COBERTURA DE GUERRA
“Cobertura de TVs árabes desperta fúria contra tropas da coalizão”, copyright Folha de S. Paulo / Reuters, 26/03/03
“Diferentemente do que aconteceu na Guerra do Golfo, em 1991, quando os olhos do mundo estavam focados na CNN, os árabes agora se voltam para três emissoras que estão, segundo especialistas, repletas de imagens que os levam à fúria contra a ação das tropas de coalizão.
A Al Arabiya, baseada em Dubai, a Al Jazeera, do Qatar, e a Abu Dhabi (ADTV) têm feito uma grande operação no Iraque e frequentemente entram com imagens chocantes, como a de iraquianos decapitados, soldados americanos mortos e prisioneiros de guerra apavorados.
A transmissão ao vivo, que atinge dezenas de milhões de domicílios árabes, desempenha papel crucial no modo como a população local encara o conflito que tem gerado inúmeros protestos contra o governo norte-americano em diferentes partes do globo.
?Em 1991 não havia emissoras de TV árabes, o que fazia da CNN o máximo?, disse o jornalista Abdullah Schleifer, diretor do Centro de Videojornalismo da Universidade Americana no Cairo.
?Agora a maioria dos canais árabes está exibindo imagens que elas sabem que terão repercussão entre a população [da região].?
Muito antes do conflito no Iraque, o ódio aos Estados Unidos era um sentimento presente no Oriente Médio pelo apoio ao Estado de Israel. Ele ficou mais intenso depois da ação no Afeganistão, desencadeada pelos ataques terroristas de 11 de setembro. A guerra no Iraque só serviu para exacerbar ainda mais a situação.
Especialistas em mídia dizem que as TVs da região dão a impressão de estarem tratando o conflito como uma guerra entre o mundo ocidental e o árabe.
Dizem que as imagens de iraquianos ensanguentados e mortos após ataques das tropas de coalizão alimentam o sentimento antiamericano. Afirmam ainda que as imagens mais pesadas são as exibidas pela Al Jazeera.
?Assim como já aconteceu no Afeganistão a Al Jazeera mostra aos telespectadores árabes o que eles querem ver e acabam justificando o ódio [contra a coalizão]?, afirmou um especialista em mídia baseado em Londres que não quis ser identificado.
As TVs Al Arabiya e a ADTV dizem não ter condições de bater a Al Jazeera sem ferir seus próprios códigos de conduta.
?No curto prazo perdemos para a Al Jazeera porque ela tem uma abordagem mais sensacionalista, mas assim conquistamos a confiança e o respeito das pessoas?, disse um executivo da Al Arabiya.”
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“EUA agridem e expulsam jornalistas, diz TV”, copyright Folha de S. Paulo, 29/03/03
“A rede de TV pública portuguesa RTP informou ontem que dois de seus correspondentes, junto com mais dois jornalistas israelenses, foram agredidos e detidos na última terça por tropas norte-americanas no sul do Iraque, sob a acusação de espionagem. Depois de três dias detidos, foram levados de volta ao Kuait num helicóptero norte-americano.
Eles foram parados na terça de manhã num posto militar americano, onde foram revistados, deitados no chão e alertados a não se mexer, sob o risco de ser baleados.
O incidente só foi resolvido na quarta, quando os jornalistas ouviram um pedido de desculpas. Mesmo assim, só foram liberados no dia seguinte, depois de terem o material revistado pela CIA.
Um porta-voz do Pentágono disse que os jornalistas tiveram comportamento ?unilateral?, colocando em risco a segurança das tropas na região.
