O POVO
"Entre judeus e palestinos", copyright O Povo, 19/5/02
"?Nos dias de hoje, cada homem de paz deve (…) fazer-se ouvir, protestar contra os crimes de guerra cometidos por ambas as partes, (…) demonstrar, persuadir, escrever, debater, buscar apoio para uma solução de meio-termo razoável…?, Amos Oz, escritor israelense em artigo sobre a questão Israel-Palestina no dia 21 de abril, na Folha de S. Paulo.
Os leitores lerão hoje e, no próximo domingo, o resultado de um debate interno já dura mais de um mês. No centro dessa discussão está a forma como O Povo, em seus editorais, tem defendido a causa do povo palestino. A provocação tem sido feita por um leitor judeu que acompanha o noticiário sobre a crise que envolve Israel e os palestinos. Desde o final de março último os ânimos no Oriente Médio ficaram mais acirrados a partir da ocupação da Cisjordânia por forças do Exército de Israel e que teve como ponto crítico o confinamento do líder palestino Yasser Arafat, em seu quartel general, na cidade de Ramallah.
Antes, preciso detalhar um pouco como o assunto foi sendo discutido internamente:
1. O tema entrou em pauta em duas reuniões das quais participei na Redação com um grupo de editores. Os encontros aconteceram no final de abril e na segunda-feira passada;
2. Além das discussões internas onde foram apresentados os posicionamentos do leitor quanto a opinião expressa em editorial, conversei algumas vezes com o editorialista responsável por telefone ou e-mail; enviei à Redação reclamações específicas que envolviam charge, legendas de fotos e informações apontadas como errôneas, do ponto de vista histórico, em matéria editorial. Nesta última ? um erro num quadro ? foi feito o erramos.
3. Decidi tornar o debate público por causa da importância da reclamação do leitor que passou a considerar o editorial do O Povo anti-semita, assim como seu editorialista.
4. Considero a acusação muito grave. Anti-semitismo é a prática de preconceito contra judeus, que defende o aniquilamento do estado de Israel e isso dá margem a todo tipo de violência contra uma nação e seu povo. Não é admissível para um jornal que defende ? nesses mesmos editoriais ? causas como o aperfeiçoamento da prática democrática no Brasil e no mundo, a liberdade, a não violência, a convivência pacífica e o respeito entre os povos.
5. Disse ao leitor judeu que rejeito tal afirmação, embora admita que, algumas vezes, o editorial do O Povo deixou dúvidas quanto a informações. Também concordo com o leitor que o silêncio editorial do jornal no último atentado que matou 15 israelenses e deixou 60 feridos é emblemático. A maior queixa do leitor é que O Povo também silenciou sobre os atentados que antecederam a operação israelense, mas reagiu ?rapidamente e com indignação? contra a operação em território palestino.
6. Gostaria de deixar claro ainda que o editorial de um jornal é a expressão do pensamento da empresa diante de um fato. É um direito do veículo. É essencialmente opinativo. Mas é passível de crítica. No caso do O Povo essa crítica é estimulada pelo próprio jornal quando sugere isso no final de cada texto.
7. Nesta semana enviei ao editorialista perguntas e questionamentos feitos pelo leitor judeu e por mim sobre a questão. Parte das respostas estará a seguir, por tema tratado.
Israel e Palestina no editorial
Editorialista ? ?O Povo faz uma distinção de princípio entre agressor e agredido, entre a vítima de uma injustiça e o que a comete. (Não se trata de criar um Estado Palestino dentro do território israelense. O Estado de Israel é que foi criado no território da antiga Palestina). Não considera agredido e agressor equivalentes. Na questão do Oriente Médio nossa posição é a de que Israel é o agressor e os palestinos são os agredidos, esse é o nosso referencial originário, que embasa toda a posição do jornal. Isso não significa aprovação a todas as respostas dadas pelo agredido, nem engajamento com suas posições políticas. Temo-nos regido pelos princípios do Direito Internacional e a defesa das resoluções da ONU e dos protocolos internacionais firmados pelos Estados soberanos. Sempre consideramos, em nossos editoriais que o terrorismo é inaceitável sob qualquer pretexto, nada justifica a morte de inocentes. Mas, consideramos um agravante o terrorismo realizado por um Estado. Mais ainda, quando esse Estado se apresenta como uma democracia representativa. Também temos sempre acentuado que uma base firme para a paz na região é não apenas a criação do Estado da Palestina, mas, o reconhecimento pelos árabes (não só os palestinos) do Estado de Israel e o fornecimento de garantias para sua existência?.
Falta de clareza x Jenin
Editorialista ? ?Devo-lhe dizer que o editorialista dispõe de um suporte tecnológico (Internet e TV a cabo) que lhe permite ter acesso não só a imprensa escrita, nacional e internacional, mas acompanha ao vivo noticiários de TV na França, Itália, Inglaterra, Portugal, EUA e Alemanha (versão espanhola), assim como debates sobre questões fundamentais. Quanto ao caso de Jenin nós dissemos que existiam acusações na imprensa internacional sobre a existência de massacre. Suspeita que ganhava reforço com a atitude de Israel de impedir que a imprensa tivesse acesso ao local. A própria Globo teve uma equipe ameaçada (e por pouco seus componentes não foram mortos por tiros disparados por soldados israelenses) por tentar acessar o local. O mais grave, porém, foi a recusa de Israel a permitir que uma Comissão formada pela ONU realizasse investigações em Jenin para tirar as dúvidas.?
Silêncio e atentado
Editorialista ? ?O Povo não tratou da questão porque considerou mais importante discutir outro assunto, no dia (do atentado palestino contra os israelenses): ?O Censo do IBGE? e, no outro dia, a Crise na Justiça cearense. Tratava-se de mais um atentado. O jornal não abordaria a questão simplesmente para passar a impressão de que é isento na questão palestino-israelense. A nossa condenação aos atos terroristas tem sempre estado presente nos editoriais do jornal e isso não pode ser posto em dúvida.?
8. Por absoluta incompatibilidade de espaço tive de editar as perguntas e respostas, dividi-las em duas colunas, ficando a conclusão do comentário para a semana que vem."