Os jornais americanos acabam de perder mais uma batalha para as redes sociais, e o revés ocorreu num terreno especialmente crítico para a imprensa tradicional: a receita publicitária originada por campanhas eleitorais.
A ex-primeira dama e ex-secretária de Estado Hillary Clinton anunciou o lançamento de sua candidatura para as eleições presidenciais de 2016 em textos e imagens postadas primeiro em redes sociais virtuais como Facebook, Twitter, YouTube, Instagram e outras, na maior esnobada já feita aos jornais americanos por um aspirante à morar na Casa Branca.
A atitude de Hillary antecipou a tendência dos políticos candidatos a algum posto eletivo de buscarem um contato direto com os eleitores, deixando de lado o tradicional papel de intermediário na comunicação exercido há séculos pela imprensa.
Trata-se de uma estratégia de comunicação politica ainda pouco testada, embora o atual presidente norte-americano Barack Obama tenha sido um pioneiro no uso da internet como ferramenta eleitoral. A grande incógnita está na capacidade ou não de as redes sociais determinarem a agenda política num processo eleitoral. Até agora a imprensa, em especial os jornais e a televisão, era imbatível neste quesito.
O recurso de criar um atalho na relação com o eleitor não é apenas uma estratégia publicitária, mas cria também a possibilidade de uma redução do papel dos partidos tradicionais, já que os candidatos ficarão menos dependentes da burocracia partidária e também dos grandes financiadores de campanhas. Obama teve muito sucesso em compensar a ausência de doações milionárias, pelo varejo das minicontribuições de menos de 30 dólares. Até o surgimento da internet, as minidoações eram inviáveis pelo custo de administrar o sistema.
A nova tendência afeta também de forma considerável a posição dos jornais e telejornais em conjunturas eleitorais. Eles perdem força na hora de influenciar o eleitor e passam a ser o ambiente onde os políticos discutem entre si e protagonizam o tradicional show histriônico que garante audiências em alta na TV.
Mas os jornais não se tornarão descartáveis em matéria de campanha eleitoral se souberem aproveitar os nichos criados pela demanda de informações. O principal deles é o chamado fact checking, checagem de fatos, uma alternativa noticiosa mais ligada ao jornalismo investigativo e que tem mais afinidade com plataformas tecnológicas que privilegiem conteúdos analíticos, com é o caso do papel, ou versões digitais de publicações impressas.
O problema do fact checking é que ele sempre acaba associado a algum tipo de preferência do veículo por algum candidato. As escolhas dos temas a serem checados, os procedimentos de checagem e as conclusões dificilmente escapam da polêmica sobre posicionamento a favor ou contra algum candidato. Isto se torna especialmente crítico num ambiente em que a diversidade e complexidade informativa passam a ser um componente estrutural de campanhas eleitorais.
A corrida sucessória americana para 2016 ganha assim um atrativo capaz de compensar o progressivo desencanto dos eleitores com a disputa pela Casa Branca, um evento cuja cobertura alguns jornalistas já chegaram a comparar a uma corrida de cavalos. O interesse provavelmente virá não tanto das propostas dos candidatos, mas do seu comportamento nas redes sociais, um terreno reconhecidamente perigoso e implacável com políticos.
Estamos assistindo a uma mudança de comportamentos, rotinas e valores associados a processos eleitorais que inevitavelmente chegarão ao Brasil. É a internet e a digitalização provocando mudanças comportamentais que tendem a configurar um novo contexto social e politico. Ainda é prematuro dizer qual tendência politica, se conservadores ou progressistas, aproveitará melhor a nova conjuntura para obter benefícios eleitorais.
Hillary Clinton tenta herdar o legado de Barack Obama em matéria de uso da internet para conquistar votos e apoio financeiro para a campanha eleitoral democrata. A candidatura dela seria natimorta no sistema tradicional devido ao sólido machismo do establishment eleitoral norte-americano. Mas como a internet permitiu que Obama se tornasse o primeiro negro ocupar a Casa Branca ao capitalizar o voto das classes C,D e B, Hillary pode usar o mesmo recurso para ser a primeira mulher a ocupar o mesmo endereço.
A outra incógnita é saber como a imprensa norte-americana se comportará diante da mudança de estratégia eleitoral da ex-primeira dama norte-americana. A eleição de 2016 nos Estados Unidos não é apenas uma disputa entre candidatos e partidos. É também um dilema para a imprensa norte-americana que estará sendo acompanhado de perto pelos jornais do resto do mundo.