Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Jornalista continua ameaçada de morte

‘Minha estimada Lydia Cacho: prepare-se, pois em breve você aparecerá degolada, sua cabeça tão bonita será deixada do lado de fora de seu apartamento, vamos ver se você é mesmo tão valente…’

A mensagem, postada no blog da jornalista e escritora mexicana no último l9 de maio, obviamente não precisaria, para quem acompanha de perto o drama de Lydia, dentro e fora do México, de maiores explicações.

Diante da gravidade do caso, porém, é justo e saudável insistir na denúncia dos fatos em nome da liberdade de expressão, artigo cada vez mais escasso no nosso continente.

Trata-se de mais um episódio da sequência de horrores, ameaças de morte incluídas, que Lydia Cacho, forjada na luta pelos direitos de mulheres e crianças e ativista em várias outras causas de natureza social, enfrenta desde que escreveu e publicou, há quatro anos, o livro Los demonios del Éden.

Nesse livro, de conteúdo explosivo, ela denunciava, com fatos, depoimentos e nomes bem investigados e fundamentados, as barbaridades perpetradas por uma rede de pedofilia e prostituição infantil – negócio altamente rendoso dirigido por dois empresários de origem libanesa e muito procurado por turistas estrangeiros em viagem ao México.

As chateações de ir em cana

Publicado o livro, Lydia, 46 anos, hoje colunista de prestígio do jornal mexicano El Universal, profissional muito premiada dentro e fora de seu país, passou a sofrer, além dos insultos por telefone, internet e bilhetes, repetidos sustos e perseguições nas ruas do badalado balneário de Cancún, onde mora.

Vizinhos, por exemplo, têm observado como, à luz do dia, um homem armado vem fotografando e monitorando de dentro de um carro a casa da jornalista e seu automóvel, sem nenhuma providência da polícia local.

Não satisfeitos com isso, os empresários, poderosos e com ‘muy amigas’ ligações lá em cima, já haviam acusado Lydia de difamação e ela foi presa por algumas horas, suportando, indefesa e apavorada, vexames e maus tratos dos policiais. Solta, ouviu mais tarde, perplexa, ao fazer sua reclamação judicial, um juiz afirmar que as agressões por ela sofridas eram ‘moléstias inerentes a qualquer detenção’.

Oficio de morte

Lydia, contudo, não tem estado sozinha nessa briga com delinquentes de alto coturno, não só os dois empresários como figuras de peso da política mexicana.

Tanto a Comissão de Direitos Humanos do Distrito Federal do México como a Anistia Internacional têm exigido que as autoridades garantam a segurança e a integridade da jornalista, além de investigar, à exaustão, a origem das ameaças.

A própria Lydia, embora angustiada com a segurança pessoal mas firme em sua campanha contra a pornografia infantil tem, também de forma incansável, desafiado o sistema ao prestar queixas constantes às autoridades e processar o governo por conta das agressões físicas e verbais sofridas. Quando convidada, não hesita em expor sua situação em foros internacionais.

Mas esse tipo de briga, um cidadão contra os poderes constituídos, sobretudo uma jornalista, segue um lento e arrastado processo dentro dos sistemas policial e judiciário do México – em não poucos casos no mínimo omissos em relação às violências, com muitos assassinatos no caminho, contra os profissionais de imprensa.

Pouco ou nada a estranhar portanto, nesse quadro sinistro, que o México seja hoje um dos países mais perigosos para os praticantes do oficio jornalístico.

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Jornalista e escritor, ex-correspondente de Veja no México e América Central