A principal reportagem da revista Veja desta semana (edição nº 2074) aborda, uma vez mais, a qualidade do nosso ensino, aproveitando a oportunidade para (de novo!) comparar o Brasil medíocre à insuperável Finlândia.
A idéia central da matéria é a de que não temos consciência do quanto vai mal o ensino brasileiro. A fonte desta certeza é uma pesquisa encomendada pela própria Veja à CNT/Sensus. As jornalistas Monica Weinberg e Camila Pereira querem abrir nossos olhos. A pesquisa revela que a maioria dos docentes, pais e estudantes está satisfeita, embora indicadores e resultados em abundância demonstrem graves problemas: alunos semi-analfabetos, professores com preparação insuficiente, repetência e outros.
Conclusão: nós não nos enxergamos direito. Estaríamos conformados perante uma situação muito longe da ideal. Os pais cujos filhos freqüentam escolas particulares, investindo no fracasso. Os pais cujos filhos estão nas escolas públicas, acreditando na ilusão.
Mas a matéria prossegue. E pretende colocar o dedo na chaga. Estamos nessa situação porque professores, livros didáticos e apostilas antepõem ao ensino a doutrinação esquerdista. Os professores, segundo a mesma pesquisa, identificam-se com Paulo Freire e Marx. Em sala de aula, elogiam Che Guevara e Lênin. Deixam em segundo plano o ensino de língua portuguesa, aritmética, física. Não ensinam o que interessa… em nome da ideologia.
Mera coincidência
Aproveitando a carona, o economista Gustavo Ioschpe aponta a neutralidade como um dever dos professores. Essa história de ‘formar cidadãos conscientes’ e ‘desenvolver a criatividade e o espírito crítico dos alunos’ seria, no fundo, sonegar o conhecimento necessário à profissionalização do indivíduo. Aulas politicamente neutras solucionariam nossos problemas.
De fato, é desejável acompanhar o que ‘rola’ em nossas salas de aula, identificando motivações ideológicas (afinal, isso é também formar cidadãos críticos), mas fica difícil aceitar o véu ideológico da neutralidade política com que a revista Veja se cobre. Denunciando a mistura entre ideologia de esquerda e educação, defende (dissimuladamente) a mistura que faz entre ideologia de direita e informação, entre interesses econômicos e jornalismo.
Curiosamente, entre as páginas 72 e 87, em que Monica Weinberg, Camila Pereira e Ioschpe escrevem, surgem três páginas (79, 81 e 83) publicitárias, nas quais o grupo Santander Brasil se apresenta como o melhor banco do mundo. Será uma alusão à ‘educação bancária’ de que falava Paulo Freire? Não… isso é mera coincidência. Pura neutralidade.
******
Doutor em Educação pela USP e escritor; www.perisse.com.br