TV DIGITAL
“Projeto desenvolve equipamentos de TV digital”, copyright O Estado de S. Paulo, 11/05/03
“Na cidade de Santa Rita da Sapucaí – centro tecnológico localizado no sul de Minas Gerais, também conhecido como ?Vale da Eletrônica? -, o Instituto de Nacional de Telecomunicações (Inatel) e a empresa Linear trabalham em um projeto para desenvolver equipamentos nacionais para transmissão de TV digital, o que permitiria substituir importações quando a tecnologia for instalado no Brasil. O ministro das Comunicações, Miro Teixeira, está interessado em conhecer o trabalho, mas, segundo o professor Adonias Costa da Silveira, coordenador de Pós-Graduação do Inatel, a data ainda não foi marcada.
?É difícil definir quando ficará pronto o primeiro produto?, explicou o professor. ?Mas a expectativa é ter o primeiro protótipo em um ano.? A pesquisa do Inatel faz parte de um programa maior de pesquisa em transmissão digital, surgido há dois anos e meio e que inclui outros sistemas, como a telefonia celular. O projeto de TV digital está sendo financiado pela Fundação de Estudos e Projetos (Finep), com recursos do Fundo Setorial para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel). Com duração de três anos, o projeto está orçado em cerca de R$ 9 milhões e foi aprovado em dezembro.
A parceria não prevê o desenvolvimento de um padrão brasileiro de transmissão de TV digital, mas conhecer os sistemas existentes para poder aplicá-los no projeto de equipamentos. A Linear é uma das principais empresas do mercado brasileiro de transmissão analógica e quer estar preparada para o novo sistema, independente de qual seja o escolhido pelo Brasil.
No governo passado, foram avaliados três sistemas de TV digital: o americano ATSC, o europeu DVB e o japonês ISDB. Quando assumiu a pasta, no início do ano, o ministro Miro Teixeira defendeu a criação de um sistema brasileiro, que será comparado com os três existentes. Segundo o professor Silveira, a estratégia do projeto é trabalhar primeiramente com o sistema americano, pois a Linear planeja exportar produtos com a tecnologia para o México e até mesmo para os Estados Unidos.
Uma segunda fase prevê desenvolver equipamentos com a tecnologia européia.
?Estaremos preparados para qualquer sistema que o País venha a adotar.?
Entre 20 e 30 pesquisadores participarão do projeto. ?Estamos na fase de importação dos equipamentos?, afirmou o professor. ?O Inatel vai adquirir competência acadêmico-científica em transmissão de TV digital. A Linear busca produzir equipamentos.?
O Inatel existe há 38 anos, tendo surgido muito antes da criação do Sistema Telebrás. A criação do instituto foi iniciativa de um grupo de professores da Escola Técnica de Eletrônica Francisco Moreira da Costa, fundada por Sinhá Moreira, em 1958. O Inatel tem cerca de 1.250 alunos de engenharia, além de 500 na pós-graduação. As empresas tecnológicas da região desenvolveram-se ao redor do Inatel. ?Muitas foram incubadas no instituto?, disse Silveira.”
TELEDRAMATURGIA
“Sem visto para os intervalos”, copyright O Estado de S. Paulo, 11/05/03
“O crime não compensa. Que o digam os vilões das novelas. Aliás, não são só os enviados do mal que pagam custos mais altos por seus personagens.
Papéis polêmicos, como dependentes químicos, adúlteras e homossexuais, entre outros tipos que causam controvérsia entre a audiência, podem render prêmios e agregar bons valores à carreira, mas estão todos sujeitos ao sinal vermelho dos anunciantes nos intervalos.
É o efeito contrário do mocinho da trama. Viver heróis de folhetins desencadeia uma série de convites para campanhas publicitárias, desfiles, festas de 15 anos e afins. Todos querem o mocinho da vez ao lado de sua marca.
Já para os polêmicos da telinha, com uma ou outra exceção, dificilmente sobra alguma fatia para engordar o orçamento. E é uma boa fatia: os cachês de publicidade para famosos variam de R$ 60 mil (para novatos de uma trama das 8 da Globo) a cifras milionárias em campanhas longas (como os R$ 1,2 milhão que Ana Paula Arósio recebeu para virar garota-propaganda de uma operadora de telefonia). Por R$ 100 mil, o anunciante pode ganhar, para apenas um filme publicitário, o aval de Edson Celulari ou de Antônio Fagundes. Desembolsando cachês entre R$ 10 mil a R$ 50 mil, o dono de um evento pode contratar um famoso (de fato, não os que querem ser famosos) para prestigiar sua festa por duas horas.
E engana-se quem pensa que papel controverso rende salário maior para compensar as perdas. Não interessa se você é do bem ou do mal no folhetim.
Os salários dos atores variam de acordo com a importância do personagem na trama – se eles são protagonistas, ganham mais – e com a fama do ator.
