FOLHA DE S. PAULO
"Batendo cabeças", copyright Folha de S. Paulo, 26/5/02
"Se o enredo da novela da indicação do vice na chapa do presidenciável José Serra já era complicado, a Folha conseguiu se enrolar ainda mais ao noticiar o seu desfecho, a saber, como Rita Camata (PMDB-ES) foi escolhida para a vaga.
Entre quarta-feira e sexta-feira, os leitores foram presenteados com versões nitidamente contraditórias.
A coluna Painel sustentou que os marqueteiros do pré-candidato do PSDB tinham clara posição a favor da deputada peemedebista, em detrimento do senador Pedro Simon (PMDB-RS). Já as reportagens mostravam um Nizan Guanaes (o principal marqueteiro) ?em cima do muro?.
Apontei a existência dessa confusão em críticas internas desde a quarta-feira. A crítica de quinta, após registrar que ?mais uma vez batem cabeça o Painel e textos de reportagem?, indagava: ?em quem o leitor deve acreditar??
Apesar disso, a incongruência prosseguiu na sexta-feira, quando o Painel abandonou a ?polêmica? e uma reportagem três páginas adiante trouxe uma terceira versão: os marqueteiros, na verdade, tinham ?fechado? preferência por Simon.
Como se não bastasse, na mesma edição a coluna Janio de Freitas, neste caso dando a fonte (Michel Temer, presidente do PMDB), adotava linha oposta: Rita foi escolha de Guanaes.
Até o fechamento desta coluna, ontem, a solução estava no ar-e o leitor, na mão.
Independentemente dos aspectos políticos envolvidos e de qual ?linha? está correta, o fato é que a Folha não é -ou não deveria ser- uma federação de repórteres, cada qual atirando para um lado, competindo publicamente, nas páginas do jornal, com versões excludentes.
Não se fala aqui de opiniões ou pluralismo, mas de fatos.
Qualquer leitor teria o direito de supor que alguém errou na apuração da notícia, seja por não atualizá-la entre um dia e o outro, seja por não cumprir, eventualmente, uma das regras básicas da investigação jornalística: o cruzamento de informações entre diferentes fontes. Numa hipótese mais otimista, teria ocorrido ?apenas? uma falha de comunicação interna.
A persistência da desarmonia, porém, leva a uma dúvida ainda mais problemática: não refletiria, esse desencontro, uma vulnerabilidade do jornal a influências de interesses desse ou daquele lado?
Qualquer que seja a explicação -e ela pode ser o somatório disso tudo-, o leitor, neste caso, só teve a perder."
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"Um alerta", copyright Folha de S.Paulo, 26/5/02
"Na semana que passou, os marqueteiros do PT puderam respirar aliviados, ao menos quanto à Folha. Fatos bastante incômodos surgiram envolvendo o partido, mas o jornal, em muitos casos, tratou-os com bem menos relevância do que mereciam.
Na sexta-feira 18, a Folha levou um furo do ?Estado de S.Paulo?, que noticiou o deslocamento para publicidade de dinheiro que deveria pagar programas sociais da prefeitura paulistana.
Ao recuperar o tema sábado, o jornal adicionou uma revelação: teria havido desvio para publicidade também de verba da saúde, desde 2001. Apesar de estarmos em ano eleitoral, numa campanha em que a publicidade ocupa papel, como se sabe, primordial, optou-se, no entanto, por não dar a informação na capa, que é a vitrine do jornal.
Notícia divulgada por Elio Gaspari no domingo sobre uma licitação problemática em Ribeirão Preto (administrada pelo coordenador do programa de governo de Lula) também ficou só em página interna.
Na quarta, só uma pequenina matéria saiu sobre tema que foi manchete da terça no ?Correio Braziliense?: acusações de desvio de dinheiro de entidade sindical do DF, em 98, para campanhas eleitorais, inclusive do PT.
Na quinta, o secretário João Sayad (Finanças) admitiu ?erro formal? da prefeitura no lançamento de gastos com publicidade; o assunto, grave, tampouco ganhou espaço na capa.
Veio a sexta, e jornais concorrentes publicaram uma frase curiosa de Marta Suplicy: ?A parte jurídica é o de menos?, disse a prefeita, expondo uma formulação reveladora, vinda da autoridade que comanda a principal administração do PT, vitrine mais exposta do partido cujo pré-candidato encabeça todas as pesquisas de intenção de voto.
A secretária de Redação Paula Cesarino Costa afirma que não houve chamada sábado porque, em que pese o ?mérito? da reportagem, ?segundo a apuração da Folha até aquele momento, não havia consenso entre especialistas de que o procedimento da prefeitura era irregular?; além disso, ?o valor em questão não chegava a ser expressivo?.
No caso do ?erro formal?, diz a jornalista, ?optamos por manter a mesma postura em relação ao tema?. Ela argumenta que o que Sayad admitiu foi um erro de caráter ?formal? e que o secretário defendeu o destino dado à verba. Ademais, ?até aquele momento, não dispúnhamos de elementos para dimensionar a real possibilidade de haver um processo de improbidade administrativa contra a prefeitura?. A opção foi priorizar outras chamadas.
Sobre a frase de Marta, só não saiu por ?descuido da edição?.
Seria leviano, aqui, dizer que o jornal resolveu ?dar moleza? ao PT na campanha eleitoral em pleno curso. Diante da importância dos fatos surgidos na semana, porém, não parece equivocado considerar que ele, objetivamente, acabou ficando perto disso. Vale como alerta.
A Folha precisa definir melhor o que quer no noticiário eleitoral. Entre o marketing e a vida concreta, entre questões de programa ou propostas e a retórica pura, onde está o equilíbrio? Como e o que priorizar?
Sobre o PT, tema desta coluna: diferentemente de campanhas anteriores, o partido controla cidades e Estados de imenso peso político e econômico, com as possibilidades positivas e os riscos que isso implica. É esse o PT real, não o de Duda Mendonça."
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"Desconfiança", copyright Folha de S.Paulo, 26/5/02
"?Toda terça, quarta e sexta jogo na Quina, Dupla Sena, Lotomania e Mega Sena e confiro os resultados pela Folha. Hoje constatei ter feito um Terno. Quando fui à lotérica receber, vi que a Folha publicara o resultado errado. Fiquei totalmente decepcionado com esse jornal pela falta de atenção.?
?Sempre pensei que ele fosse confiável. Hoje, fiquei muito aborrecida com a Folha.?
Na primeira queixa, um leitor se refere a resultados lotéricos errados publicados quarta-feira. A segunda crítica é ao Guia da Folha (roteiro semanal que acompanha a edição SP) da primeira semana de maio, que incluía um restaurante há meses fechado. Os dois casos receberam ?Erramos?.
Segundo a Redação, o primeiro derivou de uma pane no computador usado para compor a tabela, pane que, apesar de atualização feita pelo digitador e de checagem dessa atualização, gerou a reprodução de resultados de uma edição antiga.
Sobre o segundo, passou despercebido por um redator que não era o ?titular? do assunto.
Aceitáveis ou não, explicações existem e merecem divulgação. Mas é difícil acreditar que elas possam restaurar, ao menos de imediato, o laçccedil;o de confiança que foi rompido."