CRÍTICA DIÁRIA
"FHC em toda parte", copyright Folha de S. Paulo, 9/11/01
"D eu tudo errado. FHC se encontrou com George W. Bush, a pedido do próprio FHC, segundo consta, e saiu para falar sozinho.
Nada daquelas cenas costumeiras, em que o presidente dos Estados Unidos aparece ao lado do aliado. Sabe-se lá por quê, FHC perdeu a ?photo-op? a que qualquer estadista estrangeiro tem direito, quando viaja a Washington.
Pior, aproveitando a viagem, a CNN internacional entrevistou o presidente brasileiro logo após noticiar que a tríplice fronteira de Brasil, Argentina e Paraguai é um ?santuário? para terroristas.
Não foi das melhores entrevistas de FHC, para dizer o menos. Na introdução, a entrevistadora já foi falando que o ?Brasil está sob pressão para localizar extremistas islâmicos?.
Depois, uma pergunta:
– Há relatos de analistas de segurança dizendo que a tríplice fronteira é uma área em que terroristas podem operar, um santuário para terroristas, para o financiamento de terroristas. Isso é verdade?
O melhor argumento que FHC conseguiu dar, em sua trêmula resposta, foi que ele e Bush não haviam tratado de nada disso em seu (bem rápido) encontro -e que ele, FHC, não tinha ?informação efetiva? de nada disso. A entrevistadora:
– Mas, senhor, fontes de inteligência internacionais e regionais afirmam que há negócios naquela área, que há mesquitas naquela área que servem de portas giratórias para os extremistas islâmicos. Documentos da inteligência argentina obtidos pela CNN atestam que há ligações com vários grupos terroristas.
E o presidente brasileiro:
– Eu ficaria deliciado se você me enviasse esses documentos, porque oficialmente nós não temos nenhum documento dizendo isso.
FHC estava perdido como em raras vezes na TV. Poderia ter sido instruído melhor.
Mas é o que acontece com quem fala sem parar na TV, um dia no programa de Adriane Galisteu, outro no Cidade Alerta, o seguinte na CNN.
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"Duelo de propaganda", copyright Folha de S. Paulo, 8/11/01
"A CNN atravessou o fim de semana registrando corretamente o novo pronunciamento de Osama bin Laden.
Mas nada de imagens e sempre com o destaque, na sequência, para o outro lado, do governo americano -dizendo não passar de um ?ato de desespero? de Bin Laden.
Mais significativo, porém, foi a própria CNN apresentar o pronunciamento com a expressão ?guerra de propaganda? carimbada na tela.
A propaganda não é obsessão só do lado americano.
A agência de notícias do Irã relatava ontem que o ministro da cultura do país, em reunião com o colega da Síria, disse que as nações islâmicas precisam se esforçar para corrigir a ?imagem falsa? dos muçulmanos que a campanha de ?propaganda? da TV ocidental estaria transmitindo ao mundo.
Ele se gabou da TV dos países islâmicos -sem citar, mas em referência ao canal Al Jazeera- que estaria refletindo os fatos da guerra com mais independência do que a ocidental.
Para azar dele, no mesmo dia a mesma agência ?noticiava? esta declaração de um ministro do Taleban:
– Os americanos lançaram propaganda dizendo que o Mullah Omar havia se escondido, então eu sugiro que o senhor Blair e o senhor Bush peguem seus (fuzis) Kalashnikovs e venham a um lugar específico onde o Mullah Omar vai aparecer com um Kalashnikov para ver quem sai correndo.
Na entrega do Emmy, no canal Sony, as próprias escolhas destilaram patriotismo, a começar pelos muitos prêmios dados a ?The West Wing? -sobre o cotidiano na Casa Branca e o primeiro seriado a tratar dos atentados.
Também não faltaram discursos patrióticos, como o de um símbolo democrata, Barbra Streisand -que tem apoiado Bush e, no programa, saiu falando de ?um tipo diferente de consciência? no país.
Mas o fato é que muitos dos premiados nem apareceram para a cerimônia.
O que não se pode negar ao governo Bush e à TV americana, a começar da CNN, é o esforço que vêm fazendo para não estigmatizar a religião e os fiéis muçulmanos.
Por aqui, a Rede Globo segue os passos da Record e vai abraçando uma religião como sua, no caso, a católica.
O padre Marcelo Rossi estava lá de novo, no fim de semana e ontem, como estrela não apenas de seu programa exclusivo, mas também dos telejornais."
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"É Show", copyright Folha de S. Paulo, 7/11/01
"Enquanto seu candidato tucano não vem, FHC faz campanha sozinho.
Dias atrás, fez uma participação surreal no programa de Adriane Galisteu, É Show, com elogios à apresentadora.
Ontem foi a vez do Cidade Alerta. Luiz Datena, o apresentador, vestiu seu melhor terno escuro e foi até a biblioteca do Palácio da Alvorada. A entrevista foi gravada. No estúdio, ao vivo, Datena dizia:
– Ficou bonito, eu olhando o presidente…
Trechos da primeira pergunta:
– O presidente nos recebe muito gentilmente aqui na biblioteca, que tem obras importantíssimas, não só da literatura brasileira, mas da literatura mundial… Eu li outro dia uma referência ao senhor, num livro que tratava da violência no mundo… Quais as dificuldades que têm uma figura como o senhor, que acumulou muito conhecimento, em transferir isso para a prática?
Quem já assistiu sabe que Datena não é só esse blablablá. Ontem mesmo, questionou FHC sobre o plano de segurança que não sai do papel.
Mas na maior parte do tempo FHC ficou mesmo na conversa fiada, em auto-elogio:
– Quanto mais você estuda, quanto mais você vive, mais você vê que o mundo é complexo, não é preto no branco.
Sem candidato, a propaganda tucana nos intervalos não vende ninguém e tem que apelar para a contrapropaganda.
Era o que fazia ontem num comercial, contra o PT e outros, em que relatava maravilhas do programa Bolsa-Escola.
Do ministro da Educação, Paulo Renato, que acredita ser presidenciável, ao anunciar um aumento unilateral para os professores universitários:
– O governo está dando demonstração do apreço, da valorização que tem em relação aos professores.
E mais:
– Quero destacar o tratamento especial que os professores têm tido no governo do presidente Fernando Henrique.
Howard Kurtz, apresentador de um programa sobre mídia na CNN e colunista do ?The Washington Post?, sentenciou:
– Lembra quando as TVs disseram que não mostrariam as fitas de Bin Laden sem avaliar se eram notícia? O que elas queriam dizer é que não mostrariam de jeito nenhum. Por horrível que seja a mensagem de Bin Laden, é notícia. As redes têm medo de parecer impatriotas -fazendo do Al Jazeera um canal mais equilibrado do que a TV americana."