Em outro episódio, sete correspondentes italianos foram dados como desaparecidos desde ontem. Na última vez que foram vistos, estavam próximos a Basra, cidade do sul do Iraque. Com agências internacionais”
“A cobertura no Iraque, por Varella e D?Ávila”, copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 29/03/03
“O repórter Sérgio D?Ávila e o fotógrafo Juca Varella, que estão em Bagdá pela Folha, relatam como vêm sendo feitos o ataque ao Iraque e a cobertura da imprensa. O texto, intitulado ?Em Bagdá, somos todos parte do mesmo alvo?, foi publicado no espaço ?Diário de Bagdá?, na edição desta sexta-feira (28/03). Leia na íntegra:
?A entrevista coletiva estava marcada para as 15h locais (9h de Brasília), e os jornalistas começavam a chegar ao prédio novo do Ministério da Informação, no centro de Bagdá. De novo, repararam que os funcionários colocaram cadeiras novas de plástico.
O tema seriam os escudos humanos, que continuam na cidade e inclusive fizeram uma publicação, que começava a ser distribuída aos presentes. De repente, ouve-se a sequência de sons e ruídos que tomam a cidade há oito dias, mas com a qual ninguém jamais vai se acostumar.
Bum. Primeiro, o barulho da bomba batendo no solo. Depois, o tremor de terra causado pelo impacto. Por fim, a explosão propriamente dita. Bum. De novo, a mesma sequência. O alvo parecia ser perigosamente próximo de onde estávamos. Apreensão.
Foi quando o prédio todo fez um barulho insuportavelmente alto, como se alguém tivesse estourado um rojão no banheiro de sua casa no momento em que você estava dentro do aposento.
Pânico. Gritos. As cadeiras novas viradas no chão. Em 30 segundos, repórteres do mundo todo corriam pela rua em busca de um abrigo seguro, liderados pelo veterano John F. Burns, do jornal ?The New York Times?.
As equipes de TV, que ficam no topo da sede do ministério, onde estão as antenas transmissoras, desciam as escadas aos tropeções. Reunidos no estacionamento em frente, os grupinhos tentavam entender o que tinha acontecido, já que o prédio continuava em pé.
Então, a revelação.
A barulheira infernal tinha vindo do alto do edifício, onde se escondia até então despercebida uma bateria antiaérea iraquiana que tinha tentado derrubar o avião da coalizão anglo-americana que soltou as duas bombas.
A presença da artilharia no telhado do Ministério da Informação, que é também onde se reúne diária e obrigatoriamente a imprensa internacional, nunca havia sido confirmada pelo governo. A confirmação de que afinal somos todos parte do mesmo alvo veio ontem ao vivo e em cores, com som estéreo.
Passada a confusão inicial, houve uma correria para os carros e começou uma perseguição pela cidade para saber qual equipe seria a primeira a descobrir a localização exata do alvo das duas bombas. O pega-pega se explica.
É que o governo iraquiano raramente divulga os lugares atingidos pelos ataques norte-americanos, a não ser quando interessa politicamente (alvos civis, por exemplo) ou quando é impossível negar (caso da sede da rádio e da TV estatais, que fica ao lado do centro de imprensa).
Uma vez nos carros, no entanto, é preciso uma negociação minuto a minuto com o motorista e o guia contratados, ambos na maioria das vezes apontados pelo próprio ministério e obrigados a apresentar um relatório das atividades diárias aos seus superiores.
Eles podem não querer levar os jornalistas até o alvo, ou autorizar a ida mas proibir as fotografias e imagens, ou autorizá-las mas se recusar a servir de intérprete com a população local, que na maioria das vezes só fala árabe.
A dupla contratada pela Folha aceitou a tarefa. Depois de meia hora rodando a cidade, não conseguimos encontrar os tais alvos das duas bombas recém-lançadas – no final das contas, nenhuma das equipes conseguiu.
No caminho, porém, descobrimos que a sede da estatal de telecomunicações iraquiana tinha sido atingida por diversos mísseis na noite anterior, fato que havia sido escondido pelo governo iraquiano até então.?”
