Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

A Babel que deu certo

FÓRUM SOCIAL MUNDIAL

Celso Vicenzi (*)

Uma Babel moderna, onde mais de 50 mil pessoas de 210 etnias falaram em 186 línguas. Assim foi Porto Alegre durante a realização do Fórum Social Mundial, de 31 de janeiro a 5 de fevereiro de 2002. Estavam lá 15.230 delegados de 4.909 organizações da sociedade civil de 131 países, além de 11.600 jovens de 52 países.

Tantas pessoas reunidas em torno de um ideal que se contrapõe ao dos "senhores do universo", reunidos em Nova York, chamou a atenção da imprensa. Os 2.400 jornalistas de 467 jornais, 193 revistas, 188 rádios, 140 de mídia digital e 116 canais de televisão de 48 países, e mais 780 profissionais free-lancers de 33 países, espalharam por todo o planeta a mensagem de que "um outro mundo é possível".

Nunca o capitalismo esteve tão vulnerável, apesar da arrogância de seus líderes e do poderio militar que ostenta. É que o disfarce não funciona mais. Os dois terços da população mundial que estão alijados dos benefícios do progresso cansaram de esperar. E estão cada vez mais conscientes de que o modelo de globalização liderado pelos Estados Unidos não oferece solução para a humanidade, pois se baseia no privilégio de alguns e na exploração de muitos.

Porque há algo de profundamente errado num sistema que permite que apenas quatro cidadãos dos Estados Unidos, entre eles Bill Gates, detenham um patrimônio equivalente ao PIB de 42 países pobres que congregam uma população de 600 milhões de pessoas. Dos 6 bilhões de habitantes do planeta, 4 bilhões estão excluídos do acesso aos bens que permitem a existência de uma vida digna. É preciso deter esse modelo suicida. Nas palavras de Rigoberta Menchú Tum, da Guatemala, Prêmio Nobel da Paz de 1992: "Não pode haver paz sem justiça, justiça sem igualdade, igualdade sem democracia e democracia sem respeito à diversidade".

Essa Babel que deu certo e que se repetirá novamente em 2003 poderá não "levar ao céu", como queriam os descendentes de Noé, mas varre o planeta com uma certeza que nunca esteve tão clara: bilhões de seres humanos estão cansados de viver no inferno.

Uma revolução, nem tão silenciosa assim, está a caminho.

(*) Jornalista, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina