GOVERNO LULA
“Conteúdo e entendimento”, copyright Jornal do Brasil, 11/03/03
“Importantes alterações nas estruturas de dois ministérios e duas agências poderão ter com rapidez um impacto muito grande sobre a produção, difusão e controle do produto audiovisual no Brasil.
O Ministério das Comunicações, por exemplo, está enviando ao Planejamento proposta para transformar sua secretaria de serviços de radiodifusão em secretaria de serviços de comunicação eletrônica de massas. Isso pode sinalizar a retomada do projeto da lei de comunicação social de massas, produzida pelo ex-ministro Juarez Quadros, que amplia exponencialmente as atribuições do ministério e lhe dá poder de controle sobre questões que envolvem, entre outras, a propriedade cruzada dos meios de comunicação e a qualidade da programação gerada pelos concessionários.
No âmbito do Ministério da Cultura, a estrutura que classifica suas cinco secretarias por áreas artísticas deve ceder lugar a três secretarias divididas por funções administrativas: formulação de políticas culturais, projetos e relações institucionais. O ministro Gilberto Gil levou essa proposta, no dia 25, ao ministro Guido Mantega, do Planejamento, Orçamento e Gestão. As mudanças incluem a criação de dois novos institutos (do livro e do audiovisual) e uma nova fundação (de museus), além de uma agência de fomento para gerir recursos da Lei Rouanet e do Fundo Nacional de Cultura, e também de outros três institutos ligados à Funarte (música, artes cênicas e artes plásticas).
Já o presidente da Ancine, Gustavo Dahl, está imerso numa cruzada para defender a própria existência de sua recém-criada agência de cinema, sujeita a pressões que vêm de todos os lados, assim como do processo de revisão do modelo das agências instaurado pelo novo governo. ?Governos mudam e programas também. Mas é de bom alvitre saber onde se quer chegar antes de alterar o curso?, desabafa o presidente da Ancine, em artigo para O Estado de S.Paulo. ?Da mesma forma que a língua, o território, as Forças Armadas, a moeda, é no campo da indústria cultural, da propriedade intelectual, do conteúdo potencializado pela telemática, que os países, sobretudo aqueles em desenvolvimento, fortalecerão sua soberania?, diz Gustavo.
Some-se a tudo isso a forte presença da Secretaria de Comunicações da Presidência da República não só na teledifusão como também, e sobretudo, na viabilização da produção audiovisual brasileira. O resultado é ao mesmo tempo promissor e inquietante. Promissor porque há indícios de mudanças para melhor na legislação e controle da radiodifusão e da distribuição cinematográfica no país, assim como à viabilização da produção audiovisual. Inquietante porque está bastante claro que os setores envolvidos estão se falando muito pouco ou não estão se falando de modo algum.
Se esse diálogo não ocorrer, o país vai continuar assistindo a criação de estruturas diferentes e superposições de tarefas que não levarão a lugar algum. Se, ao contrário, as agências e os ministérios envolvidos na produção e difusão de conteúdo audiovisual conseguirem organizar produtivamente os seus trabalhos, então o país poderá se deparar com um repertório de imagens que atenda aos interesses econômicos, culturais e soberanos da nação.”
GRAMPOS NA BAHIA
“Bahia”, copyright Folha de S. Paulo, 17/03/03
“?Sou um dos 3 milhões de eleitores de ACM. Como disse o governador Roberto Requião, essa questão dos grampos é uma bobagem, e o Congresso deveria se preocupar com coisas mais sérias. ACM é o homem mais bem informado da Bahia, para isso tem muitos amigos (muito mais do que inimigos). Portanto não precisa dessa tolice infantil de grampos para saber de tudo o que se passa. O nosso Congresso está muito mal representado. Uma senhora Heloísa Helena não tem o menor equilíbrio emocional nem credencial para senadoria. O senhor Pedro Simon parece uma marionete de mau gosto. Enfim, esse Congresso é passional. Nele não vale a razão, mas, sim, as diferenças pessoais. Se, para o Brasil, agora ACM não serve, para, nós, baianos, ele é o maior de todos. E a Bahia muito lhe deve e dele precisa. Há os ingratos, afinal queimaram até Joana D’Ärc e quase mataram Oswaldo Cruz, Galileu e outros.? Ezequiel da Silva Martins (São Paulo, SP)”
GRAMPOS NA MÍDIA
“Dossiê, imprensa e Judiciário”, copyright O Estado de S. Paulo, 17/03/03
“De algum tempo para cá, o uso de grampos como material jornalístico virou ferramenta de trabalho. A velha e boa reportagem foi sendo substituída pelo dossiê. Os injustiçados já não olham para os tribunais, mas para os jornais. Os inimigos evitam o confronto direto, pois conhecem a eficácia de uma falsidade bem plantada. Viu-se a imprensa transformada num perigoso instrumento de vinganças, mas, ao mesmo tempo, numa instância prática de realização da justiça.
