Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O Estado de S. Paulo

TIM LOPES, ASSASSINADO

"?Elias Maluco? é suspeito de crime contra jornalista", copyright O Estado de S. Paulo, 5/06/02

"O titular da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), delegado Luiz Alberto Andrade, afirmou ontem que o traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, líder do Comando Vermelho mais procurado pela polícia, é o principal suspeito pelo desaparecimento do repórter da Rede Globo Tim Lopes, de 51 anos. Lopes foi visto pela última vez no domingo, quando foi sozinho à Favela Vila Cruzeiro, na Penha, zona norte da cidade. Com uma microcâmera, ele pretendia fazer uma reportagem sobre bailes funk promovidos por traficantes do morro.?Só pode ter sido o Elias Maluco?, disse o delegado. Ontem, policiais fizeram incursões na favela.

Há mais de uma versão para o desaparecimento do repórter. Segundo Andrade, informantes disseram que o chefe da boca-de-fumo do morro teria desconfiado de Lopes e mandado revistá-lo. Ao encontrar a microcâmera escondida, diz o delegado, ligou para Elias Maluco, que controla o tráfico na favela e teria ordenado a morte do repórter. Já o inspetor Daniel Gomes, da 22.? Delegacia de Polícia, disse que Lopes teria sido confundido com um policial. Há outra versão, segundo a qual ele teria sido delatado por policiais militares.

O delegado da 22.? DP, Sérgio Falante, encaminhou ontem, para exame de DNA, fragmentos de um corpo carbonizado que foram encontrados na segunda-feira. O resultado deve sair em uma semana. ?Depois da primeira filmagem, os traficantes ficaram de antena ligada?, disse Andrade, referindo-se à série de reportagens Feira das Drogas, produzida por Lopes e exibida em agosto no Jornal Nacional, que recebeu o Prêmio Esso de Telejornalismo.

Protesto – Ontem, a Rede Globo emitiu um comunicado, pedindo que a população colabore com informações, por meio dos telefones da Polícia Civil (0xx21-3399-1089) ou do Disque- Denúncia (0xx21-2253-1177). O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) divulgaram nota na qual protestam contra o ?regime de terror que transformou em reféns todos os moradores da cidade, comprometendo o direito de ir e vir?. A organização Repórteres Sem Fronteiras, que defende a liberdade de imprensa no mundo todo, também manifestou sua preocupação numa nota.

A jornalista Cristina Guimarães, que co-produziu a reportagem Feira de Drogas, recebeu uma série de ameaças e teve de fugir do Estado. Em entrevistas concedidas em janeiro, ela contou que, em setembro do ano passado, foi avisada por funcionários da Globo que moram na Rocinha de que ela estava jurada de morte. A recompensa a quem a matasse seria de R$ 20 mil.

Com o intuito de deixar o País sob proteção da Anistia Internacional, a jornalista procurou a advogada Cristina Leonardo, de uma ONG, para que ela fizesse o contato com a entidade. Hoje, o paradeiro de Cristina é desconhecido. Procurada pelo Estado, a advogada não foi encontrada."

 

"ANJ vê ameaça à liberdade de expressão", copyright Folha de S. Paulo, 6/06/02

"Leia a íntegra da nota divulgada pela Associação Nacional de Jornais, assinada por Francisco Mesquita Neto, presidente, e Mário Gusmão, vice-presidente, responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão.

?A Associação Nacional de Jornais (ANJ) manifesta sua preocupação com o desaparecimento, desde o último domingo, do repórter Tim Lopes, da TV Globo. O jornalista realizava uma reportagem sobre bailes funks nos subúrbios do Rio de Janeiro.

Tim Lopes esteve no local em que se realizavam esses bailes por quatro vezes. A última delas foi no domingo, dia 2 de junho. Às 22h desse dia, deixou de ir ao encontro do motorista que o acompanhava e que estacionara longe da área em que fazia seu trabalho, e não mais apareceu. A emissora comunicou o seu desaparecimento às autoridades.

Trata-se de fato extremamente grave. Reflete a falta de garantias para que um profissional da imprensa desempenhe suas funções.

A existência de condições de segurança para o exercício profissional constitui um requisito para a liberdade de expressão. Não havendo essas condições, cerceia-se o direito de informar e de ser informado, previsto pela Constituição brasileira. A garantia de plena segurança constitui também um direito do cidadão e um dever do Estado.