?Quem vai querer a menina que maltrata velhinhos anunciando seu produto??, brinca Regiane Alves, que interpreta a insuportável Dóris de Mulheres Apaixonadas. Suas maldades sem fundamento contra os seus avós na novela já lhe renderam broncas, xingamentos e safanões do público na rua. ?A Dóris acumula defeitos difíceis de aturar e que mexem com as pessoas. Ela é fútil, egoísta, deslumbrada e ainda acha que os idosos são um incômodo na vida dela, coisa que algum dia já passou pela cabeça das pessoas. É por isso que ela é tão odiada, as pessoas temem terem agido como ela algum dia.?
Regiane admite que, além do ódio do público, sua vilã está lhe rendendo um período de vacas magras em trabalhos publicitários, algo que ela considera normal e até bom de certa forma. ?Não posso reclamar, a Dóris é a personagem que todo ator pediu a Deus, e, se as pessoas estão com raiva dela, é sinal que está dando certo?, garante a atriz. ?Eu sabia que vivendo um papel desses dificilmente faria comerciais e desfiles, pois, se o público a odeia, nenhum anunciante me chamaria?, continua. ?Só espero que o Maneco (Manuel Carlos, autor) não resolva que a Dóris irá bater nos velhinhos. Aí, estou perdida?, brinca.
Ressaca – Com Cristiana Oliveira não foi diferente. A atriz, que surgiu na TV em um comercial, estava acostumada a engordar seu orçamento estrelando campanhas publicitárias das mais diferentes marcas. Já perdeu as contas de quantos comerciais protagonizou depois de virar uma atriz de sucesso – sua carreira decolou com Juma, em Pantanal, da extinta Manchete. Tudo isso, conta, até viver a psicótica Alicinha, de O Clone. ?Tinha assinado um contrato com uma marca italiana um ano antes de viver a Alicinha e, quando íamos estrelar a campanha, eles me chamaram, pediram desculpas e cancelaram o comercial?, conta ela. ?O motivo era simples: aquela moça insuportável que eu estava vivendo na novela das 8. O cliente não agüentava olhar para minha cara, que sentia raiva?, ela diz, rindo.
A ?ressaca? de Alicinha demorou a passar. Só cinco meses após o fim da novela é que outro anunciante chamou Cristiana para um novo trabalho. ?O ator tem de fazer escolhas. Do ponto de vista artístico, os vilões são impressionantes, são papéis ricos que te fazem crescer muito profissionalmente?, fala ela.
Débora Secco também sentiu o preço das maldades de Íris em Laços de Família.
?Fiquei um tempo sem fazer comerciais. Só quando voltei a fazer uma mocinha, em A Padroeira, é que os convites voltaram?, fala Débora.
Cristiana diz perceber com clareza quando uma personagem vai lhe render bons trabalhos extras e garante que papéis com apelo popular e com sex appeal, como a Babalu, vivida por Letícia Spiller em Quatro por Quatro, atraem muitos anunciantes. ?Se as telespectadoras se identificarem com a personagem, se sonharem ser como ela, não faltarão anunciantes?, diz. ?Mas não adianta só fazer personagens boazinhas. Com o passar dos anos, o ator vira uma grife e é o conjunto de sua obra o que interessa, é esse o seu melhor cartão de visitas?, emenda Cristiana.
O diretor de Criação da Talent, Roberto Lautert, confirma: a maioria dos anunciantes não quer saber de vilões estrelando suas campanhas. Mas há exceções, diz ele: ?Se a maldade do personagem entrar no contexto da campanha, pode dar muito certo. Um bom vilão de novela tem apelo suficiente para convencer o público cabe ao publicitário usar essa imagem a favor da marca.?
?A própria Odete Roitman (Beatriz Segal) foi usada em um comercial no auge de Vale Tudo e deu supercerto. Era uma campanha em que o público tinha de adivinhar quem tinha matado Odete na novela?, continua. ?O que não pode é pegar emprestado a imagem de um ator que faz um supervilão na TV e colocá-lo em cena sem contexto anunciando um empreendimento imobiliário, um banco, algo que precise de credibilidade. O anunciante pensa que, se o público confunde o vilão com o ator na rua, vai confundir no comercial também.?
Preteridos – Mas não são só os maldosos que são barrados no reino da propaganda. Personagens polêmicos das novelas em geral – drogados, alcoólatras, adolescentes-problema, homossexuais –dificilmente rendem convites para garoto-propaganda aos atores que os interpretam.
Alguns, como a atriz Débora Falabella, que interpretou uma drogada em O Clone, parecem nem querer tocar no assunto. Procurada quase um mês atrás pelo Estado, Débora alegou, por meio de assessores e empresário, que não tinha tempo para responder sequer a um e-mail. O fato é que não se viu Débora nos intervalos enquanto interpretou Mel. Agora, momento em que vive uma mocinha na novela das 6, a atriz tem dado com freqüência o ar da graça nos comerciais.
