IMPÉRIOS & HIPÓLITO
Copyright Jornal do Brasil, 27/10/01
"1. Cada um usa as palavras como melhor lhe apraz e a poucos lhes apraz usá-las (hoje estou muito Jânio Quadros) como o digitador que vos digita. Se aprazem a vocês outros sentidos semânticos, que Alá (tão na moda) vos proteja e sirva.
Digo isso porque, quando falo de Império me referindo aos Estados Unidos, falo de Império no sentido constante, eterno e universal.
Ninguém nasce império. Todo Império começa por baixo – a Inglaterra, por exemplo, começou com um pais só -, se engrandece, traz progressos e benefícios aos povos que domina, ao mesmo tempo que os explora, violenta e modifica, pra que fiquem à sua imagem e semelhança. Falei bem? Então continuo.
Todo Império tem um período de assentamento, um de fastígio (o que será isso?) e um de decadência. Antigamente os impérios duravam, no auge, uns 300 anos, depois decaíam e desapareciam em outros trezentos (vide Gibbon. Ou não videm. Estou parecendo o FhC que, nos seus livros, manda a gente ver tudo em outro livro).
O último Império universal, ecumênico e único, o americano, começou com data marcada e conhecida, 7 de dezembro de 1941, data da infâmia, ou da mancada – todo depiende del cristal con que se mira. Como, a partir do século XX, as coisas apressaram seu ritmo, o império americano se fez sólido em exatamente 60 anos. E no dia 11 de setembro passado começou, também de maneira absolutamente visível (estamos na época da tequinologia desvairada), sua decadência. Dentro de 50 anos, no lugar das torres gêmeas, teremos gigantesco mercado persa (no sentido figurado da palavra) onde se reunirão gentes de todas as origens, a partir das que já existem no país. Sou otimista incorrigível.
Dentro de 50 anos conferimos. Se vocês ainda estiverem entre nós.
2. A nota 1 é introdução pra esta nota 2. Escrevi esta nota 2. antes da nota 1. Como comentário pequeno, pessoal, irônico, de como funciona um Império.
Como todos sabem (que é como a gente diz pra não deixar o leitor contrafeito), o jornalismo brasileiro teve início em 1808, na… Inglaterra. Não era um mau lugar pra começar. O fundador foi Hipólito José da Costa. O nome da publicação (mensal): Correio Braziliense.
Há alguns anos, levado pela mão de meu velho amigo, o deputado Fernando Gasparian, fui a Maidenhead, perto de Reading (onde Wilde, encarcerado no tempo em que a veadagem não ousava dizer seu nome, escreveu sua famosa Balada), visitar o mosteiro onde está sepultado o iluminista Hipólito José da Costa. Hipólito, pedreiro-livre, sempre exilado, nunca se afastou espiritualmente do Brasil. Seu diário, só copiado para nós em l955, por influência de Alceu Amoroso Lima, tem algumas idéias talvez ainda sociais demais pro nosso neoliberal-on the rocks.
Pois é: estávamos ali, no cloister, olhando a placa de mármore com a biografia de Hipólito José, quando chamei a atenção de Gasparian pra placa ao lado: era de Patrick da Costa, filho de Hipólito, casado com uma lady da região. Patrick, capitão do exército inglês – está lá gravado no mármore – morreu aos 24 anos, vítima de piratas chineses, lembro da frase, ”by the edge of the sea” – à beira-mar.
Esses piratas chineses eram realmente terríveis. Sabem onde viviam? Na China!"