REVISTA ZERO
Fabio Leon Moreira (*)
Os puristas que me perdoem. Sei que a crítica de uma publicação recém-criada, ainda em estágio de formatação de seu público-alvo, idealizada por jornalistas pouco conhecidos da grande mídia impressa e desprovida da bênção de grandes esquemas financeiros, pode soar como exercício covarde de pedantismo. Porém, se tal lançamento foi anunciado aos quatro ventos pela imprensa underground como um sopro de vitalidade e resistência à conformidade reinante, e que corre o risco de se transformar, na melhor das hipóteses, em um pequeno furacão editorial enquanto durar o fôlego de suas futuras edições, então uma avaliação à primeira vista pode ser feita à altura, sem machucar. É o caso do nascimento da revista Zero.
Com a morte da Showbizz restaram poucas opções de qualidade da literatura periódica sobre música e comportamento. Excetuando-se alguns raros exemplos, como Rock Press, Internacional Magazine e Rock Brigade, poucas realmente conseguiram tratar com a devida profundidade temas que sempre foram primordiais no universo juvenil. As matérias sobre o ídolo teen do momento costumavam ser de um primarismo atroz. Os textos eram contaminados pelas gírias das tribos urbanas, numa fracassada tentativa de aproximação. Hoje em dia, isso não faz muita diferença, já que o empobrecimento intelectual evoluiu e a ousadia das redações ficou restrita a alguns artigos.
Tanto que Zero se permitiu utilizar algumas dessas referências coloquiais. Mas como os tempos são outros, isso não chega a ofender a inteligência alheia. Em nada diminui a expectativa de encontrar seu especo no mercado. Pelo menos a princípio, há objetividade e fidelidade em suas propostas de diferenciação das outras revistas. Só o fato de aceitarem a colaboração de leitores com textos ou fotos (inspiração buscada no OI?) já é um indicativo. O editorial remete a um anarquismo empreendedor (?) claramente focado na abordagem de temas que provocam na imprensa convencional uma cegueira patológica (ou não?).
Sobriedade e experiências lisérgicas
Livros, personalidades, filmes, CDs. Tudo que a consagração das massas ainda não premiou ou premiou com uma curiosidade efêmera é a essência que vai nortear as páginas de Zero. As reuniões de pauta, supõe-se, deverão resultar na descoberta de preciosidades como a entrevista interessante e inusitada feita com o cantor Nahim (lembram dele?), que remonta todo o quebra-cabeça de uma injustiça cometida contra o artista na antiga versão do programa Qual é a Música do SBT (a tramóia revelada por Nahim provoca risos nervosos de indignação). Se as entrevistas tiverem o quilate desta primeira, já vale o dinheiro cobrado.
Mas a atitude "rock" tão bradada no mesmo editorial turva-se de imediato quando resolvem fazer uma reportagem sobre a volta da banda RPM. A independência deu lugar a um marasmo repetitivo, pois nove em cada 10 revistas do gênero já deveriam ter se posicionado como arautos do retorno triunfante de Paulo Ricardo e Cia.. Vai como sugestão um garimpo de tantas outras bandas que desapareceram ou que ensaiaram uma entrada pela porta da frente da fama: Tóquio, Ciclone, Erva Doce, Placa Luminosa, Suínos Tesudos, Funk Fuckers, Soutian Xiita etc. Lembrem-se do que o professor Lester Bangs, o lendário jornalista da Rolling Stone, ensinou. Autenticidade acima de tudo.
Porém, o diagnóstico de Zero é positivo. É uma publicação que busca identidade num filão considerado de difícil equilíbrio entre o público-leitor. A começar pelo seu "código genético", uma mistura próxima de Caros Amigos (pela diagramação dos textos) com revista MTV (pelo design gráfico moderninho). É uma revista séria para adolescentes (entre 16 e 28 anos, que fique bem claro) que gostam de consumir informações que traduzam o seu ponto de vista, um informativo com ares de fanzine, porém com a fina estampa que falta às Caprichos e Megazines da vida. Zero prima por textos repletos de estilo sarcástico, analíticos e autorais. Ponto para ela. Há sobriedade e experiências lisérgicas (no bom sentido) em seu contexto, um prato atrativo e facilmente digerível como o bom e velho xisbúrguer com refrigerante. Apresenta novidades e ao mesmo tempo nada de novo. Entre o título homônimo e o "10" com louvor, a revista é pródiga em boas intenções. E só. Vamos ver o que vem por aí.
(*) Jornalista