Protagonista de váaacute;rias propagandas, Silvia Pfeiffer conta que sentiu essa rejeição pelo menos duas vezes. Uma quando fez uma lésbica em Torre de Babel. Outra em o Rei do Gado, quando fez um esposa que traía o marido (Antônio Fagundes) com um amante barato (Oscar Magrini) . ?É claro que, quando você está em uma novela, os convites para publicidade aumentam, afinal, você está lá, todos os dias, na maior vitrine do País. Mas com papéis polêmicos não é assim?, fala a atriz. ?Na época de Torre de Babel, um anunciante chegou a rasgar um contrato na minha cara porque disse que eu não tinha avisado que iria fazer uma lésbica na novela. Em Torre de Babel foram dois os problemas que afastavam os anunciantes: um era o caráter da personagem e o outro era o meu cabelo, que foi pintado de loiro para o papel. Eu fazia uma campanha de um adoçante e tive de ficar afastada até voltar à minha imagem habitual.?
Odilon Wagner, que viveu um homossexual em Por Amor, diz que o preconceito é mais do mercado do que do próprio público. ?Nada de comerciais nem eventos.
Sempre fiz muita campanha para empreendimentos imobiliários, bancos e na época da novela não recebi nenhum convite?, conta ele. ?Lembro até hoje quando o falecido Paulo Ubiratan (diretor da Globo) me convidou para o papel. Ele disse: ?Sei que você é contratado da emissora e teria de aceitar os papéis que te oferecemos nas novelas, mas esse aqui você não é obrigado a aceitar. Alguns personagens ninguém pode obrigar o ator a fazer, pois só ele sabe a barra que terá de enfrentar?. Sábio Ubiratan.?”
KUBANACAN
“Sorte favorece colcha de retalhos ?Kubanacan?”, copyright O Estado de S. Paulo, 11/05/03
“República das bananas era a denominação que, nos anos 60, a intelligentzia internacional dava a países latino-americanos dominados por ditadores. É assim Kubanacan, endereço e título da novela que entrou no lugar de O Beijo do Vampiro, na Globo.
Precavido, antes mesmo da estréia de Kubanacan, Carlos Lombardi andou dizendo que a crítica, previsível, iria malhá-lo por causa dos tórax e bíceps nus que estamparia no vídeo durante meses. Defendeu sua causa com a história de que o ator tem de trabalhar seu corpo por ser ele instrumento do ofício e etc. e tal.
Previsíveis, como escreveu a jornalista Cristina Padiglione no Estado, são as novelas da dupla Lombardi/Wolf Maya. Não há aí juízo de valor. Previsível não quer dizer ruim. O autor é talentoso, segundo a educadora Maria Tereza Fraga Rocco, da Universidade de São Paulo (USP), Lombardi revolucionou a linguagem da teledramaturgia a partir de Quatro por Quatro, ao imprimir muita ação, diálogos rápidos e um humor verborrágico nas novelas.
Mas que ele repete, isso repete. O que tem suas vantagens. O espectador habitué reconhece por um único capítulo a assinatura do autor e prestigia.
Uga Uga foi uma das maiores audiências da faixa das 7 da Globo e Kubanacan estreou em patamar maior do que a sua antecessora: 40 x 36. Ou seja, Lombardi tem um público cativo que aprecia suas trampolinagens.
Kubanacan é povoada sim por machos malhados e desnudos, mulheres exuberantes e espertas. Para usar um termo datado da época em que se passa a trama, anos 50, todos envolvidos em uma enorme chanchada.
Inadvertidamente, Lombardi volta ao passado e faz uma novela atual. A saga do ditador Camacho (Humberto Martins) começa exatamente no momento em que o mundo se volta para a outra Cuba, a de Fidel Castro, para protestar contra execução e prisão de desafetos do regime que tentaram ?exportar? conterrâneos para os braços do capitalismo americano.
Isso deve ser obra do padroeiro dos novelistas, porque Glória Perez também foi afortunada com O Clone – e seus exotismos árabes – que entrou no ar em plena comoção da tragédia do 11 de setembro.
Kubanacan entra na prateleira das comédias das 7 e contém os elementos tradicionais que movem os folhetins. Há um poderoso interessado em uma bela jovem pobre (Marisol) que, para salvar a vida de seu grande amor, cede aos caprichos do vilão. Há também um desmemoriado (Esteban) que não conhece seu passado, mas que vai descobri-lo, muito aos poucos, junto com o público, com direito a uma fieira de equívocos e armações.
As semelhanças com muita coisa que já passou na TV nestes 40 anos de telenovela são grandes. Meio Porto dos Milagres, meio Tropicaliente, meio todos os trabalhos anteriores de Carlos Lombardi, Kubanacan é uma colcha de retalhos. Mas isso não é prerrogativa só do Lombardi, todos os autores bebem em sua própria fonte e na de outros, na do cinema inclusive. Assim como O Beijo do Vampiro tinha muito de Vamp, Mulheres Apaixonadas tem tudo a ver com outras histórias do próprio Manoel Carlos, e como Aguinaldo Silva…
Não é crime buscar inspiração, o chato é buscá-la e depois ficar arranjando desculpas para justificá-las.”