Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Veja

ELEIÇÕES 2006
Carta ao leitor

Do lado do Brasil

‘A charge do Jornal do Comércio, de Porto Alegre: substitua-se Lula por Collor e FHC e se perceberá o equívoco

A charge estampada acima foi publicada originalmente no Jornal do Comércio, de Porto Alegre. Piadas são só isso – piadas. É recomendável, portanto, não levá-las a sério, até por uma questão de manutenção do juízo. Mas a charge gaúcha, ao brincar com um ponto de vista equivocado e difundido entre as hostes petistas – o de que VEJA tem o objetivo de ‘perseguir’ o presidente Luiz Inácio Lula da Silva -, fornece uma boa oportunidade a esta revista. A oportunidade de explicar, mais uma vez, qual é o seu único e verdadeiro propósito. Para tanto, propomos ao leitor que, inicialmente, retroceda no tempo e substitua, na charge, a figura de Lula pela do ex-presidente Fernando Collor, forçado a renunciar depois que VEJA revelou o esquema de seu tesoureiro de campanha, PC Farias. Ou que, nesse mesmo exercício de imaginação, troque Lula por Fernando Henrique Cardoso, tantas vezes fulminado por reportagens de VEJA que mostravam mazelas ocorridas em sua administração. Chegamos ao ponto: embora os próprios criticados e denunciados possam se sentir pessoalmente ofendidos, e por extensão também seus partidários e admiradores, o fato é que VEJA não tem por objetivo fustigar ninguém. Sua história está aí para provar. A missão a que VEJA se propôs é a de fiscalizar todos aqueles que estão no poder, não importa a agremiação a que pertençam. Tarefa, aliás, que continuaremos a desempenhar, seja quem for o presidente eleito.

VEJA fiscaliza o poder – e denuncia os criminosos que lesam a pátria – a partir de um ideário sólido, imune às vicissitudes, e sobejamente legitimado por seus leitores e anunciantes desde que a revista foi criada, em 1968. Dele constam a defesa da democracia, da livre-iniciativa, da liberdade de expressão e opinião. Ao julgar na semana passada a improcedência de duas ações do PT contra VEJA, o Tribunal Superior Eleitoral deixou claro que a liberdade de imprensa ampara justamente o direito de opinião. Essa conquista da sociedade brasileira, concretizada em garantia constitucional, paira acima das circunstâncias e das conveniências políticas. Imprensa livre não é imprensa neutra. O lado de VEJA é do lado do Brasil.’

Diogo Mainardi

Thoreau contra o lulismo

‘O Brasil é ruim. Irá piorar.

Eu sempre acreditei nisso. Acredito cada vez mais. O Brasil já era ruim antes de Lula. Com ele ficou ainda pior. Ninguém conseguiu evidenciar nossa ruindade com tanta clareza quanto ele. E ninguém deu tanta garantia de que tudo iria piorar.

O homem certo para este momento é Henry David Thoreau. Leia Thoreau. Releia Thoreau. Declame Thoreau em voz alta. É o melhor remédio para todos aqueles que foram atropelados pelo lulismo triunfante.

Thoreau era um abolicionista americano. Ele rejeitava a escravidão embora a maioria dos eleitores de seu tempo a apoiasse. Em seu principal ensaio, Sobre o Dever da Desobediência Civil, ele argumentou que há algo superior à vontade da maioria: é a moral de cada um. ‘Minha única obrigação é fazer em todos os momentos o que considero certo.’

Mas recomendo Thoreau por outro motivo. Um motivo menor. Um motivo mais mesquinho. Recomendo-o apenas porque ele permite insultar pesadamente o eleitor mantendo uma certa pompa, um certo brilho. Thoreau disse: o eleitor é um cavalo. Ele disse também: o eleitor é um cachorro. Eu repito, citando Thoreau: o eleitor é um cavalo, o eleitor é um cachorro, o eleitor é um cavalo, o eleitor é um cachorro, o eleitor é um cavalo, o eleitor é um cachorro. Insulte o eleitor. Sem perder a pompa, sem perder o brilho.

Thoreau: Cavalo. Cachorro.

