BAIXARIA TRANSATLÂNTICA
Luiz Egypto
O jornalista Heródoto Barbeiro, âncora do Jornal da CBN, deixou escapar um precioso comentário na edição de quarta-feira (4/6/03) do radiojornal que vai ao ar diariamente às 6 horas.
Ele reassumia o posto depois de um período de férias. No meio de um ou outro rapapé de boas-vindas, da empolgação indisfarçável do âncora e das piadas sempre recorrentes da bem-humorada equipe, soube-se que o jornalista fora conhecer Angola. Algo como o "turismo necessário" recomendado pelo escritor Julio Cortazar ["Turismo aconsejable", in Ultimo Round, tomo 1, pág. 123-147; Siglo XXI Editores, 1974].
Os comentários sobre a viagem eram mais que justificados.
Até que num determinado ponto das 3 horas da emissão,
Heródoto disse, com outras palavras (acrescidas de mais outras
não ditas e interpostas sob exclusiva responsabilidade deste
ouvinte), o seguinte :
? Ao circular por Luanda, as pessoas perguntavam como é
que eu conseguia sair nas ruas das cidades brasileiras. Respondia
dizendo que a violência urbana existe, sim, mas ainda não
ao ponto de ser impossível circular pelas ruas. Ainda. Mas
estranhei o fato de esse tipo de comentário vir de pessoas
que haviam vivenciado uma guerra civil prolongada, sangrenta, que
marcou a população e cujos efeitos são facilmente
notados nas ruas, onde é comum encontrar mutilados. Fui procurar
saber o porquê dos comentários. E descobri que a imagem
que os angolanos têm da violência brasileira é
a aquela mesma que apreendem dos programas policialescos dos fins
de tarde, exibidos em nossas emissoras de TV e captados pela parabólicas
de Angola em horário de audiência qualificada [esta
última afirmação o jornalista não fez,
mas, com fuso horário de + 4 horas, em Luanda se assiste
aos shows de horror entre 21 horas e 23 horas].
A banalização da violência patrocinada por
esses apresentadores, produtores e editores de TV provoca mais estragos
do que pode parecer.