A visão que a gente tem das torres quando sai do metrô é um símbolo da cidade?, disse.
Waldvogel não adere à onda sensacionalista
Como se não bastassem as imagens, que deixaram os telespectadores estupefatos, os apresentadores das principais redes de TV do país ainda carregaram nas tintas de seus comentários com adjetivos bombásticos sobre os atentados ao World Trade Center. Carlos Nascimento e Ana Paula Padrão, da Globo, foram os campeões do sensacionalismo. O contraste foi oferecido por Mônica Waldvogel, da Record, que, sem subestimar a tragédia, manteve um tom sereno e jornalístico."
"Tragédia altera programação das TVs", copyright Folha de S. Paulo, 14/09/01
"Preocupados em evitar programas que não sejam ?politicamente corretos? para o momento vivido nos Estados Unidos, como seriados e filmes sobre terrorismo, vários canais estão alterando a programação.
Os ataques ao país mudaram também a rotina dos estúdios de Hollywood e os reflexos atingem a televisão brasileira.
A ABC cancelou a exibição do filme ?O Pacificador?, prevista para o próximo sábado. A trama envolve terrorismo nuclear.
?Não os vejo apropriados para o momento?, informou a assessoria da emissora. No lugar do longa, será exibido um filme romântico com Sandra Bullock e um episódio da série cômica ?America?s Funniest Home Videos?.
Também foram canceladas pela ABC as estréias das séries ?The Agency? e ?Alias?, ambas sobre terrorismo.
Nos EUA, a Fox substituiu a exibição do filme ?Independence Day?, marcada para o próximo domingo, no qual alienígenas destroem a Casa Branca e o Empire State, em Nova York. Em seu lugar, serão reprisadas comédias.
Amanhã, o canal substituirá o filme ?Arquivo X?, que traz uma cena da explosão de um prédio, pela comédia romântica ?Nove Meses?, estrelada por Hugh Grant e Julianne Moore.
?24?, um novo programa da Fox, foi também cancelado porque iria falar de um candidato à presidência americana sendo assassinado quando seu avião explodisse no ar. ?Seria cruel e insensível levarmos esse tipo de coisa ao ar em um momento como este?, divulgou a Fox.
No Brasil, o canal Fox também alterou a programação. ?Corações Apaixonados? irá ao ar no lugar de ?Nova York Sitiada?, no domingo, e ?Um Dia Especial? substituirá ?O Pacificador?, dia 21. Os filmes cancelados falam sobre terrorismo.
Os finais das temporadas de ?Buffy, a Caça-Vampiros?, e de ?Angel?, que foram ao ar na terça, dia da tragédia, serão reprisados na próxima terça.
No canal Sony, no Brasil, foi cancelado a transmissão da entrega do Emmy, que seria domingo. O prêmio, considerado o Oscar da TV dos EUA, foi adiado indefinidamente em razão dos atentados.
Houve reflexo também na TV aberta. O SBT substitui a exibição do filme ?Inimigo do Estado?, sobre terrorismo, por ?Batman & Robin?, hoje à noite.
?Frasier?
A NBC informou ontem que a estréia da nova temporada de ?Frasier?, que seria na próxima terça, foi adiada em uma semana.
O motivo foi a morte de David Angell, 54, um dos produtores do seriado. Ele estava em um dos aviões que se chocaram com o World Trade Center na terça.
Além de colaborar para a criação de ?Frasier?, Angell também participou da formulação do seriado ?Cheers?, entre outros trabalhos.
A mulher do produtor, Lynn, também estava a bordo do vôo.
Nos EUA, ?Frasier? é uma das maiores audiências da TV e já ganhou 21 Emmys, seis deles dados a Angell e outros produtores.
Na última temporada, foi visto por cerca de 16 milhões de telespectadores.
No Brasil, não deve haver alteração na exibição de ?Frasier?, porque o canal Sony leva a série ao ar com duas temporadas de atraso em relação aos Estados Unidos.
Na pauta
A tragédia norte-americana também é pauta de vários programas especiais que estão sendo preparados às pressas pela TV aberta e por assinatura.
Até o fechamento desta edição, já estavam definidas mudanças na Globo e GNT.