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“Merval Pereira de olho no Jornal do Brasil”, copyright Comunique-se, 31/03/03
“Caixa Preta
Merval Pereira, diretor editorial dos jornais das Organizações Globo, em uma frase daquelas definitivas, demonstrou que acompanha de perto o que os adversários noticiam sobre a guerra: ?Fora dos Estados Unidos, o JB é o jornal que mais apóia os americanos no ataque ao Iraque.?
Merval não exagera. Como todos sabem, na maioria das publicações, a seção de Cartas dos Leitores recebe muito mais cartas do que publica. A revista Time tinha 52 pessoas no trabalho de seleção, no esforço de que o material publicado retratasse com proporcionalidade as opiniões de todos os leitores. Esse é também o critério de Veja, Época, IstoÉ e de qualquer jornal sério. Mas uma simples leitura das cartas no Jornal do Brasil demonstra que o conjunto claramente não corresponde ao pensamento dos leitores do jornal e de todo o povo brasileiro sobre a guerra.
De onde vem a orientação para a Seção de Cartas? Aparentemente não é do comando da redação, porque Augusto Nunes, em conversas com todos os seus amigos, demonstra oposição à guerra. Tudo indica que o ânimo belicista venha da própria direção do jornal – ou de Jôza Nascimento Brito (contrariando toda a tradição do jornal e de sua família) ou de Nelson Tanure.
O índice de cancelamento ou não-renovação de assinaturas do JB aumentou nas últimas duas semanas. E há forte suspeita de que o motivo principal seria a posição do jornal na questão da guerra.
Demissões em todo o território nacional
O Condomínio dos Diários Associados decidiu reestruturar as redações de todos os seus jornais para enfrentar a crise geral da imprensa – em linguagem mais simples, vem aí mais demissão. Segundo uma fonte da direção em Brasília, o noticiário político será produzido exclusivamente pelo Correio Braziliense e distribuído a toda a cadeia associada. A edição – inclusive a compra de serviços de agências ou especiais – do noticiário internacional também seria centralizada. O mesmo valeria para a cobertura do Campeonato Brasileiro de Futebol e todos os grandes eventos esportivos.
Ali Kamel teve saudade na hora errada
Deu a saudade do jornalismo impresso em Ali Kamel e o poderoso subchefão da Globo está assinando um artigo diário no seu antigo jornal. Ali é de família muçulmana e tem sólido conhecimento da cultura árabe. Mas, no artigo de sexta-feira, 28 de março, prevaleceu a ânsia (certamente nem de natureza religiosa nem cultural) de nos provar que os Estados Unidos estão atacando o Iraque para libertar o país do ditador Saddam Hussein. Não por causa das reservas de petróleo, pelos contratos de reconstrução do país, pelo estabelecimento de uma forte base militar na Ásia Central e próxima às fronteiras da Rússia e da China, pelo enfraquecimento da unidade européia – nada disso ou qualquer outra razão apresentada pela esmagadora maioria dos analistas internacionais.
Ali deixa de lado a expressa e imediata preocupação dos estrategistas americanos de proteger os campos iraqueanos de petróleo, impedindo qualquer ato de sabotagem. Confunde números de produção de gás e de petróleo, para demonstrar que os Estados Unidos não precisam do petróleo de ninguém. Não faz a menor referência ao fato de que Hussein participou do golpe de 1963 contra o presidente nacionalista Abdul Karim Qasim (um dos mais ativos organizadores da OPEP), que mereceu o histórico comunicado do chefe operacional da CIA na região, James Critchfield: ?Chegamos ao poder num trem da CIA?. E foi também a CIA quem deu a maior ajuda a Hussein para criar o serviço secreto iraqueano. Foi também induzido pelos Estados Unidos que Hussein atacou o Irã, onde os irmãos xiitas de Ali tinham tomado o poder e nacionalizado o petróleo.
Ali sabe muito, mas certamente sabe menos sobre Iraque do que outros jornalistas do mundo inteiro, inclusive americanos.