Thoreau defendeu o direito de repudiar a autoridade do governo. Eu sou o Thoreau dos pobres. O Thoreau bananeiro. Repudio a autoridade de Lula. Lula pode ser o seu presidente. Meu ele não é. Meu senso de moralidade é superior ao dele. Lula é o chefe de uma junta de golpistas. Referendá-lo significa referendar o golpismo. Cassei sua candidatura um ano e meio atrás. Unilateralmente. Ele que fique com seus doleiros, com seus laranjas, com seus lobistas, com seus assessores, com seus jornalistas, com seus mensaleiros, com seus filhos, com seus gorilas, com seus bicheiros.

A forma que Thoreau encontrou para repudiar a autoridade do governo foi simples e direta: recusou-se a pagar impostos por seis anos. Chegou a ser preso por causa disso. Só foi solto porque uma tia saldou seus débitos. A revolta fiscal é o melhor meio de protesto que há. Muito melhor do que passeata. Muito melhor do que comício. Quem gosta de muita gente aglomerada é lulista. Prefiro me reunir com meu contador em seu escritório mofado, arrumando maneiras mais eficientes para burlar o Fisco. Falta somente uma tia rica para me tirar da cadeia.

O lulismo precisa de dinheiro para funcionar. Dinheiro limpo e dinheiro sujo. Meu terceiro turno será combater a CPMF. Eu sei que é um combate pouco heróico. Mas alguém realmente esperaria gestos heróicos de mim? Abolindo a CPMF, sobrará menos dinheiro para financiar o golpismo lulista. E para comprar os eleitores.

Thoreau: Cavalo. Cachorro.’

Roberto Pompeu de Toledo

O Brasil continua

‘Bem, assim são as coisas. Agora devemos desarmar a árvore, Pôr a decoração de volta nas caixas de papelão

– Algumas quebraram – e levá-las para o sótão.

W.H. Auden,

Oratório de Natal

Bem, assim são as coisas. Tal qual no poema do inglês Auden, que celebra o fim do Natal, cumprimos mais uma etapa. A interminável temporada eleitoral terminou. Agora é recolher as faixas e os cartazes (felizmente menos numerosos que de outras vezes), ver mais cedo a novela, deixar de comer os dedos uns dos outros, tentar relaxar. O horário político, tão trapaceiro no épico desfile de obras quanto no lirismo rastaqüera das crianças sorridentes, estourando de tanta confiança no futuro, ficou para trás. Ficaram para trás os debates – ai, os debates! Aquelas vozes que já não se agüenta mais ouvir, as respostas que não respondem, as estocadas ensaiadas, os números que sufocam como um travesseiro na cara… Fixemo-nos no que esta campanha trouxe de bom – ela desmoralizou os debates. Nunca mais alguém em seu juízo dirá: ‘O que está faltando nesta campanha é debate’.

Façamos votos de que, com as faixas e os cartazes – e os bonés, e as camisetas, e os palanques nos quais gente com manchas de suor na camisa capricha no truque simplório de ritmar a voz como senha para desencadear os aplausos, e os cretinos em volta, como macaquinhos amestrados, obedecem e aplaudem -, também as altas doses de mentira e de meias verdades sejam recolhidas ao sótão, até a próxima temporada. Não façamos ilusão: a mentira e as meias verdades não serão eliminadas. Elas continuarão nossas companheiras de viagem, mesmo porque muitas vezes provocadas pelo fato de que nós, o eleitorado, não suportaríamos a verdade. (Como disse um governante europeu: ‘Todos nós sabemos o que devemos fazer. O que não sabemos é como ganhar as eleições depois’.) Mas podemos desejar mentiras e meias verdades melhores. Um pouco menos deslavadas, menos cínicas.

Já tivemos campanhas lamentáveis. Quase todas são um atentado à inteligência e ao bom gosto. Desta vez, porém, numa conjunção astral de rara infelicidade, tínhamos um candidato ébrio de soberba, prisioneiro do delírio de ter-se como o Predestinado, o Messias, contra o mestre-escola que aos domingos faz bico como sacristão. Ai!!! Dada a diferença nas preferências em favor de um sobre o outro nas pesquisas, prenunciava-se uma campanha morna. Mas – curiosa campanha, esta – a certa altura o caldo desandou, e a intolerância contaminou vastas fatias da população, dividiu o eleitorado em linhas nítidas de classe social e escolaridade, rachou o país em regiões e estados de preferências opostas.