O ?Globo Repórter? de hoje será sobre o drama dos EUA. Além de rever os principais fatos desta semana, o programa irá entrevistar brasileiros que se mudaram para lá em busca de mais segurança.
A atração mostra entrevista com o piloto Fernando Murilo de Lima, que pilotava o Boeing-767 da Vasp sequestrado em 1988. O sequestrador queria que Lima jogasse o avião sobre o Palácio do Planalto.
No canal GNT, seriam exibidos ontem os documentários ?Um Dia em Setembro? e ?A Mente do Terrorista?, sobre os métodos e motivações de vários grupos terroristas no mundo.
Amanhã, vai ao ar o documentário ?Mikdad: O Relato de um Terrorista?, sobre um fracassado atentado de um homem-bomba em Jerusalém.
No domingo, o GNT exibirá uma edição especial do ?Manhattan Connection? além de reapresentar os programas ?GNT Cidadania Brasil? sobre a questão da intolerância."
"Hollywood cancela eventos e estréias de filmes", copyright Folha de S. Paulo, 14/09/01
"Hollywood, a indústria especializada em fantasia e escapismo, colocas os pés na realidade e adapta-se à dramática situação.
Não apenas foram cancelados os eventos semanais, como Emmy (prêmio máximo da televisão norte-americana que aconteceria neste domingo), Grammy latino (previsto para ter sido realizado no dia 9) e shows de Madonna e Black Crowes (que aconteceriam na última terça), como também alguns filmes e seriados televisivos que exploravam temas terroristas.
Avião
A primeira vítima das circunstâncias foi o novo projeto do comediante Tim Allen, filme cuja trama central envolve um aparelho nuclear colocado num avião de Miami para as Bahamas.
Em comunicado oficial, a Disney confirma que ?Big Trouble?, que chegaria às telas na semana que vem, será lançado somente em 2002.
Outro longa, dessa vez da Paramount, foi também atingido pelo ataque da última terça-feira. ?Sidewalks of Manhatan?, com Edward Burns, que estrearia hoje, será lançado em novembro.
Além disso, a Sony não vai mais levar aos cinemas o trailer de seu novo blockbuster, ?Homem-Aranha?, que saiu do ar do seu site (www.apple.com/trailers/columbia/spiderman) no dia em que aconteceram os atentados em Nova York.
O motivo são algumas imagens do World Trade Center, em que o super-herói prende um helicóptero entre as duas torres numa teia gigante."
"Um Soprano em meio ao caos", copyright Folha de S. Paulo, 16/09/01
"A figura que passa no corredor de resgate, a um quarteirão dos escombros do World Trade Center, de alguma maneira não combina com o ambiente. ?Joe, olhe só quem está aqui?, diz um policial. ?É o sobrinho do Tony Soprano!?, reconhece o outro. É ele mesmo, o ator Michael Imperioli, o Chris Moltisanti da ?Família Soprano?, que acabou de ser consagrado ?chefe? numa das mais famosas séries da TV norte-americana. ?Eu moro aqui do lado do World Trade Center?, confirma ele à Folha.
?Vi e ouvi tudo. Peguei minha mulher e filha e as levei correndo para um hotel no Brooklyn?, continua. ?Ficamos com medo de que alguma parte caísse em nossa casa.? Chris Imperioli está de volta à cena do atentado para checar se está tudo bem com seu apartamento. ?Continua sem eletricidade?, resigna-se o ator.
IMPERIOLI tenta não pensar sobre o ocorrido. ?Não tenho palavras. O que eu posso falar depois de ver meus vizinhos se jogando pela janela??, emociona-se. Nessa hora, Joe, o policial, se aproxima com um celular na mão.
?É VERDADE, mãe, é o Chris Moltisanti!, o braço direito do Tony!?, grita ele. E oferece o aparelho ao ator: ?Mike, você pode dizer umas palavras para minha mãe??. O ator faz a gentileza. O policial se emociona.
PARA não estragar a vida de quem prefere se surpreender pela nova temporada de ?Friends?: quer saber qual das três amigas está grávida, Rachel, Phoebes ou Monica, e quem é o pai? Mande um e-mail para mim que eu conto."