GRITO DE SOCORRO
Claudia de Siervi (*)
Atenção, colegas jornalistas! Nossa raça está sendo sumariamente exterminada do planeta! Somos abjetos, indesejáveis, ultrapassados e um alvo fácil (morremos cinco ontem no Iraque)! Lá estamos nós, em todas as guerras, conflitos, crises, penhascos, abismos, nos locais mais inatingíveis, para cobrir fatos humanos. Claro que havia um jornalista instalado na Lua antes de o primeiro astronauta chegar lá! De outra forma, quem teria feito as fotos? Sim, sim, esta é a verdade dos fatos, não confundam jornalistas com paparazzi, assim como vocês não confundem as vossas mães com a revista Vogue!
Um jornalista morto é um pouco menos de ousadia em sua vida, é um passo atrás no conteúdo da sua caixa de mensagens, quanto menos jornalistas menos investigação corajosa e informal, quanto menos liberdade de imprensa menos contato com os porões da humanidade, quanto mais jornalistas acuados, assassinados, mal pagos, doentes e estressados pelas pressões que sofrem menos você vai saber com quantos paus se faz uma canoa, sacou? Os americanos estão exterminando o jornalismo da face da nossa Terra, pois que a informação investigativa tornou-se o maior empreendimento da atualidade, e como todo bom negócio deve ser rigidamente controlado.
Pobres de nós que escolhemos a nossa profissão baseados na inexorável paixão pela descoberta do oculto, do não-dito, das entrelinhas, da informação democrática, explícita, original, verdadeira, da investigação minuciosa, provocante, perigosa, ampla, secreta, do imprevisível da busca da verdade dos fatos… Nós que fugimos do casamento para termos a liberdade de voar mundo afora atrás da aventura mortífera do enfrentamento com o poder do segredo, poder este absolutamente letal em dias anglo/iraquianos… que horror!
E vocês pensam o quê? Quem é que recheia a internet de informações relevantes: os advogados? As engenheiras? As médicas? Os bruxos? O governo do seu estado? Claro que quem vira noites digitando textos instigantes, quem edita fotos na calada da noite para você, quem “vaza” informações que te deixam com aquela sensação de impotência frente à realidade dos fatos é a pobre da raça jornalística, que morre que nem manada de ninguéns, ou bem por aniquilação profissional ou bem pela força das bombas, da censura, do esquecimento dos ridículos salários que recebemos, não importa o quão conhecidos sejamos. Você já ouviu falar num jornalista milionário? Pois, mesmo sendo detentores de informações imprescindíveis, mesmo arriscando-nos ao extremo, mesmo sendo possuidores de virtudes culturais das mais altas, os jornalistas são muito pouco respeitados tanto na paz dos nossos dias quantos na guerra do nosso mês.
Prestem bem atenção: quando o jornalismo e os jornalistas estão sendo censurados, ou assassinados, ou desaparecidos, ou mal pagos, ou mal tratados, mal compreendidos, mal interpretados, mal amados, mais ferrados do que um pobre diabo ? isso é sinal de que estamos todos fora da realidade!
Olhar decisivo
Prestem portanto muita atenção no número de jornalistas que estão sendo mortos nesta guerra maldita entre os anglicanos e os iraquianos. Prestem atenção na quantidade de informações jornalísticas que os profissionais do jornalismo e do fotojornalismo americano estão sendo impedidos de publicar! Ajudem esta impressionantemente corajosa profissão a sobreviver antes que o Big Brother se torne sua exclusiva fonte de informação.
E, finalmente, guardem em seus corações o nosso carinho profissional pela sua conscientização dos fatos. Se você sabe que o Iraque é o segundo maior produtor árabe de petróleo, se você sabe que o Iraque é a segunda maior fonte de água potável do Oriente, se você sabe que os petrodólares estiveram sendo convertidos em petroeuros, se você ouviu falar nos cálculos sobre quanto dinheiro a produção de armamentos traz para os EUA, se você sabe da força da vingança americana pelo Onze de Setembro, se você viu as fotos da miséria humana dos países pobres, se você sabe o quanto Israel prepondera na comunidade muçulmana, se você hoje pode compreender as razões desta guerra ? isso tudo foi informado por jornalistas, fotojornalistas e câmeramen. Todos gente da melhor qualidade, completamente ignorados, por você e pelas forças aliadas que têm tanto a esconder…
Então, a partir de hoje, empreste a nossa profissão um olhar decisivo, grite por cada jornalista morto em ação, reclame o direito de ser informado contando com os nossos serviços, considere inaceitável a morte de um jornalista em ação, prestigie o esforços que fazemos para levantar evidências, entrevistas, imagens, documentos, fatos, inconfidências. Fique absolutamente irado quando um jornalista é morto estupidamente em sua cidade (como Tim Lopes) ou em contextos internacionais. Não nos obrigue a nos vendermos por falta de alternativa profissional! Por falta de relevância profissional!
SOCORRO!
(*) Jornalista