Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Há sempre um porém

É boa ou ruim?, essa decisão de Petrobras em criar seu próprio blog. A resposta, sem dúvida possível, sugere ser muito boa. Para a cidadania – permitindo que mais pessoas acessem mais informação. Para a democracia – que se reconhece quando uma empresa, do tamanho da Petrobras, assume o compromisso de prestar contas de seus atos ao indeterminado cidadão comum do povo. Assentado isso, o principal, vale a pena examinar algumas questões no entorno dessa decisão.


1. Ilegal não é, como sugerem alguns jornalistas. Nenhum tema da Cyberlaw mereceu mais páginas do que o Fair Use. Reduzido a seu núcleo conceitual, a proteção ao direito da propriedade intelectual – no caso, as perguntas dos jornais – se opera somente quando houver apropriação econômica por terceiros – no caso, a Petrobras. Como o acesso ao blog é público e gratuito, nenhuma irregularidade pois.


2. Deselegância é. A publicação das perguntas, sem ciência prévia dos perguntadores, é certamente prova de desapreço a jornais e jornalistas. Não propriamente pela utilização dessas perguntas, no blog, algo mesmo natural. Mas por não haver ciência prévia, nessa primeira utilização. Bastaria que a Petrobras avisasse, antes – ‘olha, daqui a 2 dias o blog estará no ar’, coisa assim, e nenhum problema haveria.


3. Os jornais dizem que ‘o blog quebrou a confidencialidade de perguntas enviadas’ à empresa. Quando nenhuma confidencialidade há, ou deveria haver, nesse tema. Essa confidencialidade, em países culturalmente maduros, protegem apenas a privacidade ou interesses coletivos – saúde, segurança pública, relação com países estrangeiros, fronteiras. Sem que se perceba como perguntar quantos funcionários trabalham, em um setor da empresa, possa ser confidencial. Ao contrário, essas perguntas deveriam ser berradas, aos ventos, para que todos as pudessem ouvir – se isso fosse possível, claro.


4. A ANJ diz ser ‘prática contrária os princípios universais da liberdade de imprensa’. Sem que se possa ver como, publicizar uma pergunta, possa ser algo contrário a qualquer liberdade. O que ofende o direito de informar é a censura, senhores. A romântica (se é que uma censura pode ser mesmo romântica), no tempo de sargentos nas redações, com suas tesouras; a econômica, de governos e anunciantes, com seus interesses (nem sempre meritórios); a política, protegendo parte de nossas elites; a ‘musa da autocensura’, como a ela se referia George Steiner.


Responde ou não responde


Assentado isso, de que é boa prática para a democracia, cabe agora perguntar se é também boa para a Petrobras. E a resposta, aqui também, é sim. Dá respeitabilidade à empresa. Mostra que, do alto de seu poder econômico, se preocupa em prestar contas ao público. Porém…


Há sempre um porém, à margem das melhores intenções. ‘Mas há sempre uma candeia/ Dentro da própria desgraça’, dizia Manoel Alegre contra Salazar. E esse porém, no caso, é: a Petrobras faz isso para ser respeitada?; ou tudo é só estratégia de marketing, às vésperas de uma CPI? Não há respostas prontas, para isso. E vale, nesse caso, testar; sendo, aos jornalistas que hoje reclamam, os melhores testadores.


Podem perguntar, por exemplo, quais são os diretores da Petrobras e de suas subsidiárias? Quantos são os quadros técnicos da empresa, que hoje ocupem esses cargos de direção? Quais os funcionários que, sem ser diretores, dirigem licitações? Quais partidos indicaram esses senhores e senhoras? Qual o montante, em reais, de licitações a cargo de cada um deles? Quantos desses contratos foram firmados com dispensa de licitações? Isso, ou o que mais quiserem perguntar.


E assim se resolve a questão; que, das duas, uma. Ou a Petrobras responde, e merece (continua a merecer) nosso respeito; ou a Petrobras não responde, ou responde só o que lhe interessar, e então esse blog é só perfumaria. Tornados então, sem efeito, todos os elogios antes à empresa aqui destinados. O futuro dirá.

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Advogado no Recife, PE