Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Roberto Maciel

O POVO

"Kama sutra para todas as idades", copyright O Povo, 8/6/03

"Domingo passado, o caderno Buchicho publicou duas páginas sobre sexo. Continham uma matéria com detalhadas ilustrações sobre o Kama Sutra, obra de origem hindu que, acredita-se, tem pelo menos 1.600 anos, e um texto intitulado ?Confessionário? ? no qual o autor, que seria um universitário de 22 anos, identificado pelas iniciais A.T.M., relatava uma experiência sexual a três. Sem laivos conservadores, é preciso observar que O Povo é destinado a diversas faixas etárias e, por isso mesmo, deve levar em conta esse aspecto ao definir a pauta que vai oferecer ao leitor. Entre o público que consome o Buchicho estão crianças. E, definitivamente, apresentar ilustrações pretensamente baseadas no Kama Sutra a quem está em idade de formação não é um ato responsável. Quanto a casos de ménage à trois, estes, tenho certeza, encontram melhor espaço em revistas de qualidade duvidosa que vão às bancas lacradas em embalagens plásticas do que em um veículo com o caráter do O Povo. Além de, na maioria das vezes, serem o exemplo mais bem acabado da pior subliteratura. Perdoem-me os leitores se não posso me furtar à ironia, mas aquelas duas páginas deixaram O Povo em posição difícil.

Cobertura aterrada

Na coluna de domingo passado, comentei a pertinência da cobertura dada aos problemas da Praia de Iracema, destacando que seria legítimo se a iniciativa do O Povo fosse seguida por outros veículos de comunicação. A primeira conseqüência desse esforço, que já havia sido anunciada quando aquela coluna foi escrita, é o projeto Iracema de Todas as Tribos, ação que envolve órgãos estaduais e municipais. Pois bem: os principais canais de TV e o jornal Diário do Nordeste acompanharam o lançamento do projeto ? ocorrido terça-feira última. Cumpriram sua obrigação de bem informar. O Povo não deu uma linha sequer na edição de quarta. Ignorou solenemente as reações oficiais à provocação que fez. O que deveria ter sido tratado como prioridade, sobretudo por estar mobilizando as atenções dos leitores, não ficou nem em segundo plano.

Equilíbrio no balanço das mudanças

No geral, as alterações implementadas a partir de domingo último no jornal foram bem recebidas pelos leitores. Ao longo da semana passada recebi manifestações positivas. Entre estas, para a valorização de longas coberturas, como a que o Vida & Arte dedicou ao cantor Raimundo Fagner e a que o caderno Ciência & Saúde deu à questão ambiental. Ressalte-se ainda a feliz escolha do economista Paul Singer para a primeira, e muito boa, entrevista das Páginas Azuis, na segunda-feira.

Mas também houve queixas. A migração de parte do conteúdo do Vida & Arte para o Buchicho semanal, por exemplo, enquadra-se nessa categoria de manifestação. Leitores ligaram para reclamar da mudança das palavras cruzadas, outros não gostaram da reformulação gráfica que verticalizou a outrora horizontal crônica de Airton Monte. São adequações corretas, às quais certamente o público se habituará. Outros, que se incomodaram com a ausência da programação de TVs, tiveram uma pronta resposta da Redação, que supriu a demanda já na edição de quarta-feira. Um ponto, porém, revela o desagrado de parcela expressiva de leitores que opinaram sobre as inovações: o excessivo espaço dado ao colunismo social. O incômodo, por sinal, coincide com análise anterior que fiz. Em 9 de março passado, com a nota ?Mundanismo para quem??, observei que aquelas seções têm a seu favor um público real e o potencial de apresentar e analisar tendências de comportamento da sociedade. Mas, ressaltei, a prática desse gênero jornalístico no Ceará necessita de improrrogável reciclagem. Isso não ocorreu com as mudanças no O Povo. Aplicou-se em quantidade, mas quase nada foi investido na requalificação dos conteúdos das colunas sociais.

Faltou um

As modificações no O Povo deixaram uma lacuna: o Jornal do Leitor. Único na imprensa local, o caderno, editado pelo jornalista José Raymundo Costa, vice-presidente da empresa, que completou esta semana 65 anos de casa, é um importante elo entre o jornal e seu público. Mas as reformas não o contemplaram. Pelo menos ainda. Sobre o produto, uma observação: as fotografias que publica não têm sido creditadas aos autores ? o que contraria não só uma norma do O Povo, mas um acordo consagrado internacionalmente entre as entidades que representam jornais e as que representam jornalistas.

Arquibaldos e geraldinos

Recebi nos últimos dias uma batelada de e-mails de leitores-torcedores do Ceará Sporting Club. Todos indignados. Segunda-feira comemoraram-se 89 anos de fundação do time e O Povo não fez nenhuma menção. Deixou passar em brancas nuvens. Reclamação justa, embora a data não seja expressiva como a que será festejada em 2004. Justa, mas permeada de excessos em alguns casos. Como no do leitor que protestou por O Povo não ter noticiado o acontecimento, mas registrado em editorial de primeira página os 65 anos de José Raymundo Costa na empresa. ?É porque ele é tricolor?, ironizou. Fiquei sem palavras. Argumento nenhum poderia ser mais descabido. Para aumentar o desconforto dos leitores-torcedores do Ceará, na edição de quarta a Editoria de Esportes trouxe a seguinte matéria: ?Dupla comemora aniversário?. Era um registro dos 29 anos de idade dos jogadores Jefferson e Chiquinho. Ambos do Fortaleza.

Humor grosseiro

Quarta-feira, a coluna Vertical a seguinte nota: ?Hoje, às 9 horas, a direção da Coelce firma convênio de cooperação com a Federação das Apaes do Estado. Com isso, essas entidades vão pode receber doações através da conta de energia elétrica?. Até aí, ótimo. O título, porém, denunciava um humor grosseiro: ?Excepcional?. Falha de quem escreveu a nota e da Chefia de Redação, que lê as colunas antes da publicação e elimina eventuais falhas. O ?Excepcional? fica na mesma categoria do título ?Idiota?, publicado em 5 de março na coluna Política, acima de uma nota sobre um requerimento do deputado federal João Alfredo (PT)."