Saturday, 28 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Eu sou você… amanhã

COBERTURA INTERNACIONAL

Antônio Brasil (*)

Por interesse profissional ou por razões pessoais, volta e meia me vejo de olho na cobertura jornalística internacional. Convivi com o noticiário de diferentes lugares, como Bósnia, Kosovo, Afeganistão e, mais recentemente, Haiti e Venezuela. Ainda fico sempre surpreso e impressionado com o descaso da nossa imprensa com lugares e notícias tão importantes. O noticiário da TV, então, nem se fala. Se não fosse a CNN e as agências internacionais, não saberíamos quase nada sobre o mundo. Em relação ao continente latino-americano é ainda pior. Nossos jornalistas dão preferência a notícias sobre Nova York e Londres do que sobre Buenos Aires, Cidade do México ou Caracas. Devem ter suas razões. A verdade é que, se dependesse da nossa cobertura internacional de TV, mal saberíamos que mais um presidente latino-americano enfrenta uma greve nacional e que está à beira de ser deposto. E num país tão próximo do Brasil. Talvez devêssemos prestar um pouco mais de atenção ao presente, para evitarmos um futuro semelhante.

A Venezuela, no entanto, não costuma freqüentar nosso noticiário. Para nós é meio "terra de ninguém". De vez em quando aparece em torneios de futebol. Vencemos sempre fácil, de goleada. Mas, assim como o resto do nosso continente, e segundo a visão de alguns editores de Internacional, "América Latina? Quando não é seca é enchente e só!" Mas agora parece ser diferente. Todos os dias assistimos a imagens de manifestações, tiroteios, grevistas lado a lado com patrões e relatos de uma luta titânica entre os principais meios de comunicação pelo monopólio dos fatos. Assim como aqui, a Venezuela tem TVs privadas poderosíssimas!

Aviso de entendedor

Fico preocupado. No Brasil, talvez não queiramos pensar que temos muito mais em comum com a Venezuela e com a história recente da América Latina do que gostaríamos. Já vimos esse filme antes, diversas vezes, e também já conhecemos seu final. Desagradar a ITT americana, no caso do Chile, recusar as imposições do FMI na Argentina ou desagradar o presidente Bush, na Venezuela de Chávez, não costuma acabar muito bem.

O problema é que muito do que se passa nos países vizinhos, mais cedo ou mais tarde, tende ou pode acontecer no Brasil. Hoje, em ritmo de novo governo do Partido dos Trabalhadores, muita esperança nas ruas, mas muitas dúvidas em relação ao futuro, lembrei de uma daquelas velhas propagandas de analgésico que fizeram muito sucesso na TV há alguns anos. Era sobre um homem que encontrava no meio de uma festa animadíssima seu próprio sósia, com uma tremenda dor de cabeça, na maior ressaca. "Mas quem é você?" A resposta vinha em tom de alerta: "Eu? Eu sou você… amanhã!"

Alguém lembra do anúncio? Alguém ainda pensa depois de assistir ao noticiário da TV? Pois fica aqui o aviso. Para bom entendedor, meia palavra ou meia notícia… basta!

(*) Jornalista, ex-correspondente internacional de TV