A Associação Nacional de Jornais (ANJ), assim como seus afiliados, acompanha atentamente as investigações a respeito do caso e se preocupa com a integridade física do jornalista Tim Lopes, bem como a de todos os jornalistas brasileiros.?"

 

"Tim Lopes, repórter da Globo, está desaparecido", copyright Comunique-se, 3/6/02

O repórter Tim Lopes, da TV Globo, está desaparecido desde domingo (02/06), quando fazia matéria sobre um baile funk na favela de Vila Cruzeiro, na Penha. Segundo denúncias, os traficantes, que promoviam o baile, aliciam meninas menores de idade.

Segundo comunicado da Globo à imprensa, Lopes ficou de se encontrar com o motorista da emissora às 20h. Apareceu e pediu que ele o esperasse mais um pouco. Depois, desapareceu.

Um corpo carbonizado foi encontrado pela polícia, junto a fragmentos de fita de vídeo. O Instituto Carlos Éboli está fazendo a perícia.

Leia abaixo o comunicado oficial da Globo:

?A TV Globo comunica que está desaparecido desde ontem, quando realizava uma reportagem sobre bailes funks nos subúrbios do Rio de Janeiro, o repórter Tim Lopes, um de seus jornalistas mais premiados. Há duas semanas, moradores do bairro da Penha denunciaram a existência de um baile funk, com consumo de drogas e sexo explícito, na favela de Vila Cruzeiro, promovido por traficantes do morro, para o qual eram aliciadas meninas menores de idade. Os traficantes armavam um pequeno parque de diversões próximo à entrada da favela para atrair crianças e, assim, evitar que policiais entrassem atirando no caso de invasão do morro. O fato teria sido também denunciado à polícia diversas vezes.

Os moradores disseram a Tim Lopes que temiam pela degradação moral de suas famílias e se disseram impotentes diante do poder armado dos traficantes e da falta de ação da polícia. Eles se dispuseram a ajudar o repórter, para que ele pudesse registrar os excessos praticados pelos traficantes e o poderio bélico deles. Tim esteve na região quatro vezes, duas sem micro-câmeras e duas com o aparelho, a últimas delas no domingo, dia 02.

Ontem, Tim ficou de encontrar-se às 20h com o motorista que o acompanhava e que estacionara longe da favela. Mas, àquela hora, apareceu e disse ao motorista que iria se atrasar porque ainda não considerava encerrado o seu trabalho. Marcou novo encontro para às 22h, mas não mais apareceu. Hoje cedo, a emissora comunicou o seu desaparecimento às autoridades. No meio da tarde, uma equipe de policiais encontrou, no alto do morro, um corpo carbonizado ao lado de fragmentos de fita de oito milímetros (não usada em micro-câmeras).

Ainda não há qualquer confirmação de que o corpo seja do jornalista e todos nós, seus companheiros de trabalho, torcemos do fundo de nossos corações para que isto não aconteça. Neste momento, o corpo está sendo levado para o Instituto Carlos Éboli para que possa ser identificado. A TV Globo continuará dando todas as informações sobre o caso.

Central Globo de Comunicação

Rio de Janeiro, 03 de junho de 2002?"

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"?Onde está Tim Lopes?? mobiliza imprensa e políticos", copyright Comunique-se, 7/06/02

"Profissionais de imprensa, entidades representativas e políticos encontraram-se no início da tarde desta sexta-feira (07/06), na Cinelândia, no Rio, para pedir à polícia e ao governo mais rigor nas investigações do desaparecimento do repórter Tim Lopes, da TV Globo. O presidente do Sindicato dos Jornaistas Profissionais do Rio, Nassif Elias (foto ao lado), criticou duramente a governadora Benedita da Silva. ?Ela só se manifestou cinco dias depois de Lopes desaparecer?, disse, indignado. Em nome das entidades representativas, Elias pediu a mobilização de todas as polícias no caso.

Sobre a repressão dos traficantes e o caso do PCC, de São Paulo, de que teria como alvo dois jornalisas paulistas e um carioca, Elias acha inaceitável a intimidação. ?Em nossa profissão, a palavra medo não pode existir. Vamos continuar cobrindo o tráfico de qualquer maneira. Eles não vão nos calar e nos impedir de informar a população. A categoria não pode aceitar isso?.

