O CLONE
"Números finais de ?O clone?", copyright Jornal do Brasil, 14/06/02
"A novela global O clone termina hoje não só como o recorde de audiência dos últimos seis anos, como também com números que deixariam qualquer autor de queixo caído. Com 47 pontos de média geral, a trama superou sucessos como Terra nostra (1998) e Laços de família (2000). Na última segunda, O clone alcançou média de 60 pontos e pico de 67. Mas nem só de audiência sobreviveu a história de Glória Perez. A novela abusou dos números. Só de bordões que caíram na boca do povo foram, pelo menos, 13.
O número de passagens de tempo também foi grande. Ocorreram ao menos seis. A primeira de destaque foi quando Maysa (Daniela Escobar) anunciou sua gravidez e Deusa (Adriana Lessa) fez inseminação. Dias depois, Mel (Débora Falabella) e Leo (Murilo Benício) tinham 2 anos. Daí para os 18 anos da viciada e do clone, foram mais quatro confusas passagens. As duas primeiras fases da trama demoraram tanto que Leo só apareceu adulto no capítulo 91.
O número de participações especiais é outra marca impressionante. Foram cerca de 85, entre atores, cantores, esportistas e apresentadores. ?Nunca se viu tanta participação em uma novela. No caso do bar da Jura, foi uma maneira que a autora encontrou de contar sua história unindo realidade e ficção?, diz Mauro Alencar, doutorando em telenovelas pela USP.
Raramente uma protagonista teve tantos candidatos aos seus pés como Jade (Giovanna Antonelli). ?O comum é existir um triângulo. Em Jogo da vida, lembro que a personagem da Glória Menezes tinha três pretendentes, o que já era muito?, diz Alencar. Para completar o balanço, pelo menos, dez atores do elenco de O clone ficaram doentes ou se acidentaram no trabalho. (Agência Folha)"
"Final feliz", copyright Folha de S. Paulo, 13/06/02
"Vai ao ar amanhã o último capítulo de ?O Clone?, da Globo, recorde de audiência dos últimos seis anos, quando a medição do Ibope passou aos moldes atuais.
Graças, principalmente, à grande repercussão da fase final de ?O Clone?, a média de audiência da Globo entre as 18h e as 24h subiu três pontos em maio, chegando a 38 (cada ponto equivale a 47 mil domicílios na Grande São Paulo).
A novela já está com média de 46 pontos no Ibope e atinge 65% das TVs ligadas no horário. Superou a polêmica ?Laços de Família?, que chegou a 45 pontos e 64% dos aparelho ligados.
No capítulo de segunda-feira, a trama das oito teve média de 60 pontos, ou seja, estava sintonizada em 2,82 milhões de domicílios na Grande São Paulo, 75% das casas com TV ligada no horário (veja número no quadro ao lado).
E o melodrama da autora Glória Perez, esticado em um mês pela Globo, não foi apenas o maior campeão no Ibope da ?Era Marluce? (Dias da Silva, diretora-geral). Foi o porto seguro da Globo quando a emissora sofreu um dos maiores baques de sua história: o fenômeno ?Casa dos Artistas?, que o SBT estreou de surpresa em 28 de outubro do ano passado, 27 dias após a estréia de ?O Clone?.
O forte impacto do ?reality show?, que deixou o ?Fantástico? em segundo lugar pela primeira vez, só não foi mais trágico porque ?O Clone?, mesmo no início, conseguia manter a audiência da Globo durante a semana.
Quando ?Casa 2? entrou no ar, em 17 de fevereiro, a novela, já com a história mais desenvolvida, derrubou a audiência do SBT durante a semana e, consequentemente, a dos domingos.
Drogas e Allah
Glória Perez estreou a trama dos muçulmanos menos de um mês após os atentados terroristas nos EUA, em 11 de setembro.
A mistura de drogas, clonagem e cultura árabe, que já era vista com desconfiança mesmo por alguns globais, passou a ser ainda mais questionada com o advento da guerra contra o terror. Alguns atores chegaram a recusar papéis.