A publicação de grampos pode ser tudo isso: denúncia verdadeira ou chantagem vil. Impõe-se, conseqüentemente, um redobrado esforço na qualificação das matérias que chegam às redações. É preciso ter cuidado com a fonte que voluntariamente procura o repórter. Dossiês, mesmo quando carregados de indícios relevantes, são apenas pistas para uma adequada investigação. Não são (ou não deveriam ser) matéria para edição. Nada, nada mesmo, substitui o dever da apuração. O grampeamento continua sendo um delito.
Independentemente das tentativas de minimizar a gravidade da sua prática, continuo achando que o melhor fim não justifica quaisquer meios.
Um perigo ronda o trabalho da imprensa: a síndrome da concorrência. A preocupação com a perda de um furo está na origem de inúmeros deslizes. O bom jornal é aquele que tem a coragem de esquecer a concorrência e optar pela informação de qualidade. É sempre melhor usar a cautela do que ter de recuar no dia seguinte. Feitas tais ressalvas e separado o joio do trigo, gostaria, caro leitor, de salientar a relevância das sucessivas denúncias contra a corrupção que têm batido à porta das redações. A denúncia jornalística tem sido, freqüentemente, um magnífico instrumento de luta contra a impunidade.
O Brasil, graças também à varredura feita pela mídia, está passando por profunda mudança cultural. Esse processo, no entanto, tem provocado alguns conflitos institucionais. Sobressai, entre eles, um crescente desgaste no relacionamento entre o jornalismo e o Judiciário. Alguns, indignados com os excessos da mídia e o vedetismo de certos membros do Ministério Público, criticam o presumível poder de destruir dos meios de comunicação.
A informação é a base da sociedade democrática. Por isso, precisamos melhorar os controles éticos da notícia, combater as injustas manifestações de prejulgamento e a precipitação que pode desembocar em autênticos assassinatos morais. Mas, ao mesmo tempo, não podemos deixar de criticar o formalismo paralisante do Judiciário, responsável maior pela desconfiança com que a sociedade encara a possibilidade da realização da justiça. Em nome do amplo direito de defesa, importante e indispensável, a efetivação da justiça pode acabar se transformando numa arma dos poderosos e numa sistemática frustração dos mais desprotegidos. Aplicam-se aos desvalidos os rigores da lei e se concedem aos criminosos de colarinho-branco as vantagens dos infinitos recursos que o Direito reserva aos que podem pagar uma boa defesa.
A crise do Judiciário tem empurrado a imprensa para uma função que não é sua. O cidadão, descrente da eficácia do caminho judicial, procura o repórter. Vivemos uma profunda distorção, uma superposição de papéis. A crise, no entanto, não se resolve com atitudes corporativas. É preciso discutir um novo conceito de espaço público que permita uma convivência civilizada entre o Poder Judiciário e o mundo da informação. Os meios de comunicação, independentemente de suas mazelas e equívocos, têm travado uma saudável discussão a respeito dos seus conflitos éticos. Não vejo, no entanto, o mesmo debate na área do Judiciário.
O formalismo jurídico, marcado pela pura e simples aplicação das leis, não tem conseguido enfrentar problemas que ultrapassam as balizas fixadas pelo positivismo que está por baixo de inúmeras decisões. Será que o Judiciário, refém de uma estrutura obsoleta e morosa, está em condições de responder ao desafio dos novos crimes ecológicos, da delinqüência infanto-juvenil, dos escândalos políticos, do financiamento ilegal de partidos, etc.? Penso que não. A reforma do Judiciário não pode ser postergada. Afinal, a primeira vítima é o prestígio da Justiça. Juízes imobilizados por uma desumana enxurrada de processos e tribunais paralisados pela indústria de recursos desgastam a imagem da instituição. Nós, profissionais da imprensa, estamos tentando fazer a nossa parte. Esperemos que o Judiciário, sem dúvida constituído por inúmeros homens de bem, faça a sua. Só então, sem corporativismo e arrogância, romperemos o conflito que tem marcado as relações entre duas instituições básicas para o processo democrático: imprensa e Judiciário. (Carlos Alberto Di Franco, diretor do Master em Jornalismo para Editores e professor de Ética Jornalística, é representante da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra no Brasil E-mail: difranco@ceu.org.br)”