O presidente do sindicato lembrou a tentativa da Fenaj, junto ao Ministério da Justiça, de fazer com que todos os crimes cometidos contra jornalistas sejam investigados pela Polícia Federal. ?A decisão do ministro ontem é um bom sinal?, falou, referindo-se às declarações de Miguel Reale Júnior sobre a PF já estar colaborando nas investigações.

Carlos Shröeder (foto ao lado), diretor de Jornalismo da TV Globo, concorda que a polícia vem colaborando, porém critica a lentidão na realização do teste de DNA do corpo carbonizado encontrado na favela de Vila Cruzeiro, na Penha. ?O exame só começou a ser feito ontem. Já pedimos que o laboratório se apresse. Queremos acabar logo com essa agonia?.

O colunista do jornal O Globo, Ancelmo Góis, que trabalhou com Lopes no Jornal do Brasil, lembra-se com carinho do colega: ?Sinto uma dor pessoal, por ser amigo dele, e coletiva, de ver o povo à mercê dos traficantes?.

Políticos como o deputado estadual Carlos Minc e o deputado federal Fernando Gabeira também participaram da manifestação. Minc definiu o poder do tráfico como uma ?doença urbana? e falou sobre o repórter desaparecido: ?Tim Lopes é um jornalista que sempre deu voz aos excluídos, que mostra o abuso das autoridades. Isso é a barbárie, é a negação da vida?.

Já Gabeira propôs a criação de um núcleo, onde haveria um intercâmbio de informações. ?Vocês que são jornalistas investigativos, vamos trocar constantemente informações sobre Tim Lopes. Essa é a maneira mais eficaz de combater o tráfico, pressionar o governo e sensibilizar a opinião pública?.

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"Assessor da Defensoria Pública acusa Globo de omissão", copyright Comunique-se, 7/6/02

"Durante manifestação ?Onde está Tim Lopes??, ocorrida nesta sexta-feira (07/06), no Rio, o assessor de imprensa da Defensoria Pública, Oswaldo Manesch, acusou a Rede Globo de não ter apoiado a jornalista Cristina Guimarães, autora da reportagem sobre a feira de drogas da Rocinha. Ela está escondida porque sofreu ameaças dos traficantes da favela. Manesch fez a mesma acusação no caso Tim Lopes, desaparecido desde o último domingo (02/06).

?Tim desapareceu às 20h. O motorista esperou por ele até meia noite. Só no final da manhã a emissora procurou a polícia. A Globo começou a enviar e-mails para os jornalistas às cinco e pouco?, disse, em tom de desaprovação.

Sobre Cristina, Manesch disse que a emissora arriscou a vida da jornalista. ?Mandaram-na voltar à Rocinha porque as imagens não ficaram boas. Depois que começou a receber ameaças, ela procurou a direção da Globo. Disseram a ela: ?não entra nessa onda?. Cristina não teve apoio da empresa?, afirma.

O assessor lembrou que o produtor do Esporte Espetacular, Carlos Alberto de Carvalho, foi seqüestrado por traficantes da Rocinha em frente à sede da Globo, no Jardim Botânico. ?Ele ficou dois dias sendo torturado para revelar o nome de Cristina. Mas o Carlos nem sabia quem era o autor das matérias sobre a feira de drogas. Os traficantes desistiram e deixaram-no ir embora?. Manesch tem uma cópia da ocorrência policial do produtor.

Ali Kamel, diretor geral de Jornalismo, tomou o microfone para responder a Manesch. Disse que, na época da matéria sobre o tráfico, conversou com todos os jornalistas da redação que sentavam próximos de Cristina. ?Ninguém sabia que ela estava sendo ameaçada. De repente, ela entrou com uma ação e mandou um e-mail com a petição enviada para o juiz, narrando as supostas ameaças?, respondeu. Ao falar com Comunique-se, Kamel repetiu o que havia dito na manifestação. ?Fico estarrecido ao saber que ela tenha sofrido ameaças e não tenha desabafado com o colega da mesa ao lado?. Sobre o caso de Carlos Alberto, disse: ?Não foi provado até hoje que tenha sido seqüestro. O inquérito foi apurado e em respeito à privacidade do Beto não vou comentar o caso?, finalizou."