Glória nega que houve problemas internos além dos que ?toda produção costuma enfrentar?. Acha que a pressão contrária à sua história veio de ?parte da imprensa?. ?Teve gente que chegou a dizer que eu ia fazer uma história exótica. Desde quando cultura muçulmana, clonagem e drogas são coisas exóticas? São temas mais do que atuais?, diz a autora.
A abordagem do problema com drogas, um dos principais motivos do bom desempenho da trama segundo pesquisa encomendada pela Globo, também foi uma das dificuldades para a autora.
Tabu para a TV, o assunto costumava ser evitado nas novelas. Quando retratado, só trazia o lado ruim. A novidade de ?O Clone? foi ter admitido que a droga também causa prazer ao usuário. A campanha de conscientização da novela, que usou depoimentos reais de usuários de drogas, rendeu prêmios à emissora.
Mel (Debora Falabella), a personagem viciada em cocaína, passou a dividir o papel de protagonista com a mocinha Jade (Giovanna Antonelli). De quatro capítulos da semana passada cronometrados pela Folha, Mel apareceu mais que Jade em dois (veja quadro ao lado). Glória diz que isso já era previsto desde o início.
Além das drogas e de outros elementos da história, a autora atribui o sucesso de ?O Clone? ?à paixão de toda a equipe?. ?Houve uma campanha orquestrada contra a novela. Mas Allah afastou tudo o que era ruim?, diz. Afastou mesmo. E ainda jogou a concorrência no mármore do inferno."
"Drama vai a novo território imaginário", copyright Folha de S. Paulo, 13/06/02
"Vai chegando ao fim o maior fenômeno de ibope televisivo dos últimos tempos. Os índices de audiência de ?O Clone? espicharam a novela e intimidaram a concorrência.
A novela não é sobre o Brasil, como já foi a tradição. Nem pretende abordar temas políticos convencionais. A atualidade dessa versão contemporânea do ?Sheik de Agadir?, dramalhão recheado de muitas lágrimas, testes de DNA, crises de identidade, romances instáveis, conquistou o público para um estranho território imaginário.
A ponte aérea entre Rio de Janeiro e Fez, no Marrocos, verossímil na geografia do mundo globalizado, gerou um universo fantasia, versão carioca da peculiaridade árabe, que combina a seminudez das bailarinas com uma heroína apaixonada e sofrida, que acaba tendo a seus pés um verdadeiro harém masculino.
Cenários e figurinos extravagantes e trama carregada de melodrama constituem a matéria corriqueira da novela -aquela que vem resumida, capítulo a capítulo, semanalmente nos cadernos especializados. Mas à parte a exibição exaustiva de dança do ventre e a abundância de amor que cerca Jade, o apelo do programa reside no que pouco aparece no feijão com arroz do folhetim eletrônico. O Bar da Jura se tornou palco de uma espécie de show de variedades, aberto à visita de talentos diversos, que incluem a última aparição pública de Sargentelli ou Ney Matogrosso em campanha de esclarecimento sobre a hanseníase.
Mas o que deu mesmo substância a essa versão extravagante do mundo árabe, oposta às imagens bélicas que abundam no noticiário, foi a campanha de descriminalização da droga empreendida pela novela. Depoimentos pesados de ex-usuários, gravados em primeiro plano recortado, editados de maneira a não revelar a face dos que relatam o sofrimento do vício, o esforço e o alívio da cura, em tom moral e pesado, explicitam a referência ao mundo exterior que o roteiro faz através do drama de personagens viciados como Mel e Lobato.
?O Clone? interveio na conjuntura, quase como um programa de prestação de serviço. Nana Caymmi, no capítulo da última terça-feira, foi contundente ao contar o caso de seu filho e pedir que a justiça saiba tratá-lo e que a polícia tenha respeito por algo que se caracteriza como doença.
A experiência de tecnologia médica, que dá título à novela, ficou em segundo plano. ?O Clone? explorou a vocação telerealidade do gênero, legitimou um drama que afeta as mais diferentes famílias e retirou a droga da esfera policial, na qual ela é usualmente tratada. Resta saber o que sobra de dramaturgia, assunto que talvez dê menos ibope."