MÍDIA ESPORTIVA
Antonio Carlos Teixeira (*)
Diz o Aurélio que impotente é "aquele que não pode alguma coisa; fraco, débil". Confesso que me sinto nessa situação ao notar a completa falta de opinião da mídia esportiva sobre o atacante Romário. E explico, caro observador: impotente porque nem eu nem milhões de torcedores temos espaço nobre na chamada grande imprensa para formular algo mais real a respeito do "fenômeno sem resultado". Poucos são (e foram) os jogadores brasileiros que ganharam imunidade às críticas dos "cronistas esportivos". Não me lembro de outro jogador que tenha recebido igual proteção, apesar de jogar um futebol miudinho.
Perde tempo o torcedor que abre jornais, revistas ou sintonize emissoras de rádios e tevês a fim de ler (e ouvir) coisa diferente das que temos visto sobre o ex-atacante do Fluminense. O que se procura, então? Talvez, uma crítica mais isenta de paixão, menos doce, sem saudosismo, bairrismo. Romário é passado, assim como Zico, Sócrates, Júnior, Falcão, entre tantos outros craques. De atual mesmo só seu marketing. A mídia, fascinada, trata o jogador como ídolo do presente. E não o é. Romário deixou de ser jogador faz tempo. Tem-se sustentado à custa do que fez no passado. Nada mais.
Os clubes que o contratam fazem jogada de marketing. O torcedor, alheio aos assuntos de bastidores, acredita naquele produto comprado a peso de ouro. Ao cabo de mais uma competição, seu time nada ganha com Romário. Lembro-me de partida válida pelo Campeonato Brasileiro do ano passado entre Corinthians e Fluminense, no Pacaembu. O time paulista era franco favorito; o carioca, zebra. A confiança da mídia em relação ao Fluminense ficou ainda mais abalada quando se soube do desfalque repentino (?) de Romário. E o que o tirou do jogo? Aquela conhecida distensão que afeta seus músculos quando minimamente forçados.
A mídia paulista (e também a carioca) perdeu a grande chance de mostrar aos torcedores que, contra o Corinthians, o Fluminense teria melhor sorte sem Romário. A imprensa não conseguiu se desvencilhar do lugar-comum. Falou-se de tudo. Só não enxergou o óbvio. Era evidente que, sem Romário, o Fluminense seria um adversário mais forte, rápido e certeiro nos contragolpes. Esqueceram que o Flu tinha Magno Alves e Roni ? dois velocistas prontos a surpreender o time de Parreira. O Corinthians foi amplamente dominado. O ataque tricolor enlouqueceu a zaga corintiana. Final: Flu 3 a 1. E, naquele dia, ninguém mais se lembrou do protegido ? e eternamente contundido ? atacante.
Há cinco anos, Romário não faz mais diferença em campo. De lá pra cá, vem sendo utilizado como marketing pelas equipes que ousam gastar milhões para vê-lo enfurnado nas salas de fisioterapia e de recuperação física. Dia desses, ao passar por um fórum freqüentado por torcedores, li a melhor definição sobre o Romário de hoje. Nos últimos anos ? confesso ? não encontrei um colunista sequer que fizesse análise crítica apropriada sobre o Baixinho. Em vez de contarem a verdade ao torcedor os colunistas enrolam. Preferem lembrar-se do passado, fechando os olhos para o presente. Só têm raciocínio para dizer que, dentro da área, Romário é imbatível. O torcedor a que me refiro escreveu o seguinte: "Que goleador é esse que se treina não pode jogar, e se joga não pode treinar?" Na bucha, não caro observador? Uma indagação com resposta pronta ? e acabada.
O torcedor pagava o "peixe"
Lembro que três meses antes da Copa arrisquei escrever alguma coisa sobre o forte lobby da imprensa em favor da convocação de Romário para a Seleção Brasileira. Com raras exceções, a esmagadora maioria dos colunistas esportivos queria (exigia, é melhor) Romário na Seleção. Se não me engano, o colunista Diogo Mainardi, da Veja, foi um dos poucos que se rebelaram, publicamente, contra a couraça construída para o atacante à véspera da Copa da Coréia-Japão. Tentei fortalecer minha opinião, citando exemplos práticos sobre a participação de Romário nas eliminatórias para a Copa. Disse que Romário se destacara justo nos jogos mais fracos do Brasil ? contra Bolívia e Venezuela. Nas demais partidas, o xodó da mídia mal andou em campo. O tempo passou. Chegou a Copa. Brasil campeão. Sem Romário, claro. Felipão calou o estrondoso lobby.
Não é preciso citar exemplos concretos para firmar posição segundo a qual, para grande parte da mídia esportiva, os gols de Romário valem mais do que os de Guilherme, Luís Fabiano, Roni, Ricardo Oliveira, Liédson, Luís Mário, entre outros atacantes. Nesse oba-oba, o país segue à sombra de um jogador que se especializou em passar a perna nos clubes que o contratam, sem que ninguém da imprensa levante a voz para condená-lo. Se ganhasse por produtividade, Romário estaria prestes a pedir concordata. O pior é que os times do Rio apostam nesse marketing improdutivo do ponto de vista de conquistas. Romário nada mais é hoje do que instrumento de marketing nas mãos de hábeis e perniciosos cartolas. O Catar, cujos xeques adoram rasgar petrodólares, o levou por três meses. Tempo suficiente para que os reis do petróleo descubram que embarcaram num navio de casco furado.
No meio do ano, ele retorna ao Brasil. Se tudo correr bem ? isto é, se a sua panturrilha não falhar ?, Romário terá marcado uns golzinhos nos ingênuos árabes, reforçando sua estratégia de marketing para quando retornar ao paraíso chamado "Rio de Janeiro". Aí, tudo estará preparado para que Fluminense, Vasco, Flamengo e até Botafogo iniciem batalha para adquirir os "direitos federativos" do jogador. Tudo bem-articulado, de tal forma que a mídia continue enrabichada àquele que foi um dos maiores atacantes do futebol mundial. Foi. Não é mais. Romário é passado. Devemos respeitá-lo pelo o que fez, colecionar suas figurinhas, guardar seus gols em vídeos, DVDs. E nada mais.
Enquanto isso, o Fluminense seguirá lutando contra sua quase impagável dívida e, mais do que isso, à caça de minguado título. Conquista que o todo-poderoso atacante não lhe deu. Muito menos há indícios de que isso vá ocorrer. Nas Laranjeiras, contudo, permanece um forte aliado de Romário, o técnico Renato Gaúcho ? igualmente bom estrategista quando o assunto é marketing pessoal. Quando perguntado sobre como armará sua equipe, Renato sai-se sempre com esta:
? No meu time, é o Baixinho e mais 10.
Note-se, ilustre observador, que por muito tempo o Fluminense jogou com 10 homens. E o torcedor das Laranjeiras é quem pagava (nos dois sentidos) o pato. Ou melhor, o "peixe". Enquanto Romário estiver a passeio no Golfo Pérsico, o tricolor entrará em campo, de fato, com 11 jogadores, livrando a cara do falastrão Renato Gaúcho.
(*) Jornalista em Brasília. Texto escrito na quinta-feira, 13/3 ? antes, portanto, da goleada do Fluminense sobre o Flamengo, no sábado.