Monday, 18 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Adriana Del Ré

REALITY SHOWS

"Superprodução disfarça novos shows de calouros", copyright O Estado de S. Paulo, 29/04/02

"Os programas Fama, da Globo, e Popstars, do SBT, que estrearam no sábado, nada mais são do que shows de calouros com superprodução. Os dois reality shows vêm no rastro do programa Raul Gil, que fez as pazes com o sucesso depois que voltou a revelar novos talentos no cenário musical, na Record. E diante do desempenho de ambos no Ibope, a velha fórmula prova que ainda gera interesse entre o público.

Fama, que foi ao ar às 18 horas, conseguiu média de 28 pontos na audiência, durante os 20 minutos em que foi transmitido. Chegou a atingir pico de 32 pontos. Enquanto isso, a Record marcava 19 pontos e o SBT, 9. Apesar de não bater a concorrência, o SBT teve um resultado razoável com seu Popstars:

obteve média de 14 pontos no Ibope, com pico de 17. No mesmo horário, a novela Desejos de Mulher, da Globo, manteve-se na liderança com 36 pontos.

Salvo algumas poucas diferenças, os novos programas trazem formato semelhante. Primeiro, porque vão acompanhar anônimos numa maratona de aulas e testes. Outro ponto em comum é que gente especializada no assunto vai apontar quem deve ser eliminado a cada etapa e eleger os melhores.

No caso do SBT, são só garotas, entre 18 e 25 anos, que estão no páreo.

Aquelas que ?sobreviverem? até a final, poderão fazer parte de um grupo musical. No primeiro episódio, a emissora exibiu toda a primeira fase do concurso, gravado no Sambódromo do Anhembi. Lá, reuniu 6 mil candidatas (selecionadas entre 30 mil), que foram avaliadas no quesito voz e dança. Em meio ao aglomerado de concorrentes, saíram-se bem aquelas que souberam se expor mais. Dois mil passaram para a segunda etapa, que será exibida no próximo sábado e envolverá testes mais específicos.

Em Fama, apenas 12 concorrentes disputarão a vaga sob os holofotes. A diferença é que todos são profissionais na música. No capítulo de estréia, sete homens e cinco mulheres enfrentaram uma triagem e garantiram lugar na Academia Fama, na cidade cenográfica em Vargem Grande, onde vão ficar sob a supervisão de professores de canto, dança, interpretação, entre outros. A Globo conseguiu reunir um elenco forte, de diferentes Estados brasileiros.

Por causa do jogo São Paulo e Palmeiras, o programa foi mais enxuto, mas normalmente, aos sábados, terá 80 minutos. Nesta semana, quatro pessoas serão eliminadas.

Sedução – Com a estréia do quadro Amor a Bordo, Luciano Huck fez uma tentativa de derrotar Raul Gil na audiência. Conseguiu chegar perto com o novo trunfo. Seu programa Caldeirão do Huck obteve média de 14 pontos. Mas quando colocou Amor a Bordo no ar, subiu para 16 pontos e alcançou pico de 22. A Record teve média de 17 pontos e o SBT, 10.

O reality show de Huck é fruto da parceria com a empresa Endemol, detentora do formato, o Love Boat, sucesso nas telinhas européias. Começou também no sábado, com 14 jovens participantes (sete mulheres e sete homes), que não se conheciam.Dois deles já foram eliminados. Os demais estarão em busca da ?cara- metade?. O quadro apela para o voyeurismo do público, curioso em saber quem vai ficar com quem."

 

"?Fama? e ?Popstars? são crias de Raul Gil", copyright O Estado de S. Paulo, 5/5/02

"Raul Gil descobriu o ovo de Colombo ao ressuscitar o velho programa de calouros. A garimpagem de talentos por meio de concurso é mais velha do que a própria TV. O rádio já cumpria bem essa função antes e revelou grandes nomes da MPB nos anos 50.

Foi o compositor Ari Barroso que, no papel de animador de auditório, deu chance a Ângela Maria, Caubi, Nelson Gonçalves e Orlando Silva, entre outros, de soltarem a voz para a multidão. Nos anos 60, a TV abriu com os festivais de música uma nova versão do concurso que acabou revelando talvez a melhor safra musical do Brasil: Elis Regina, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Rita Lee, Gal Costa, Maria Bethânia, Nara Leão.

Essa leva não matou os programas de calouros que, mais soltos do que no rádio, misturavam humor e disputa ?por um lugar ao sol?. O grande emblema dessa tendência foi A Buzina do Chacrinha, cuja maior vitória foi ter revelado Roberto Carlos e Clara Nunes. Edson Bolinha Curi, Barros de Alencar, Flávio Cavalcante, Raul Gil e até mesmo Silvio Santos exploraram incansavelmente o filão até descartá-lo.

Na TV – e no show biz – é assim mesmo. É comum o público morrer de amores por um tipo de programa e depois desinteressar-se a ponto de matar a atração. Foi assim que, nas duas últimas décadas, a TV passou sem dar chance aos novos talentos. Como também nada é definitivo, o gênero voltou com tudo e está generalizando-se pelos canais abertos.

Desta vez, Raul puxa o cordão. A sua insistência na fórmula lhe deu tanto prestígio na Record que ele acabou com um show em horário nobre, incomodando a turma do sofá da Hebe. Seus calouros tornaram-se cantores profissionais, com CD e shows agendados.

A Globo aproveita a onda, mas não explicitamente, com Fama. A idéia foi tirada do espanhol Operação Triunfo, que também deve ter sido inspirado no enredo do filme de Alan Parker. O Fama da Globo, definido como outro reality show, tem um pouco de Big Brother e No Limite. A estréia no sábado foi bem: 28 pontos de média no Ibope (na Grande São Paulo), mas perdeu público durante a semana. A edição compacta, antes de Malhação, tem registrado por volta de 20 pontos de média. O similar do Fama no SBT, o Popstars, se saiu pior: 13 pontos de média no Ibope na estréia.

Os programas são basicamente os mesmos. Um grupo busca o estrelato por meio do talento musical. Os aspirantes à fama da Globo exibem seus dotes individualmente e as adolescentes do SBT tentam montar uma banda, que vai tornar-se profissional quando Popstars sair do ar. A diferença, como sempre, está no estilo. Um é rico, o outro, pobre.

O desejo de sair do anonimato é tão grande que as duas emissoras se surpreenderam com o número de candidatos. Foram milhares de jovens que atenderam ao chamado. Trinta mil garotas inscreveram-se no SBT e a Globo recebeu quase 800 fitas com as performances dos candidatos.

Tem algo mais a ver com essa afluência. Todo mundo sabe que musicalmente há muita gente boa no Brasil, mas esse pessoal até então não tinha um canal para mostrar o que sabia.

Essa turma deve agradecer, portanto, a Raul Gil que mostrou ser mais macaco velho do que talvez ele mesmo pudesse supor. Ao usar a experiência em seu próprio favor, revigorou um gênero que muita gente pensou estar morto."