Devagar com o andor. Assim como se impõe desarmar a árvore, depois do Natal, impõe-se desarmar os espíritos, cumprido este outro marco do calendário que são as eleições. A divisão é uma praga que leva as nações à perdição. Fidel Castro não se recuperou, quase cinqüenta anos passados, do erro de ter dividido o país. Contra ele e seu regime, aguardando a melhor oportunidade, velam inimigos sedentos de vingança. Hugo Chávez foi pela mesma trilha envenenada. Que neste período pós-eleitoral não se venha com a conversa do impeachment ou do ‘fora’ este ou aquele. Não há país que resista a um impeachment a cada temporada. Também não há vantagem, só mais uma manobra de quem cultiva o esporte do tiro no próprio pé, em destronar um presidente para criar a figura ainda mais poderosa do mártir.

Os perdedores devem se consolar com o pensamento de que os governos não podem ser tão diferentes uns dos outros. Fora do sistema não há salvação. Fora do sistema é condenar-se ao atraso, como Cuba ou Coréia do Norte, quando não à fome. Dadas as condicionantes, internas e externas, não sobra tanta margem de manobra. Fora do capitalismo não há salvação. Desejável é que o capitalismo seja temperado pelos ideais de justiça e eqüidade. E pronto. Eis no que se resumem as balizas entre as quais embicar o Estado, na presente quadra histórica. Esperar grandes transformações na passagem de um governo para outro é cair na mesma ilusão de imaginar, na noite do réveillon, que no ano que vem será tudo diferente.

Que o próximo governo não roube, ou roube menos. Que não atente contra esse bem precioso, embora negado pelos cegos e mal-intencionados, que é o estado de direito. E que nossos ouvidos sejam poupados (este é um pedido especial) da hórrida retórica do ‘jamais visto neste país’, ou ‘pela primeira vez em quinhentos anos’. O Brasil não está aí para ser inaugurado toda hora. Nenhum país está. Achar o contrário é fruto da ilusão, da ignorância ou da má-fé. Que sejamos poupados, inversamente, da idéia de que se avizinha o fim do mundo. Também não é assim tão fácil chegar ao fim. Apenas cumprimos um rito, como o do Natal, para o qual se arma a árvore, e depois se desarma, e no outro ano se arma de novo, e depois se desarma. O Brasil continua.’



TELEVISÃO
Marcelo Marthe

A praia dos mulherões

‘Duas das personagens mais vistosas da TV neste momento, Ana Hickmann e Daniella Cicarelli representam uma categoria peculiar nas emissoras brasileiras. Há pelo menos vinte anos, mulheres esculturais têm lugar cativo nos postos de apresentadora. Tornou-se praxe construir programas em torno de beldades antes mesmo que elas demonstrem qualquer outra credencial para o ramo. Existem casos como o de Maria Cândida, da Record, que conquistou um programa de entretenimento depois de uma trajetória no jornalismo. Mas desde Xuxa – cujo maior feito, na época em que virou apresentadora infantil, era ser ex-namorada de Pelé – isso não é o mais comum. São as ex-modelos e celebridades de diversos calibres que imperam. Aí se encaixam Adriane Galisteu e Luciana Gimenez. Bem como Ana e Daniella.

Ao apostarem numa apresentadora, as emissoras buscam um conjunto de qualidades. Espera-se que ela garanta aquilo que no jargão do marketing é chamado de ‘mídia espontânea’: a capacidade de atiçar a curiosidade e ganhar espaço nos meios de comunicação. Uma apresentadora bem-sucedida é também um ímã de negócios. Isso ocorre com Ana Hickmann na Record – ela ajudou a atrair anúncios de empresas que vão do mercado de beleza aos bancos para a revista matinal Hoje em Dia. As vantagens financeiras para as próprias apresentadoras são óbvias. A atração catapultou os negócios da gaúcha de 1,85 metro de altura (e seios assumidamente siliconados). Entre salário e merchandising, ela embolsa 150.000 reais por mês. Somando-se seus ganhos como garota-propaganda e com produtos que levam sua marca, fatura 6 milhões de reais por ano. E existe ainda aquela questão existencial. ‘Eu já estava ficando velha para a profissão de modelo. E virar apresentadora era menos complicado do que ser atriz’, diz Ana. ‘Quando vi que era só pegar o microfone e botar minha personalidade para fora, achei meu caminho’, diz Daniella, que comanda a gincana adolescente Beija Sapo, na MTV.

