O médico Joaquim Ribeiro Filho, então coordenador do programa Rio Transplante e médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), foi preso pela Polícia Federal em 30 de julho, no Rio, acusado de interferir na lista de espera de candidatos a transplante de fígado e de cobrar por cirurgias feitas com órgãos recolhidos pela rede pública de saúde. O assunto rendeu títulos bombásticos na internet, imagens em profusão nos telejornais, longos minutos nas emissoras de rádio e centímetros de coluna na mídia impressa.
Na terça-feira (5/8), a juíza Andréa Cunha Esmeraldo, do Tribunal Regional Federal 2ª Região, concedeu habeas corpus ao médico e, na quinta (7), a Procuradoria Regional da República pediu o indeferimento do beneficio, em caráter liminar, alegando permanecerem as suspeitas de que Joaquim Ribeiro Filho de fato comandava um esquema que fraudava a fila única de pacientes à espera de um transplante de fígado.
Seria apenas mais um assunto sensacional, daqueles que fazem salivar os pauteiros, não fosse um detalhe incômodo: estaria a mídia, mais uma vez, apenas reproduzindo o que recebe mastigado das fontes oficiais e abrindo mão de uma investigação independente? Há, neste caso, o risco de a cobertura uma vez mais chafurdar no perigoso terreno do assassinato de reputações?
No domingo (10/8), o ombudsman da Folha de S.Paulo, Carlos Eduardo Lins da Silva, tratou do episódio [ver ‘O silêncio dos inocentes‘] e deu nova dimensão ao assunto: ‘A acusação se refere a apenas dois casos desde 2003. Num deles, o médico foi absolvido por unanimidade pelo Conselho Regional de Medicina; no outro, o transplante foi feito por meio de ordem judicial, o que não prova que seja inocente’.
O ombudsman cobrou da Folha uma investigação mais ampla sobre a atuação do médico e os procedimentos adotados nos programas de transplantes de fígado. Sugeriu que o seu jornal apurasse ‘como funciona a fila dos transplantes, checar custos, entrevistar pacientes do médico, ouvir colegas, investigar as denúncias, recuperar o processo do CRM em que ele foi absolvido e as investigações feitas no segundo caso, contar a complexa história do jogo de poder no hospital em que trabalhava. Enfim, fazer jornalismo’.
A defesa
A advogada Camila Freitas, do escritório do defensor de Joaquim Ribeiro Filho, informa que o médico está sendo acusado pelo Ministério Público Federal de supostas irregularidades em três procedimentos de transplantes de fígado, em desrespeito à fila de transplantes. ‘Contudo, a mídia tem deturpado esta acusação, informando que se trata de acusação de venda de órgãos’, afirma.
O advogado Paulo Freitas Ribeiro, que defende o médico, encaminhou ao Observatório a seguinte manifestação:
‘Na qualidade de advogado do médico Joaquim Ribeiro Filho, venho fazer os seguintes esclarecimentos sobre a operação da Polícia Federal que atingiu de forma tão grave quanto injusta o meu cliente.
‘Em primeiro lugar, o Dr. Joaquim Ribeiro Filho nunca foi acusado de venda de órgãos ou tráfico de órgãos, conforme divulgou equivocadamente a Polícia Federal.
‘A denúncia oferecida pelo Ministério Público versa sobre a suposta prática de transplantes em alegado desrespeito à fila, mas não foi o médico acusado de receber dinheiro para beneficiar os transplantados.
‘A distorção causou danos irreparáveis à honra, à imagem e à dignidade do médico, além de ter desinformado a opinião pública, em prejuízo do próprio Sistema de Transplantes.
‘Na verdade, a acusação feita pelo Ministério Público envolve três transplantes, estando o médico pronto para responder à acusação, pois não praticou qualquer irregularidade.
‘Em relação ao primeiro transplante, realizado em 2003, o médico foi submetido a julgamento no Conselho Regional de Medicina, tendo sido absolvido por unanimidade pelos 21 Conselheiros que o julgaram.
‘No segundo caso, o transplante foi realizado por ordem judicial e foi implantado um órgão que seria descartado.
‘No terceiro caso, sequer houve transplante.
‘Todas as decisões da esfera cível que trataram dos procedimentos em questão foram favoráveis ao médico, que já realizou mais de 400 (quatrocentos) transplantes, sendo pioneiro no Rio de Janeiro.
‘Assim, o que se espera é que ele tenha o direito de se defender, que lhe seja garantido o direito à presunção de inocência, porque uma vez garantidos esses direitos mais elementares, a verdade será estabelecida e será demonstrado que ele não praticou qualquer irregularidade. (Paulo Freitas Ribeiro)’