É só dar uma olhadinha na Internet.”
“Jornalistas agredidos por soldados americanos no Iraque”, copyright UOL / AFP (www.uol.com.br), 28/03/03
“Dois jornalistas da televisão pública portuguesa RTP, acusados de espionagem, foram detidos e espancados por tropas americanas no sul do Iraque, em companhia de dois colegas israelenses.
Segundo o diretor de informação da RTP, José Rodrigues dos Santos, os dois jornalistas portugueses, Luis Castro e Víctor Silva, foram soltos em seguida e estão bem no Kuwait.
A equipe portuguesa tinha entrado numa área do Iraque para chegar à frente de batalha. Uma vez que chegou a Karbala, foi expulsa por estar acompanhada de dois repórteres israelenses sem credenciais.
Ao se recusarem a deixar seus colegas, os dois portugueses regressaram a Nadjaf, ao norte de Basra, onde passaram a noite perto de tanques americanos.
?Quando acordaram, se viram cercados de soldados que lhes apontavam suas metralhadoras?, indicou à agência Lusa um dirigente da RTP.
Luis Castro recebeu pontapés enquanto Victor Silva foi espancado. Depois foram detidos durante 36 horas, acusados de espionagem, e ficaram sem contato com o exterior, até que um oficial os liberou e foram levados ao Kuwait.
O correspondente da televisão israelense Dan Scemama disse: ?Passamos as piores 48 horas de nossas vidas. Os soldados americanos decretaram que éramos terroristas e espiões e nos trataram como tais?.
Segundo José Rodrigues dos Santos, as autoridades americanas se desculparam e anunciaram a abertura de um inquérito.”
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“NBC demite o correspondente Peter Arnett por comentários sobre a guerra.”, copyright UOL / AFP, 31/03/03
“O jornalista americano Peter Arnett, 68 anos, famoso por sua cobertura da primeira Guerra do Golfo em 1991 para a rede de tevê CNN, foi afastado da NBC por ter dito em entrevista à televisão iraquiana que os planos de guerra dos Estados Unidos estavam fracassando.
?Arnett cometeu um erro ao conceder entrevista à rede de televisão estatal iraquiana, especialmente em tempos de guerra. Não foi correto expressar suas opiniões nessa entrevista?, declarou a NBC em um comunicado divulgado nesta segunda-feira. ?Conseqüentemente, Peter Arnett não vai mais trabalhar para a NBC News e a MSNBC?.
Nesta entrevista transmitida no domingo, o jornalista, neozelandês naturalizado americano, declarou que o primeiro plano de guerra fracassou devido à resistência iraquiana e que os estrategistas americanos subestimaram as forças iraquianas.
Arnett pediu desculpas hoje à NBC e ao público americano, dizendo-se ?constrangido? com a controvérsia deflagrada por sua entrevista. ?Eu não sou contra a guerra, eu não sou antimilitar?, justificou-se, acrescentando que foi uma ?entrevista improvisada?.
?Fiz algumas observações pessoais – algumas observações analíticas – que acredito que não contradizem o que os especialistas pensam?, afirmou. ?Mas claramente subestimei a polêmica?.
Arnett estava em Bagdá como correspondente do programa ?National Geographic Explorer? da NBC e da MSNBC e é um dos poucos jornalistas ocidentais que permanecem na capital iraquiana.
Depois da entrevista de Arnett à TV estatal iraquiana, o ex-Senador por Nova York Alfonse D?Amato, entrevistado pelo programa Fox News Sunday, disse que os comentários de Arnett ?ajudam e confortam o inimigo?.
Quando começou a polêmica, a NBC apoiou Arnett, dizendo que ?seus comentários eram de natureza analítica e não tinham outro objetivo?.
Arnett disse na segunda-feira não ter planos imediatos.
?Há uma pequena ilha no sul do Pacífico, desabitada, até a qual tentarei nadar?, disse.”