Um dos desafios das apresentadoras é se reciclar. Apegar-se a um nicho é arriscado. As apresentadoras de programas infantis dos anos 80 e 90 sofreram para encontrar um novo público à medida que envelheciam. Angélica e Eliana conseguiram a duras penas e Xuxa nunca chegou lá. Adriane Galisteu foi contratada pelo SBT para falar com todo tipo de espectador – mas só atinge um público ‘semidescolado’, para decepção de seu patrão, Silvio Santos. Daniella poderá se ver diante do mesmo dilema. Maior estrela da MTV, ela recentemente foi assediada pela Record, que lhe acenou com rendimentos de 150.000 reais mensais (duas vezes e meia o que embolsa hoje). Mas as duas partes não chegaram a um acordo. Daniella tem enorme empatia com os adolescentes. Mas, por enquanto, só com eles.

A falta de ‘densidade’ é outro problema. Luciana Gimenez está aí para provar que é possível triunfar sendo desmiolada. Mas os tropeços no português e os brancos durante entrevistas são uma pedra no caminho de Ana Hickmann. Num programa, ficou confusa quando o colega Britto Jr. perguntou se iria declinar seu voto para presidente no ar. Ana assustou-se com o verbo ‘declinar’. ‘Como?’, perguntou. Em outra gravação, chamou a ave calopsita de ‘calopsítona’. ‘Ela é talentosa. Mas ainda falta desenvolver uns 40% de seu potencial’, diz um diretor da Record.

Há, por fim, a questão da imagem. Recentemente, Daniella foi flagrada por um paparazzo em peripécias carnais numa praia espanhola. A polêmica não abalou sua ‘moral’ com seu público. Tanto que a MTV nem ligou. Mas, no ano passado, o casamento-relâmpago (e conturbado) com o jogador de futebol Ronaldo fez com que perdesse contratos de publicidade. Nesse mesmo quesito, Ana vai bem, obrigado. Seu zelo é tanto que ela não revela em público que fuma nem aparece em fotos com o marido, Alexandre Correa – que também é seu agente (em tempo: Ana tem 25 anos, e é casada desde os 17). ‘Aprendi com o empresário do (ator americano) George Clooney que, para sua mulher triunfar como celebridade, você não pode estar à frente nem ao lado dela, mas sempre atrás’, ensina o maridão.

DANIELLA CICARELLI

Programa: Beija Sapo, gincana de namoro entre adolescentes da MTV

Audiência: 2 pontos

Negócios: embolsa 60 000 reais por mês entre salário e merchandising. O cachê em campanhas de propaganda pode ultrapassar 500 000 reais

Os trunfos

• Sabe falar com os jovens

• Tem personalidade forte: não teme a celebridade nem as polêmicas que a acompanham

Os desafios

• Manter o equilíbrio entre uma carreira saudável e uma vida muito agitada

• Uma carreira voltada aos jovens tem prazo de validade. Ela precisa descobrir como ampliar seu público

ANA HICKMANN

Programa: Hoje em Dia, atração matinal da Record que mistura notícias, culinária e entretenimento

Audiência: 5 pontos

Negócios: fatura 6 milhões de reais por ano entre salário e ganhos com merchandising, publicidade, eventos e licenciamento de produtos

Os trunfos

• Tem empatia com mulheres de todas as idades e classes sociais

• É disciplinada, discreta e tem cabeça de empresária

O desafio

• A vida de modelo, que começou muito cedo, deixou buracos em sua formação. Ana tropeça no português e não tem jogo de cintura para enfrentar vários temas’



******************

Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.

Folha de S. Paulo

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

Terra Magazine

Veja

No Mínimo

Comunique-se

Direto da Redação

Último Segundo