O POVO
"À guisa de apresentação", copyright O Povo, 12/1/03
"Leitor, este é nosso primeiro contato nesse espaço e nessa função. A convite do presidente do O Povo, Demócrito Dummar, inaugurei meu mandato de ombusdman na última terça-feira, dia 7. Dou, desse modo, seqüência a um trabalho iniciado pela jornalista e professora Adísia Sá em 1993 e enriquecido nesses 10 anos por profissionais da mesma estatura ética da pioneira: Márcia Gurgel, Lira Neto, Gibson Antunes, Débora Cronemberger e Regina Ribeiro – esta última minha antecessora imediata, agora reinvestida como editora-executiva do Núcleo de Negócios. Está clara, pois, a cultura estabelecida no O Povo ao longo de seus 75 anos, segundo a qual seu público tem voz. Essa cultura consolida-se pela instituição ombusdman, com os ônus inerentes ao novo e os bônus assegurados pela transparência. E é com o mais amplo respeito ao leitor, assumido pelo O Povo em sua Carta de Princípios, em seu Código de Ética e no Estatuto do Ombusdman, que pretendo desempenhar minhas tarefas neste mandato.
O deputado e o ministro
Há mais de um mês a sociedade sabe das investigações que a Polícia Federal fez sobre supostas ligações do deputado federal Pinheiro Landim (sem partido) com um esquema de venda de habeas corpus a traficantes. Nas apurações, segundo a PF, estaria relacionado também o ministro Vicente Leal, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em comum, dois fatos: 1) ambos projetaram-se nacionalmente a partir do Ceará; 2) a imprensa local tem sido modesta em mostrar ao público quem são os dois personagens, que poder detêm ou como desenvolvem suas atividades de agentes públicos. Até recentemente, o limite havia sido a reprodução de matérias originárias de agências de notícias. Isso não é o bastante. É importante – e muito – para a sociedade saber quem escolheu para fazer leis. Ou quem as executa.
O Povo, na semana passada, deu alguns passos para corrigir essa falha. Agregou novas informações ao material das agências sobre a eminente renúncia de Pinheiro Landim, ouviu fontes locais, deu consistência à cobertura do caso. O Diário do Nordeste emparedou-se nos já mencionados textos de agências. Quanto a Vicente Leal, no entanto, há um certo (e inexplicável) silêncio. As investigações da PF sobre o ministro não estão tendo o mesmo espaço. Quem só leu nos jornais dos últimos dias as matérias sobre o assunto pode ter tido a impressão de que Landim é o único nome de expressão citado.
Falido ou austero?
O Povo foi palco de um debate estéril na semana passada. De um lado, o secretário da Administração e de Governo do Estado, Mauro Benevides Filho, e Luiz Pontes. Do outro, o senador Sergio Machado. O foco foi uma entrevista dada por Mauro, negando que o Estado esteja quebrado e afirmando que a atual gestão será austera com o dinheiro público – o que, convenhamos, é obrigação de qualquer governo. Segundo ele, medidas como a proibição de compras de bens imóveis e móveis e os cortes de 20% dos gastos com viagens de servidores não indicam fragilidade de caixa, mas a dita ??austeridade??. Na quarta-feira, 8, Sergio disse que o Estado está quebrado, sim, e que havia avisado sobre esse quadro. No dia seguinte, O Povo trouxe Luiz Pontes defendendo a tese de Mauro Filho e criticando o senador do PMDB. O erro está no nascedouro. O jornal, se tivesse ouvido os dois lados da história logo na matéria do dia 8 e apurado as informações, buscando em outras fontes dados precisos sobre a saúde financeira do Estado, teria evitado um infrutífero bate-boca. Resumindo: ficou o dito pelo não dito.
Da violência e do provincianismo
Alguns momentos de violência na última semana. 1) O jornalista Heraldo Pereira, da Rede Globo, de férias em Fortaleza, vai passear na praia do Titãzinho e acaba assaltado; 2) Quadrilhas se digladiam no Lagamar e uma criança de 10 anos, Luciano Augusto dos Santos, é ferida com dois tiros.
Um retrato do provincianismo que às vezes domina nossa imprensa: Sexta-feira passada, a colunista social Sônia Pinheiro publicou uma nota sugerindo ao Governo do Estado que pedisse desculpas ao repórter da Globo. Segundo a jornalista, o assalto no Titãzinho havia sido abordado em 32 jornais. No O Povo inclusive, com um artigo de Heraldo. ??Pior repercussão negativa, impossível??, escreveu Sônia.
Violência, qualquer que seja, é abominável, mas antes o Governo se desculpasse com a comunidade do Lagamar e, em especial, com a família do menino Luciano Augusto. Mesmo que fosse ??só?? garantindo policiamento na área, acabando com a guerra de gangues, e oferecendo segurança – o que é sua tarefa constitucional. Isso Sônia não cobrou."