COLUNISMO POLÍTICO
Danilo Janúncio (*)
Para aqueles que apreciam uma boa coluna política, uma lembrança. No dia 1? de junho fez dez anos que o jornalismo brasileiro perdeu um de seus maiores colunistas políticos: Carlos Castello Branco (1920-1993).
Foram 31 anos ocupando de alto a baixo a página 2 do Jornal do Brasil, quando era uma das mais lidas do país. Longe das escolas de jornalismo, onde deveria figurar, Castelinho, como era chamado pelos amigos, fazia jornalismo como poucos, por isso a consagração entre políticos e colegas de profissão. Seu valor vinha tanto da qualidade de seus textos quanto do conteúdo do que escrevia. A ditadura militar foi uma fase que deixou marcas em toda a imprensa, mas que Castello conseguia de certa forma driblar.
A coluna representou uma das peças mais importantes do jornalismo político brasileiro. Sua leitura diária era fundamental às pessoas com qualquer dose de interesse, direto ou indireto, na vida pública do país.
Contemporâneo e amigo de Castello, o colunista do JB e do site no mínimo Villas-Bôas Corrêa conheceu Castelinho no Congresso Nacional, ainda no Rio de Janeiro, no início dos anos 1950, quando os dois eram repórteres. Dali travaram uma amizade que durou a vida toda. De sua parte, o editor-responsável do Observatório da Imprensa Alberto Dines foi editor do JB quando Castello começou a escrever para o jornal onde ficaria por mais de 30 anos.
Villas-Bôas descreve o amigo como baixinho, feio, meio desengonçado e com uma voz inaudível. "Falava por frases curtas, mas tinha uma prodigiosa capacidade de se informar, de fazer relações, de inspirar confiança às fontes. Ele foi um articulador das jogadas políticas, que colocava as coisas em textos de alta qualidade literária."
Para Dines, Castello era um sujeito lacônico e, além disso, tinha uma péssima dicção ? ninguém entendia o que ele falava. "Tinha um senso de humor arrasador, amargo, sarcástico. Não era o humor hilariante, falava pouco e, quando falava, destruía."
Coluna do Castello
A coluna, que viria a se tornar uma das mais lidas e conhecidas do país, surgiu em 1962, no JB. Dines conta que o poeta e jornalista Mário Faustino, que acabara de assumir a Tribuna da Imprensa, convidou Castello para escrever em seu jornal, no final de 1961, mas não deu certo. Dines então sugeriu que Castello fizesse a coluna diária no jornal que editava. Ele topou. Eles e outros jornalistas conversavam sobre o possível nome da coluna. "Começamos a falar sobre um grande jornalista americano, que Castelinho conhecia, e eu conhecia de nome, chamado Max Lerner. Ele era do Daily News, de Nova York", lembra Dines. "Era um cara de esquerda e escrevia sua coluna, um misto de reportagem com artigo, que chamava ?The Max Lerner Columm?. Aí nós falamos: podia ser a ?Coluna do Castello?. No dia seguinte, eu sapequei a ?Coluna do Castelo? e foi uma coisa sensacional".
Para qualquer jornalista, a capacidade de sentar e escrever, bem e rápido, é um dom. Dines lembra que Castello era assim. "Ele sentava e fazia sua coluna em meia hora, no máximo. Acabava de escrever e não tinha uma palavra corrigida. Ele datilografava de uma forma direta, não passava a limpo! Ele e o Otto Lara Resende são pessoas que, além de exímios datilógrafos, possuem uma capacidade de pensar e produzir um texto sem nenhuma correção."
De acordo com Villas-Bôas, a geração de Castello criou um modelo de reportagem política que as circunstâncias favoreceram, com suas dificuldades e com o grande momento que viveram no Congresso. Villas-Bôas não crê ter havido um Congresso mais brilhante, do ponto de vista do duelo oratório, do que aquele do final da década de 1940. "Isso até chegar a Brasília. Lá ele começa a agonizar, entrou numa fase de desmoralização progressiva, vítima de cassações, recessos punitivos, senadores biônicos."
Por esses e outros motivos, a importância de Carlos Castello Branco para o jornalismo brasileiro é muito grande. Segundo Dines, "ele foi um expoente no que fazia graças à qualidade de seu texto, à capacidade de não se envolver de forma engajada e de conseguir fazer interpretações que eram necessárias num período muito difícil, na ditadura".
Censura
A "Coluna do Castello" nunca chegou a ser censurada. Se não saiu uma ou outra vez foi por motivo de saúde ou pela prisão de Castello logo após a decretação do Ato Institucional n? 5. No entanto, a pressão exercida pelo governo contra o Jornal do Brasil foi tão grande que Castello chegou a deixar o jornal, mas foi persuadido a ficar e continuou escrevendo. Villas-Bôas lembra que a pressão foi esmagadora. "Queriam suspender os direitos dele, que chegou a ser preso. Inclusive, a esposa do Castello atribuiu um dos infartos dele à pressão que era exercida sobre o jornal e, indiretamente, sobre ele. Mas Castelinho continuava a escrever e passava as informações da melhor maneira possível."
Dificilmente deve-se encontrar um substituto para Carlos Castello Branco na imprensa brasileira. Na opinião de Villas-Bôas, ele não deixou nenhum. "Mas uma figura importante da reportagem política dos últimos tempos foi o Márcio Moreira Alves, do jornal O Globo."
Alberto Dines também não vê ninguém à altura de Castelinho. Para ele, hoje a imprensa tem algumas colunistas ? "são todas mulheres" ? de grande qualidade. Ele cita Tereza Cruvinel, do Globo, Dora Kramer, colunista do JB e do Estado de S.Paulo e Eliane Cantanhêde, da Folha de S.Paulo.
(*) Jornalista, editor do sítio Revista Brasil de Cultura <www.revistabrasil.com.br>