Saturday, 21 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Bola no nariz, entre focas e palhaços

DIPLOMA EM XEQUE

Mozahir Salomão (*)

Se a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), juntamente com as bases regionais, não agir rapidamente, em pouco, muito pouco tempo, as redações estarão vivendo situação similar à da década de 70, com a ampla substituição de jornalistas profissionais por pessoas não qualificadas. Agora, exatamente, a invasão das redações se dá por estudantes de Jornalismo ? um fenômeno que se alastra como uma praga, se pensados o descontrole e a irracionalidade das ações de algumas escolas que só visam o lucro imediato articuladas com empresas jornalísticas sem a menor preocupação com a produção competente e a ética da notícia. Quem é insano o bastante para ser contra o estágio? Não é disto que se está falando. Mas, convenhamos, que a demora dos próprios jornalistas em estabelecer uma definição para a questão deixou aberta enorme lacuna, que se transformou em espaço de puro abuso. Pior do que o estágio proibido é ver uma redação de focas prematuros e ilegais. E jornalistas cada vez mais sem emprego. Mais ainda: a notícia a mercê de tantos equívocos.

A situação é grave e requer ação imediata dos sindicatos. Em Belo Horizonte, cursos de Jornalismo firmam convênios com jornais e conseguem colocar numa mesma redação até duas dezenas de estudantes ? uma clara substituição de profissionais competentes por mão-de-obra desqualificada e barata. Para os jornais, menos gastos e profissionais exigindo o cumprimento de direitos trabalhistas. Para a escola, o marketing informal cuja imagem principal é de que tal curso "consegue" estágio para todos os alunos. Num país melhor, os estudantes seriam os primeiros a protestar contra essa maluquice.

Voluntarismo acrítico

É certo que a prevalência, ainda, da sentença da juíza federal Carla Rister sobre o fim da exigência do diploma lança dúvidas e incertezas sobre o poder e mesmo a eficácia das comissões de fiscalização dos sindicatos. Mais um motivo, entretanto, para os representantes da categoria abrirem logo o debate com as empresas e buscar garantias mínimas para a continuidade do exercício verdadeiramente profissional do jornalismo.

A revisão das determinações legais contra o estágio caminha a passos lentos. Até uma solução definitiva, valeria uma ação enérgica e imediata dos sindicatos. É preciso pressionar as empresas para a definição de percentuais máximos na relação jornalistas/estagiários. Até então, a representação sindical negou-se a conversar a respeito, alegando que o estágio em Jornalismo, na verdade, é proibido por lei. Deu no que deu. Estudante deve ser bem-vindo na redação em visita técnica ou no estágio supervisionado, em que, efetivamente, terá condições de aprendizado. Lotes de alunos desembarcando nas redações em estágios sem remuneração e sem acompanhamento acadêmico-profissional, gerando desemprego entre jornalistas, é a visão do inferno.

Repórteres, redatores e editores estão passando a bola. Retirados de seus postos de trabalho, vêem longos e bons anos de experiência serem trocados por um voluntarismo acrítico e despreparado. Só ganha aí a incompetência de quem acha que ganhar dinheiro no Jornalismo é economizar alguns reais no salário do apurador que, afinal, só fica mesmo telefonando para a polícia para saber "o que é que tem…" . E ganha também, claro, quem está transformando a educação em loja de departamentos ? sem trocadilhos, obviamente.

(*) Professor de Radiojornalismo na PUC-Minas e na UNI-BH